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Teodoro Henwiel

Coletiva de imprensa no Palácio do Planalto, Brasília, maio de 2019.

Quando Teodoro entrou no recinto, dezenas de jornalistas se levantaram silvando murmurinhos desesperados, alguns flashes fotográficos eclodiram enquanto os sussurros se transformavam em conversa histérica num tom crescente, indagações se destacavam no meio da confusão.

—Senhor Presidente!

—Senhor!

—Alguma declaração sobre os tiroteios no Rio?

Teodoro observava os flashes avulsos das câmeras, a balbúrdia dos jornalistas, seu coração palpitava rápido. A essa altura, quase meio ano de governo, sem contar o período de campanha, já estava acostumado com esse tipo de coisa. Entretanto, essa entrevista era diferente em todos os sentidos. Como bom político, não sinalizava a própria hesitação e nervosismo. Além do coração (imperceptível à imprensa), só esboçava outro sinal de nervosismo: fechava a mão direita estralando o polegar, sentindo o a fina camada de suor frio se engraçar com o anel metálico em sua palma em uma espécie de tique.

Fez um gesto com a mão e os entrevistadores aquietaram-se, sentando e permitindo que o silêncio tombasse sobre o cômodo. Uma sala de espaço mediano, com o chão de madeira escura ladeado por paredes limpas e negras, decoradas com obras de arte do modernismo nacional, a parede às costas dos acentos da imprensa e posicionada à frente do pequeno palanque presidencial era toda feita de vidro resiliente, esqueletado por discretas estruturas de aço negro. Essa enorme parede-janela dava acesso a um dos corredores do palácio, e estava com as enormes cortinas beges cerradas, isolando o ambiente da iluminação exterior, propiciando filmagens e fotos com melhor qualidade, além de tornar a ocasião mais reservada.

Havia ainda um grande forro plástico atrás do palanque, nesse forro estavam estampadas a bandeira do Brasil, e os símbolos e cores dos partidos de sua coalizão. À frente, um homem com não mais do que um e setenta, trajando um terno negro com gravata azul, branco, olhar negro e meio avulso, com seus cinquenta e quatro anos conservava mechas de cabelo cheias de vitalidade e cuidadosamente penteadas, tudo minunciosamente planejado por sua equipe de imagem. Eis o Presidente da República, Teodoro Henwiel.

—Boa tarde aos convidados da coletiva de imprensa, aos brasileiros que me acompanham agora, e que são a quem eu, como Chefe de Estado e Governo, me dirijo. Como sabem, nos últimos dois meses eventos estranhos sucederam na capital São Paulo, e há algumas semanas, ondas de violência de intensidade atípica assolaram as comunidades periféricas do Rio.

Cochichos puderam ser ouvidos das cadeiras da imprensa.

—Quando comecei esse governo, há poucos meses, foi com o compromisso de ser verdadeiro com o povo brasileiro, de cessar as brigas internas da casa, para poder arrumá-la. Por isso concordei em participar dessa coalizão partidária, para dar a união que a nação tão desesperadamente precisa. E o meu governo, em parceria do DN e do PP, através da Debora, é focado nesses valores: transparência e união.

Teodoro fez uma breve pausa para beber água, em verdade nem sentia sede, foi apenas uma parada para gerar expectativa para notícia que pretendia anunciar. O DN, partido do qual é membro, fez uma aliança com seu principal opositor, o PP, após fundirem-se com diversos outros partidos médios, antes mesmo do período eleitoral, de 2017 a 2018, criando um cenário onde a conhecida longa lista partidária do país se resumiu a esses dois principais, colocando em cheque a crescente polarização da população e a possibilidade de alguma revolta maior ou mesmo interferência militar. Debora Ruth, sua vice-presidente, é a representante do PP na coalizão. Teodoro coloca o copo de volta na bandeja e adquire uma expressão de lamúria, quase triste, mas com aparente amor, como um pai que percebe que o filho amadureceu.

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