Além da Floresta | Versão Wattys 2020

Capítulo 27. 🌲🌙🌲

Há duas forças em você, equilibre-as e as deixe fluir... as deixe crescer, filha das árvores...

Quando eles puseram seus pés além do limite do vilarejo, eu pude sentir. Era como se eu pudesse sentir seus corações batendo forte e alguns assustados. A dor que me dilacerava com a morte da grande árvore e da Tecedeira havia amenizado aos poucos, mas ainda habitava meu amago e compreendi que ela permaneceria lá para sempre, seria minha triste companhia. Um dia, eu estaria determinada a sentar e conversar com as minhas maiores dores e perdas. Pessoas que eu amei e perdi ao longo de tudo isso. Eu pediria perdão. Agora isso fazia parte da memória verde. Quando eu estava dentro da Grande Árvore, não fazia ideia do que poderia ser realmente a memória verde, mas de fato, ela já estava dentro de mim. Como se fosse um novo sentido e este fosse capaz de aprimorar todos os outros já existentes em mim. Recebi os primeiros sinais de que nossos inimigos haviam pisado na floresta primeiro através de arrepios e em seguida as antigas vozes das árvores que agora se comunicavam comigo.

Temi que aquela batalha que estava prestes a acontecer fosse um erro. Eu teria que carregar a morte de todos aqueles seres que estavam ao meu lado comigo por toda a minha existência. Rivana estava comigo e eu temi por ela. Senti medo por Uggo que estava distante de mim e me perguntei o que aconteceria depois.

– Nós vamos ter as histórias mais loucas para contar, não acha? – disse Rivana, me olhando pelo canto dos olhos. Ela havia me ajudado a ficar de pé, mais uma vez, como fizera durante anos da nossa amizade.

Sempre havia planejado uma vida com ela, em segredo, e distante de todos que nos cercavam. Nem mesmo ela poderia ler os meus pensamentos mais secretos e profundos. Quando falávamos sobre ir além da floresta, descobrir novos lugares, sempre acreditei que Rivana me queria ao seu lado apenas como melhor amiga e se fosse isso, para mim já seria o maior presente da vida. Mas obviamente, havia algo que habitava dentro de mim que queria mais. E após o nosso primeiro beijo, tudo começou a borbulhar dentro de mim. Sonhos antigos da minha fase febril de apaixonada voltaram para a minha mente.

Queria protegê-la, mas muitas coisas mudaram entre Rivana e eu e com ela mesma. Antes que eu pudesse dizer para ela ficar e cuidar daquelas criaturas que não lutariam, ela se mostrou determinada a ir comigo.

– Partiremos agora para uma batalha decisiva – falei, a princípio, achei que nenhuma daquelas criaturas estavam com atenção para mim, mas quando ouviram minha voz, todos os olhos de diversas cores e tamanhos me encararam em silencio. – Nós já perdemos muito ao longo de séculos e gerações durante uma guerra silenciosa e feroz. Perdemos aqueles que amamos e aqueles que tiveram coração para nos defender. – Falar daquela forma ainda soava estranho para mim. Senti como se estivesse dentro de um sonho. – Cada ser que partir para essa batalha, carregará consigo a esperança de esta será a nossa última! Não haverá mais lutas e todos poderemos viver em paz.

Rivana segurou meu braço, suas mãos me apertaram forte.

– Eu falo pela voz da magia verde! A magia da floresta e que nos mantem vivos e guiados pelos nossos antigos, iremos enfrentar nosso inimigo que já se aproxima!

Ouvi muitas vozes nesse momento. Vozes das árvores, que eram familiares pois falavam em meus sonhos mais remotos e vozes daquelas criaturas que surgiam de toda a parte da floresta. As criaturas que estavam no santuário e sobreviveram ao ataque de Fridr se curvaram diante de mim e eu senti vergonha e temor por suas vidas. E havia aqueles outros seres mágicos que habitavam outras partes, e que ouviram o chamado para a luta. Gigantes, faunos, fadas e ninfas. Eu os conhecia agora e sabia do passado de cada um deles. Sabia também o que eram capazes de fazer para defender os seus e proteger seu lar. A neve voltava a cair e fazia frio, mas ninguém parecia senti-lo. Logo uma brisa soturna veio até mim como um aviso. iriamos ao encontro deles.