3. cite o que escreves

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3. cite o que escreves

     Os gêmeos, os quais eu não sabia que existiam, me seguiram sem nenhum palavrear. Os dois entrelaçaram suas mãos, pequenas e macias comparadas a do irmão mais velho, e ajustaram as mochilas escuras e idênticas que tinham nas costas. 

     Seus pés batiam com vigor, diferente de qualquer um dos seus movimentos. Eles ficaram impressionados com a frase em Libras que eu tinha falado, porém foi o irmão deles ir para longe que voltaram com os rostos franzinos e de protesto à minha pessoa. 

     Não tinha compreensão sobre o que fazer com crianças daquela idade. Não sabia nem a idade certa deles, mas pareciam adultos o suficiente para me desequilibrar, e desarmar caso eu tivesse algo escondido nas minhas mangas à partir dali, o que piorava tudo o que eu estava começando a programar na minha mente. 

     Zeus tinha concordado. Ele estava desesperado o suficiente para que aceitasse uma proposta que nem eu tinha certeza sobre e esperava que ele não conseguisse ler através do meu rosto. Ele não tinha como saber o que eu pensava ainda, não como Aimée.

    Olhando para trás, tive certeza de que eles estavam me seguindo mais uma vez. O caminho de volta para a livraria parecia ser maior do que a ida, o pavimento e o som de partículas de pedra contra calçado que dele vinham davam a impressão de que tudo estava magnificado, que os três passos que faltavam afetaram como nove os músculos da minha perna e que o gelado da maçaneta da porta congelaria assim que desse todo o meu braço. 

    Eu controlei para que não começasse a chorar de nervoso ou mostrar o quanto eu estava despreparada. Apenas fiquei em pé, dando espaço eles passarem, enquanto apertava o metal da maçaneta esperando que ele realmente congelasse o tempo e eu tivesse alguns segundos para me recompor melhor daquela nova sensação. 

     Eles eram crianças, irmãos de Zeus. Nada de tão ruim poderia acontecer, e certamente nada das opções macabras que passavam na minha mente onde a maioria das minhas prateleiras cairiam e eles arrancariam pedaços de livros clássicos, ou como o deus dos deuses e daquele grupo de amigos me passaria a perna e não escutaria o que eu tinha para dizer. 

     — Vai ficar parada aí? — A garota perguntou. Suas mãos ainda seguravam a alça, algo na posição que ela tinha mostrava que ela estaria mais nervosa que eu. 

     — Não... Perdão, acabei sonhando acordada. — Confessei, piscando a visão de um monte de folhas de livros rasgadas no meio da minha biblioteca sendo encharcadas por café. Me afastando da porta voltei a caminhar e fechei o bloco que serviu de apoio com um clique preciso. 

     A placa de aberto para fora dava um tempo para o meu corpo tranquilizar. Eu estava trabalhando, eles iam se comportar e eu não ia arruinar a minha chance com Zeus.

     Fixando meu olhar neles, percebi que já estavam sentados, olhando um para o outro enquanto sussurravam sobre algo. Seguindo a atenção deles, vi o motivo e desejei que Aimée estivesse ali para que eu pudesse sussurrar o quanto queria torcer o pescoço de Aquiles e prevenir que eu realmente o fizesse. 

    Atirado no seu modo clássico, Aquiles estava com as pernas em cima de uma mesa enquanto conversava com uma das nossas garçonetes.

    Inalando todo o ar possível e expelindo logo depois, girei nos meus calcanhares, agarrando a maçaneta novamente. Dessa vez, ela estava quente, assim como minha cabeça que implorava para explodir em um único momento de braveza. 

     Puxando e empurrando com força, a porta engatou com um estrondo e logo seguiu o barulho de uma cadeira sendo arrastada e passos rápidos para a cafeteria. Só queria que ele levasse a sério aquela oportunidade, talvez na única vez na vida, e provasse que o que eu sentia por ele não era verdade.

Boa tarde, Zeus ✓Where stories live. Discover now