Seis

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Leon não conseguia deixar de se sentir frustrado. Aquela noite, com aquela garota, tinha sido um erro. Ele não deveria ter lhe dito seu nome verdadeiro. Ele não era mais Leon Hawthorne há muito tempo. Era apenas um estranho com um nome diferente a cada 20 anos. Não devia ter sido diferente dessa vez. Mas foi.

Ele sabia que tinha algo de estranho, algo de... familiar naquela garota. Violet, era seu nome. Depois de tanto tempo frequentando aquela biblioteca dia após dia, ele sabia um par de coisas sobre ela. Não entendia por que tinha essa necessidade estranha de observá-la. Mas aquilo tinha que parar.

Ele tinha decidido, não iria mais passar suas tardes naquele lugar. Tinha tido séculos para ler, e sabia que provavelmente não havia um sequer livro naquela biblioteca o qual ele não tivesse lido ou pelo menos dado uma olhada. Assim, não havia motivos para estar lá. Havia?

No entanto, mesmo tentando negar a si mesmo, ele sabia que não conseguiria se manter longe.  Aquela garota lhe fazia lembrar...

Balançou a cabeça e franziu a testa ao chegar à familiar casinha branca. A porta estava aberta, um convite mudo para que ele entrasse. Jogou um olhar para os lados, como forma de precaução, e entrou pela porta, fechando-a em seguida.

Encontrou-a sentada na cozinha, compenetrada com algo que cozinhava no fogão.

— Parece preocupado, rapaz. — ela disse, sem nem mesmo olhá-lo. — O que o aflige?

Leon sentou-se numa das quatro cadeiras dispostas ao redor da mesa, nem um pouco surpreso pelo fato da velha senhora ter percebido seu estado de espírito sem ao menos lhe dirigir um olhar.

— Não é nada — respondeu por fim. — É irrelevante.

— Nada é irrelevante, filho. — Norah colocou a tampa sobre a panela, e finalmente se virou pra ele, ajeitando os óculos sobre o nariz.

— Você não tem medo de deixar a porta aberta? — Leon tentou mudar de assunto, sentindo-se incomodado com o escrutínio da mulher.

— Nada entrará pela minha porta se eu não quiser — ela sorriu esperta. — Mas você já sabe disso.

— Como... como vou encontrar a garota? — ele perguntou depois de um tempo, revelando o motivo pelo qual estava ali – mas que ele tinha certeza, ela já sabia.

Norah não respondeu de imediato, apenas fez seus passos para mais perto, sentando-se em uma cadeira de frente à dele. Cruzou as mãos sobre a mesa e o encarou.

— Você não vai encontrá-la. Ela virá até você.

— Virá?

— Sim. Já está feito. Um feitiço para compeli-la a encontrá-lo. Ela sentirá que precisa estar em um lugar. Seus pés a trarão onde precisa estar — ela esclareceu.

— Não há nada que vocês, feiticeiras, não possam fazer? — resmungou.

— Dificilmente — ela respondeu com um sorriso. — Veja bem, não foi apenas um feitiço que eu tive que lançar.

Ele franziu a testa novamente, e encarou-a.

— O que quer dizer?

— Também usei um que repelisse todo o mal para longe — a feiticeira completou. — Pelo menos até que ela esteja bem próxima a você.

— Depois ela ficará vulnerável — ele concluiu.

— Sim — foi tudo o que Norah respondeu.

Leon assentiu, desviando o olhar para um ponto sobre a mesa de madeira.

— O que seria esse... mal? — quis saber Leon.

— Uma pessoa que entrega sua alma ao mal como Dierdre Montgomery fez quando o amaldiçoou, se torna um espírito vagante. Ela vaga pelo vácuo existente entre a vida e a morte, e nunca poderá ter seu descanso eterno, a menos que seja libertada, tal como você — ela começou a explicar. — E com o tempo, a raiva, a frustração, o ódio por não pertencer a lugar nenhum a faz enlouquecer. O ódio é um sentimento poderoso — suspirou. — Poderoso suficiente para ultrapassar a frágil barreira entre vida e morte. E quando isso acontece... esse espírito está mais condenado ainda. Porque se torna um demônio — Ela fez uma pausa. — Dierdre Montgomery é um demônio. E está atrás da única pessoa que pode salvá-lo.

Leon suspirou. Ele se sentia cansado. Suas esperanças estavam enfraquecidas, como sempre estiveram. Ele já tinha presenciado o mesmo tipo de acontecimento várias vezes. Quando ele achava que tinha uma chance de se libertar, tudo caía por terra. Ele já estava preparado para uma nova decepção. Pelo menos, era o que ele costumava dizer para si mesmo. Fechando os olhos, ele ainda podia se lembrar da primeira vez em que ousou ter esperança...

Supplicium [Completo]Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon