Capítulo XIII

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No dia seguinte, quando o sol estava alto no céu, meu corpo estava enrijecido e cansado. Avistei três homens e uma mula, conforme a descrição que Thais dera. Menina inteligente. Açoitei o cavalo e fui num galope mais rápido.

Assim que olhei em seus olhos, notei o mútuo reconhecimento. "Sabem para onde leva essa estrada?", perguntei. "Para o seu fim, creio eu", respondeu Andrea. E sem hesitar, desembainhou o facão da cintura. Fui mais rápido em tirar o cavalo de seu alcance e degolá-lo. Ouvi com prazer o seu sangue borbulhando na garganta, o mesmo que ele deve ter ouvido quando mataram meu filhinho de um ano.

Os outros dois eram palermas. Cortei o pescoço de um e, com a machadinha que trazia na sela, acertei as costas do que tentou fugir.

Nunca descobri como Andrea nos encontrou. Talvez Tormento tivesse falado a respeito de Neata com outros presidiários. Mas qualquer coisa que eu pensar a respeito não passará de conjectura.

Não haveria um tribunal, nem condenação alguma. Pude, enfim, descobrir o meu pecado: não tomar precauções quanto ao meu inimigo.

Decepei suas cabeças e coloquei-as em um saco de linho, amarrado na sela. Seus corpos abandonei na orla de uma mata. Que Hades os carregue.

Cheguei na gleba da minha sogra quatro dias e meio depois de ter partido. Não tive pressa para voltar para casa. Estava cansado e com alguns ferimentos da viagem a cavalo. Estava um pouco fraco e desejava comida decente.

Quando mostrei às mulheres as cabeças, Hipátia perguntou o que eu desejava fazer com aquelas coisas, trazendo-as para cá. Sugeri que as colocassem nos espantalhos, o que não daria certo, já que os maus espíritos apareceriam junto aos pássaros carniceiros. Só as enterrei.

Não pude evitar pensar que esses homens não cometeriam mais maldades. Nunca matei ninguém na vida. Mas quando encontrei minha família brutalmente massacrada, descobri que meu espírito não teria paz enquanto não me vingasse daqueles que mataram e feriram as pessoas a quem mais amei.

É estranho. A vingança não me trouxe de volta a paz de antes. Naquele momento, vi-me tendo que reconstruir a vida a partir de cacos, mais uma vez...

Hipátia comentou que quando foram limpar a casa, encontraram-na ao chão. Admiti a culpa. Uma de suas filhas deu-me um tapa por trás da cabeça, o que fez Thais rir. Há quanto tempo eu não ouvia sua risada...

Mara restabeleceu-se mais rápido do que previmos

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Mara restabeleceu-se mais rápido do que previmos. Ela queria voltar para casa, mas, como eu ainda estava construindo-a e não podíamos levá-la para a gleba de sua avó, dado o seu estado de saúde, ela continuou com os vizinhos.

Decidi construir uma casa maior e mais bela. Usei meus conhecimentos de carpinteiro e de engenharia que havia aprendido quando era muito mais jovem para fazê-la. A tripulação ajudava-me, quando não estávamos pescando.

Em dois anos de idas e vindas da casa de Hipátia, voltamos para a nossa. Quando eu estivesse no mar, alguma das irmãs de Gilda vinha para ficar com as meninas, mas achamos mais fácil uma delas mudar-se para lá.

Quando Mara contava com seus 12 anos, assumiu a lida doméstica com ajuda de Thais, que era sempre de poucas palavras, já que sua tia se encontrava debilitada.

Nunca imaginei que iriam ter curiosidade pela leitura. Tão logo quiseram aprender, ensinei-lhes a ler, a única herança de minha primeira vida.

Aos 14 anos, Mara casou-se, o que foi mais um golpe em meu coração de pai. Foi poucos meses após a morte de mais uma das filhas de Hipátia, a que ficou conosco por anos, até ser ela a necessitar de nossos cuidados.

Fragmentos da vida de um pescador (Conto)Where stories live. Discover now