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-Não. -Harry ressaltou para mim, ainda no escuro. O despertador tocou pela segunda vez e eu finalmente acordei para desligá-lo. Ainda sem recuperar meus sentidos, me virei na cama, ouvi Harry falando seco e não poderia ficar mais confuso em uma ponte entre estar acordado e ainda dormindo, embora tenha despertado para pensar se eu teria feito algo errado, ou coisa assim, ao ouvi-lo. -Não precisa me acordar, eu não consegui dormir.

-Nem um pouquinho? -Foi tudo que minha cabeça conseguiu processar naquele minuto. Internamente, sentia muito por isso porque eu mesmo mal conseguia deixar meus olhos abertos e não querer voltar a dormir fingindo que nada acontece. Parecia que todo o descanso me deixou ainda mais fisicamente cansado e eu apenas queria estar ali por mais tempo.

Harry negou com a cabeça e um barulho nasal de negação, senti seus movimentos na cama e o puxei para mais perto de mim. Será que o mundo sentiria minha falta se eu cochilasse por mais cinco minutos? O mundo talvez não, mas a companhia aérea provavelmente sim.

-Por favor, me fala que a gente pode ficar assim aqui para sempre. -Eu nunca quis tanto mentir para Harry e para mim mesmo, mas a resposta não era a que queríamos ouvir agora. O cobertor estava com o calor dos nossos corpos, ou seja, perfeito, se juntarmos o fato de que o colchão e o travesseiro pareciam me abraçar como uma roupa nova.

-Eu prometo que não tenha nada que eu mais queira agora, mas eu acho que a gente ainda têm um voo para pegar... -Resmunguei baixo ajeitando-me ao seu corpo. Péssimo dia para ter compromissos marcados.

Harry soltou uma pequena risada pelo meu jeito manhoso de falar, cujo percebi só depois que a frase foi dita, porém, estava desligado demais para me importar. O ambiente ficou mais calmo impossível depois da pequena conversa no colchão.

-Você... Quer saber o que aconteceu ontem? -Depois de ouvir a voz do Harry fazendo aquela pergunta, percebi que realmente ainda não tínhamos conversado sobre aquilo, em meio a todas explicações e confusões do dia anterior.

-Você quer falar?

-Eu acho que sim. -Disse tirando todo ar preso dos seus pulmões, nem ele tinha certeza de quão pesado estava. -Eu passei a madrugada inteira pensando sobre o que aconteceu, imaginando mil cenários diferentes e várias coisas que eu poderia ter dito. Então, eu acho que o mínimo que eu posso fazer por mim é falar um pouco com alguém.

-Como você soube que...? -Eu não sabia o que falar ou perguntar sem pensar que estava sendo invasivo ou que deveria apenas ouvir, aliás, nem sempre sabemos o que falar, mas quase sempre sabemos como ouvir.

-Eu cheguei lá batendo o pé contra você e tentando não pensar no que você disse. Eles estavam iguais nas fotos, um pouco mais velhos do que eu lembrava, mais conservados também. Eu almocei e eles me mostraram um álbum de fotos da Gemma com algumas fotos minhas. Falaram que as minhas fotos de criança estavam em outros álbuns que se perderam na mudança e eu achei justo, não pensei muito e acreditei.

-Foi como se você não tivesse existido? Não tivesse sido filho deles? -Minha mão rastejou persistente até seus fios finos de cabelo e acariciaram-os por ali.

-Pensando agora, foi. Eles me apagaram. -Lamentou fungando seu nariz rapidamente e voltando a falar sem dar muito tempo para pensamentos paralelos. -Eles não podem me tirar de tudo assim. Eu sempre vou ser o filho deles, não vou? Como eles conseguiram isso se eu mesmo tentei e tudo que eu consegui foi criar mais esperança? Eu devo ter feito alguma coisa muito ruim em outra vida, ou alguma coisa assim, para eles terem tanta raiva de mim. Irônico porque não era os pais que deveriam amar os filhos e cuidar deles? Se importar? Eu nunca vou entender isso...

Uncertain Call - (L.S)Where stories live. Discover now