Capítulo X

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Como foi que terminei sentado à mesa, tomando chá, enquanto oito mulheres contavam sua história? Ah, sim! Creio que estava também com um hematoma no lado direito do rosto. Latejou por horas. Assim que entreguei Mara nos braços da dona da hospedaria, uma das mulheres atacou-me. Um soco muito forte. "Ninguém machuca a minha irmã!", disse-me. Eu nunca havia agredido uma mulher, nem havia sido agredido por uma delas até agora.

Uma senhora gritou "basta!" e não houve mais agressão. Todos obedecemos. Gilda tentou pegar Mara novamente. Não permiti. Pouco depois, quando estávamos à mesa, o bebê começou a chorar e não tive escolha senão deixá-la aos cuidados de sua ama de leite. Estava com fome.

O marido da velha Hipátia, havia falecido há quase dez anos, quando a filha mais nova tinha apenas três

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O marido da velha Hipátia, havia falecido há quase dez anos, quando a filha mais nova tinha apenas três. Eram uma família próspera, contra todas as expectativas, pois não haviam homens para trabalhar por elas. De nove partos, os dois únicos meninos eram natimortos. Quando o pai de Gilda visitou o oráculo, soube que pendia uma maldição sob a família da esposa, que somente traria à vida rebentos do sexo feminino.

Hipátia contou-nos que talvez fosse o pacto de sua avó com Afrodite, já que acreditava ser estéril. Os bebês vieram, mas nenhum varão. O fato repetiu-se na geração seguinte e na outra. Não coincidentemente, o filho de Gilda que nasceu morto era do sexo masculino.

Com a morte do pai, as mulheres continuaram o trabalho na gleba. O serviço era pesado, mas nenhuma delas era de compleição frágil. Eram robustas como Gilda, mulheres do campo que trabalharam a vida inteira. A mais velha já passara da mocidade, tinha 26 anos. Nenhuma delas casou. A única que se apaixonou foi Gilda, terminando grávida, solteira e desiludida.

Olhei em cada um daqueles olhos castanhos. Meio esperançosos talvez? Sugeri que a maldição era mais do feitio de Hera, pois nenhuma delas casou-se e constituiu família. Hipátia pediu que eu não zombasse. Retruquei que de todas as dificuldades que passei na vida, a ajuda que tive foi humana, nada sobrenatural. A única coisa divina que tive foi minha filha, e Gilda tentou tirá-la de mim.

A ama de leite defendeu-se dizendo que sentia como se Mara fosse sua filha também e que isso era recíproco. Percebi isso pela forma com que o bebê agarrava-se a seu seio para amamentar. Então, repreendeu-me a conduta, pois um pai não deveria largar a filha enquanto se diverte com adúlteras. Respondi-lhe que eram boas moças e era meu direito encontrar uma mulher e constituir família. Perguntaram-me como eu havia ido parar em Neata e falei-lhes de Tormento. Ninguém se lembrava dele. Talvez tivesse ido embora na infância.

Fragmentos da vida de um pescador (Conto)Where stories live. Discover now