Havia treinado e aprendido durante anos a esperar o inesperado. Atenção é necessária porque, em um minuto de distração, o inimigo pode usar a oportunidade para explodir seu comboio. Nem todo treinamento do mundo, contudo, podia te preparar para algumas coisas tais como certas ironias da vida que te levam a trabalhar para o homem que você detesta desde criança. Ou sua vizinha destrambelhada batendo em sua porta em um horário esquisito – para falar de um assunto mais esquisito ainda.
- Conversar? – repeti, arqueando a sobrancelha e cruzando os braços. – À essa hora? Não dá para esperar até ser de manhã?
- Não, não dá.
- Você não tinha um jantar hoje? – resmunguei, amargo.
Sim, eu ainda estava de mau-humor por ela ter saído correndo. Ficara com um humor do cão durante o dia inteiro, já que trabalhar havia sido especialmente penoso frente à perspectiva de não encontrar minha vizinha para uma sessão noturna de Game of Thrones. Não percebi o quanto gostava de assistir TV - enquanto minha vizinha atrapalhava tudo com seus monólogos sobre amenidades – até que ela cancelou nossa rotina sem aviso prévio e com uma desculpinha qualquer. - Já foi – respondeu, revirando os olhos. – São onze da noite.
- E mesmo assim você foi bater na porta alheia. Onde foram parar as boas maneiras, hein? – não conseguia conter o tom zombeteiro.
- Isso até me irritaria se já não tivesse me acostumado com esse seu tom, Knight.
Dizendo isso, ela espalmou a mão sobre minha barriga, imediatamente irradiando um calor que fez descer arrepios por minhas costas, e usou sua tática de sempre de me pegar distraído para se esgueirar para dentro da minha casa. Encarei o teto por um segundo, perguntando-me como ainda caía nessa. Soltei o ar pesadamente e arrastei os pés ao segui-la depois de trancar a porta. Reid estava sentada no sofá, os cotovelos sobre as coxas, inclinada para frente e mexendo os pés, mantendo a ponta deles no chão enquanto subia e descia o calcanhar repetida e nervosamente. Sentei-me na mesinha de centro para ficar diretamente de frente para ela.
- Não gosto de coisas mal resolvidas. Então vamos dar um jeito nisso.
- Nisso?
- Por algum motivo fora do entendível, eu aprecio sua companhia – ela ignorou minha pergunta.
Ou melhor, ela praticamente me ignorava por completo, já que falava olhando para algum ponto sobre meu ombro.- E, apesar do que você vive dizendo, sei que você também gosta do tempo que passamos juntos. Mas precisamos melhorar algumas coisinhas. A primeira delas são suas maneiras.
- Minhas... maneiras? – repeti, incrédulo.
Essa porra de dia de merda não acabava.
- Exatamente. Não gosto desse tom que você usa comigo – desenlaçou as mãos cruzadas para levantar o dedo indicador em riste.
- Não gost-
- Esse tom mesmo. Não, não – sacudiu o dedo.
- Mas que mer-
- Não!
- Que porr-
- Tente outra vez.
Minhas mãos se fecharam em punhos enquanto respirava fundo e olhava para o teto, decidindo me acalmar, já que a outra opção era esganá-la. Depois de contar até cinco algumas vezes, finalmente consegui controlar meu temperamento o suficiente para tentar amaciar minha voz e falar:
- Ok, Ok. Esse tom está bom para você? – falei, baixo e condescendente.
- Bem mais aceitável – assentiu. – O próximo passo é trabalhar essa sua atitude.
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Blackbird
Romance~ Para saber mais da história, spoilers, conversas temos o grupo no facebook: https://www.facebook.com/groups/373683776111201/ ------ Para algumas pessoas apenas um breve período longe de casa pode transformar o que conhecem em algo estranho; pa...