NOVE

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Danna: Quando os Pássaros Pousam

Condado de Tulare, Califórnia

Charles se aventurou sozinho pelo milharal, ninguém mais quis acompanhá-lo, já que o seu patrão, senhor Craig, fora claro ao dizer que não permitia qualquer busca em suas terras, garantiu que sua jovem empregada dali saíra e certamente não retornara, de forma que não via motivos para que alguém se embrenhasse em meio às suas plantações, podendo até causar estragos à futura colheita.

Antonella sumira há muitos dias, sua mãe e irmãos estavam desesperados à sua procura, pois além de ser uma moça muito boa e querida, era quem sustentava a casa, de forma que agora não demoraria para que a família começasse a passar necessidades.

O patrão da moça, rico e bom de coração, até deu àquela pobre senhora uns trocados a mais do que Antonella de fato trabalhara, um gesto de generosidade da sua parte, mas que certamente não ia mais se repetir, já que não tinha nenhuma obrigação de sustentar aquelas pessoas. Senhor Craig até mesmo contratou outra empregada para ocupar o lugar da desaparecida, visto que os afazeres da casa não podiam ficar à espera da boa vontade da outra aparecer, segundo suas próprias palavras.

Nunca em sua vida, Charles pensou em desobedecer seu patrão, mas as circunstâncias o forçaram, pois a pobre mulher podia ter sido atacada por alguém e deixada largada em meio à plantação. Ele entendia que o velho não queria correr o risco de ter suas terras pisoteadas, mas era uma emergência, Antonella poderia estar ali em algum lugar e precisando de ajuda.

Charles fora contratado para o trabalho braçal quando ainda era um menino, por isso tinha imenso respeito e até gratidão pelo velho Craig, o dono daquelas terras sem fim. Um homem rico que beirava seus cinquenta e cinco anos, um pobre solitário, já que sua esposa o abandonara dez anos atrás, fugira com o filho de um fazendeiro vizinho, um rapazote que vivera boa parte da sua vida em Sacramento, e que provavelmente para lá a levara, deixando o marido para trás.

Depois de Heloisa, Craig nunca mais quis casar, na verdade, sabia que nenhuma mulher ficaria com ele se não fosse por seu dinheiro, ou por pura pena, já que ele não passava de um pobre aleijado, entrevado numa cadeira de rodas.

Ele sabia que a deficiência do patrão fora fruto de um trágico acidente, o mesmo que tirou a vida do seu filho e que acontecera antes de ser traído e abandonado pela mulher. Um homem amargo, fruto de uma vida amarga, por isso os seus empregados nutriam por ele muito respeito, e consideravam-no um bom homem.

Charles caminhara a noite toda, o sol já estava nascendo quando chegou mais uma vez ao meio do milharal, passara por ali incontáveis vezes desde que começara a sua busca, já que dali partiam todas as trilhas que levavam para as extremidades da plantação.

Já estava cansado e o estômago começava a roncar, havia ainda mais duas trilhas, longos quilômetros para percorrer, então decidiu descansar para só depois seguir por uma delas. Escorou-se abaixo da estaca do espantalho, arrancou a própria camisa e colocou sobre seu rosto, numa tentativa de descansar a própria vista e protegê-la dos primeiros raios de sol. O cansaço era tanto que acabou cochilando.

Mais de uma hora se passou desde que Charles se entregara ao cansaço e ao sono, despertou assustado ao sentir algo cair sobre seu rosto, por sorte, encima da sua camisa. Apenas quando levou uma das mãos para identificar o que o atingira, sentiu as fezes ainda quente de um pássaro que acabava de alçar voo do ombro do espantalho

— Ave maldita! — grunhiu limpando a mão na parte limpa da camisa. — Que Diabos é isso? — falou se levantando sobressaltado ao perceber a cabeça do espantalho se mover de um lado para outro lentamente.

Quando os Pássaros Pousam e Outros Contos PsicopáticosWhere stories live. Discover now