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-Aconteceu alguma coisa? -A voz preocupada de Lottie se destacou por pensar que algo poderia estar errado comigo, porém, logo neguei que fosse algo mais sério. Bom, pelo menos não em relação a mim.

-Eu quero deixar bem claro que eu não quero que você faça isso. -Olhei pela última vez para trás e pelas laterais, tentando perceber se Harry, por alguma razão, teria vindo atrás de mim quando me viu sair sem motivo. Meus batimentos estavam tão agoniados quanto minha própria cabeça. -Mas eu sei que ele não vai me ouvir, então essa é a única...

-Louis? Não me fala que...

-Eles vieram aqui, mas foram embora e disseram uma coisa completamente diferente para o Harry. Eu falei que alguma coisa estava errada, eu senti isso! -Troquei o eletrônico de mão e passei meus dedos por cima da pálpebra dos meus olhos secos. Eu preferiria acreditar que acordaria quando a pressão das minhas digitais saíssem dali do que encarar o fato de que eu realmente estava pedindo aquilo.

Eu jamais faria isso, por que eu estava fazendo agora?

Nunca soube responder quando alguém questionava se as situações de perigo nos moldavam em determinadas situações ou se nós apenas somos aquilo que já pretendíamos ser. Nunca, na verdade, é uma palavra muito grande. Eu poderia saber, em algum momento da minha vida, mas certamente não era esse.

-Te mando o que eu conseguir por mensagem. Tudo bem? Eu só preciso terminar de fazer algumas coisas aqui e eu dou um jeito de resolver até amanhã. -Assenti respirando aliviado e, ao inspirar, sentia o peso voltando para o topo das minhas costas, como se pertencesse ao meu corpo. Lottie sempre soube o que falar, deve ter aprendido com o jeito único da nossa mãe. -Finja que nada aconteceu e não se tortura com pensamentos sobre coisas que você ainda não sabe. Nada disso é sua culpa e vai ficar tudo bem. Lembra quando você fala isso para mim quando eu não conseguia fazer os deveres da escola, que nós daríamos um jeito? A gente vai dar um jeito nisso!

Era verdade. Minha irmã sempre detestou sentar e prestar atenção em livros com informações complicadas para se aprenderem apenas por olhar e ler, eu também era assim, embora precisasse fazer isso por ela e acabei me interessando na leitura. No final do dia, era o único lugar onde eu poderia ser eu mesmo e uma pessoa completamente diferente, ao mesmo tempo. Não sabia como isso era possível, mas conforme me via através das letras e reconhecendo meus sentimentos mais profundos, também fugia da realidade do qual não queria estar. Personagens fictícios nunca pareceram tanto comigo e eu nunca fui tão diferente dos mesmos.

Pelos próximos minutos, ler foi tudo o que eu fiz. Devorar livros para não olhar minha situação atual enquanto ouvia Harry falar sobre ter sido um sinal de que ele não estava cem por cento preparado ainda para reencontrar seus pais, mas agora estava e saber a verdade me fazia querer, por segundos que fossem, que eu estivesse na sombra da ignorância.

Dói menos estar em uma posição onde você não precisa encarar os fatos do jeito que são, a realidade nua e crua a frente de seus olhos, porém, a ilusão seria como enxugar gelo: É tentar enganar os fatos sem resultado algum. Tantas pessoas no mundo em busca de uma verdade. Alguns questionam a verdade sobre o porquê estamos aqui, outras sobre a verdade de onde vieram e outras sobre quem são. Apenas uma verdade poderia mudar milhares de mundos e não me parecia justo querer escolher a ignorância mesmo tendo o acesso a verdade. Injusto, mas fácil, indolor e cômodo.

Com o final da tarde chegando, nenhum de nós aguentaria desperdiçar um dia de viagem por conta do cansaço e Harry decidiu correr alguns quilômetros pela cidade, também com o intuito de conhecer mais aquelas ruas, cujo nunca estivemos antes. Harry foi e, pela primeira vez, eu fui junto. Ele não era a única pessoa que tinha assuntos pendentes para espairecer.

Uncertain Call - (L.S)Where stories live. Discover now