A Soberana do Ouro Negro

P r o l o g u e

A RAINHA DE OURO E A MÃE DAS SOMBRAS.

A aniquilação do planeta Phellis veio com um prefácio devastador. A ganância, apatia e hipocrisia dos humanos levaram o mundo a sucumbir. Guerras e vidas ceifadas desalentaram os corações mundanos, assolaram terras, depauperaram almas e levaram com elas a esperança. Tudo em nome do poder.

O poder de influenciar o livre arbítrio do outro e obter respeito através do medo. Os poucos que ainda sobreviveram só tiveram uma única saída: Rogar.

Preces foram devotadas a todos os Deuses existentes ou não-existentes, lágrimas de sangue foram entornadas em súplicas de uma salvação, o clamor por mais uma chance para viver. E assim, a mãe-natureza, vendo seus filhos à beira da destruição, utilizou de todo seu poder, mesmo exaurida pelo caos que se enraizou no mundo, e usou seu último suspiro para atender o chamado de seus filhos.

Duas irmãs, gêmeas. Stella e Samara, ambas descenderam com poderes atípicos que salvariam a humanidade. Stella extraia sorrisos e suspiros diante de sua presença, trilhava paz, amor e bondade por onde passava. Seu otimismo recobrava o mais encovado fio de esperança que poderia existir dentro de um ser vivo e, assim, cresceu sendo venerada por todos. A própria luz.

Em contrapartida, Samara dotava de traços rebeldes e levou mais tempo para sentir o bombardeio de seus poderes transitando por suas artérias. Em um momento de obstinação, descobrira que sua habilidade era conjurar as sombras e os mais viperinos e soturnos sentimentos. A garota de olhos prateados emanava pavor e obscuridade por onde cruzava, o que fazia pelos içarem de quem se atrevesse a olhá-la.

Ambas irmãs eram atribuídas à inteligência e argúcia. Aos dezoito anos, Stella fora remunerada com dois impecáveis pares de asas flamejantes, enquanto o único par de asas de Samara era tão negro como as penas de um corvo. As gêmeas voejavam o mundo e se deleitavam com o prazer da companhia uma da outra.

Apesar das divergências, se amavam calorosamente. Com certa idade, elas conceberam outros seres derivados de seus poderes, sendo eles Iluminados ou Obscuros. Captaram a habilidade de transferir parte de seus dons a outras pessoas, cada criança abençoada por uma das duas, adquira habilidades diferentes. Sendo este, premeditado pelas raízes mais profundas de suas almas.

Com o tempo, a coexistência contínua entre luz e sombras não foi como esperado.

Para evitar confrontos entre os portadores que agora usufruíam de talentos suficientes para destruir uns aos outros, as irmãs decidiram se separar e fundar seus impérios. Ao sul do continente de Íllis, nas areias brancas da praia de Gallifrey, onde a luminosidade do sol irradiava nas águas do mar cristalino, Stella erigiu seu maior reinado. Um palácio esculpido de ouro branco e rubi. A Senhora da Luz fora nomeada de Rainha de Ouro, pelo seu próprio povo.

Samara atravessou as florestas de Kochgiwe e, ao norte do continente, nas ruínas de Haiyd, que se localizavam próximo a um vulcão inativo, transmutou todo pó e escombro em, o que seria conhecido futuramente, como as Torres Negras. Forjadas com obsidianas e diamante negro. Nelas viveram os primeiros seres com poderes das trevas. A dona da escuridão fora nomeada pelos seus súditos como a Mãe das Sombras.

A prosperidade dos reinos, a jovialidade das irmãs e a esperança prevalecendo na terra, semearam a ira dos príncipes do inferno, fazendo a inveja dos demônios se tornar algo perigoso aos humanos e aos portadores. Após um milênio de paz, os comandantes do abismo das almas decidiram que o caos deveria se instaurar novamente, então planejaram e assassinaram o Rei de Ouro, fazendo com que a dor lúgubre penetrasse o coração da Rainha, a garota que mais retinha luz dentro de si.

Anos se passaram e nada confortava a doce alma da garota iluminada. Ver sua irmã vivendo feliz com seu parceiro, a destruíra ainda mais, ela achava que nunca conseguiria amar novamente e isso fez sua fé murchar cada dia mais.

E um corpo sem esperanças, é o abrigo perfeito para o desespero.

Ao perceber que sua gêmea estava se perdendo para a melancolia e depressão, a Mãe das Sombras viajou para as terras do sul na intenção de confortá-la. A Senhora das Trevas acreditava que Stella, sendo a Senhora da Luz, iria se recuperar, em razão de que sempre fora a mais otimista e positiva das duas.

Em uma noite, durante a estadia de Samara no Palácio de Ouro, um surto psicótico levou a Rainha a decidir que sua irmã não era mais merecedora da felicidade que a si mesma. Achou injusto ser devorada pela dor e nunca ter encontrado o amor de novo, enquanto a Mãe das Sombras vivia feliz ao norte com seu esposo. E assim, deixou que a inveja e tristeza consumissem seu coração, adotando a postura mais tenebrosa e sombria que uma portadora de luz poderia ter.

Stella assassinou Samara durante a madrugada.

E nunca mais foi vista novamente.