Capítulo 17

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A sexta feira chegou e com ela, o mau humor de Emê de Martnália. Na escola, a garota esteve mais calada do que de costume e se desculpou com Aguinaldo dizendo que teria uma reunião com o time de vôlei, e que por isso não poderiam conversar na parte da tarde.

Aguinaldo se concentrou no fato de que pelo menos, ela tinha se explicado dessa vez.

Elcione conversou com Emê normalmente e fingiu que nada tinha acontecido, mas Beltassamo deixou bem claro que não conversaria com ela até ouvir um pedido de desculpas. Por causa disso, o clima naquela manhã não foi dos melhores.

Mas Aguinaldo também tinha outro motivo para estar aliviado: Elcione e Beltassamo não tinham perguntado nada sobre ele e Emê de Martnália. Eles estiveram tão concentrados no problema de que os quatro ficaram em salas diferentes que se esqueceram de perguntar o que tinha acontecido no dia anterior.

Aliás, nesse novo ano, os quatro foram separados nas três salas do segundo ano. Aguinaldo e Elcione ficaram na primeira turma, Beltassamo ficou na segunda e Emê de Martnália na terceira. Emê não pareceu muito afetada, mas os outros dois não deixaram de demonstrar seu descontentamento com a separação.

Aguinaldo refletia em todos esses acontecimentos enquanto voltava para casa. Estava triste por não ter ficado na mesma sala que Emê de Martnália, e ainda mais triste por ter que ficar junto com Elcione o ano inteiro. Seu único consolo era que sua colega de classe provavelmente teria outras pessoas com as quais se entreter.

Ao entrar em casa, ele reparou em uma bicicleta preta grande com um laço amarrado na parte da frente, como se fosse um presente, encostada no muro da garagem. Estranhou aquilo, pois nem ele nem seu pai sabiam de andar de bicicleta.

Juvenal estava na cozinha, tomando água, quando percebeu que seu filho já tinha chegado da escola. Eles se cumprimentaram como de costume, mas antes que Aguinaldo fosse para seu quarto trocar de roupa, decidiu perguntar mais sobre a bicicleta.

— Ei pai, o que aquela bicicleta está fazendo aqui em casa?

O copo de água foi deixado em cima da pia lentamente por Juvenal. Ele respirou fundo e olhou para seu filho com o tipo de olhar de quem não carregava boas notícias.

— Então… — Juvenal engoliu em seco antes de continuar — sua mãe mandou pelo correio.

Se não fosse pelo barulho da geladeira e do filtro elétrico, o cômodo teria ficado em completo silêncio. Pai e filho se encararam sem dizer nada, Aguinaldo ficou parado na porta enquanto Juvenal esperava alguma reação do garoto.

— O que… o que isso significa? — Aguinaldo finalmente se pronunciou depois de alguns minutos.

— Sendo bem sincero, não sei — Juvenal suspirou.

— Como o senhor sabe que foi ela?

— Isto, — pegou um pedaço de papel do bolso — estava amarrado no guidão.

Aguinaldo encarou o papel entre os dedos de Juvenal e não expressou nenhuma reação. Ele nem sabia como realmente estava se sentindo. Foi tudo tão abrupto que o coitado nem teve tempo de refletir no que estava acontecendo.

— O que está escrito?

— “Para o meu querido filho, Aguinaldo” e um número — Juvenal leu tentando controlar ao máximo o tom de sua voz.

Ao contrário de seu filho, Juvenal sabia muito bem o que sentia. Era um misto de raiva e tristeza.  Olhou para Aguinaldo e percebeu que o garoto começou a encarar o chão, ele conhecia seu filho o suficiente para saber que demoraria um tempo até Aguinaldo demonstrar alguma reação mais forte.

Todos Nós Que Estamos VivosWhere stories live. Discover now