A fronteira do Império

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Retrato feito pelo polonês Kamil Porembiński.

( https://flickr.com/photos/22178197@N00/21966605546 )

“Como está o seu nariz Lauren?”

Afastou seu olhar dos monumentais prédios enfileirados.

Nem havia chegado ao ponto turístico ainda e a cidade já a recebia com construções colossais.

Embora elas fascinassem formando corredores numa avenida que conseguia ser quase tão larga quanto elas eram altas, não queria perder a expressão confusa da outra.

Os olhos, que hoje se influenciavam com o alaranjado das luzes húngaras, se apertaram sutilmente, em reflexão.

Uma vitrine traidora entregou o fato de que fisicamente o nariz estava intacto.

Parecia descartar algumas possibilidades de significado.

Quando uma conclusão veio, foi num tom falsamente convicto:

“Achei um documentário realmente inovador”

Seu riso foi incentivo suficiente para outra continuar com a graça.

“Um jogo de viagem belissimamente estimulante?”

“Nope”

“Não é possível que exista um quadro com esse nome”

“Não que eu saiba...”

“Me dê uma dica”
 
“Tem a ver com a cidade”

“Hmmm... com a cidade...”

Ela adotou uma expressão tão concentrada que quase se sentiu culpada por fazê-la pensar tanto antes de um dia de trabalho.

Estava na iminência de entregar a resposta quando ouviu a rouquidão.

“Okay, tenho uma teoria”

“Me conte”

“O que eu ganho se acertar?”

Pelos céus, para quem não aprovava o capitalismo, ela certamente amava um prêmio individual.

“Você ganha a oportunidade de.... colocar uma luva em mim?”
 
Não aguentou segurar a gargalhada.

Era gostoso debochar de Lauren.

No começo era só sua implicância se manifestando, uma forma do seu ressentimento escapulir.

Mas não agora.

Não fazia para chateá-la, mas justamente porque sabia que não iria se chatear.

Lauren era imune.

Provando seu ponto, um sorriso largo.

“Muito espirituosa. Tudo bem sua avarenta, vou te deixar ouvir minha teoria de graça”

“Conte tudo”

Sem interromper seus passos, Lauren adotou a postura de quem apresentava uma ideia, como se estivesse tentando vender uma estratégia de marketing num episódio de Mad Men.

A performance foi entregue confiante e pausadamente:

“Em Budapeste, olhar ao redor sempre envolve olhar para o alto. Essas estruturas enormes. É como se a cidade demandasse que você andasse de queixo erguido como um verdadeiro patriota húngaro. Então meu nariz estava em pé”

Era nítido que ela conseguia o que quisesse nessas reuniões de escritório.

Ou de um juiz.

Do Júri.

Modulação PolicromáticaWhere stories live. Discover now