Capítulo 29. 🌲🌙🌲

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Quando despertei, parecia que cem anos haviam decorrido sobre mim. Me senti velha como as ruínas abandonadas, assombrada por fantasmas e os meus fantasmas estavam em minha mente. Eles me conheciam bem. O peso do céu estava sobre o meu peito me esmagando, encontrei dificuldade em respirar e enxergar. Lentamente, minha visão ficou nítida. Eu estava em um quarto iluminado apenas pela luz do dia que entrava pela janela. Tentei falar ou gritar, mas nenhum som saia da minha garganta até que eu rolei pela cama e caí no chão como um feixe de lenha seca e rígida. Me ergui do chão ainda atordoada, visões da batalha vinham a minha mente como se fossem pesadelos antigos e tudo que eu lembrava estava confuso, misturado com dor e pavor. Aquele quarto era o de Rivana, estava em sua casa e não fazia ideia de como tinha ido parar ali.

– Rivana! Você está aí? – chamei ao bater na porta que estava trancada. Ouvi passos se aproximando apressados e ansiosos e quando a porta se abriu, vi o rosto da minha mãe, emocionada e pálida como se estivesse diante de uma assombração.

– Você demorou a despertar – ela disse e me puxou para os seus braços. Nosso abraço poderia durar toda uma vida e não seria suficiente. Minha mãe estava chorando e soluçando, seu corpo tremia com o meu. – Tive tanto medo de perder você também. Agora tudo acabou, mas você vai precisar partir, minha filha!

– Partir? Do que está falando?

– Todos estão lá fora, esperando você acordar para expulsá-la daqui ou coisas muito piores. Quando o sr. Viggor morreu junto com seu... – ela suspirou e baixou o olhar. Queria dizer a ela que estava tudo bem, eu já sabia do que havia acontecido, mas assumir isso também me causou dor. – Eles todos te querem longe daqui. Você e ela. E todos que estão protegendo a casa.

– Eu estive em uma batalha para conseguir salvá-los. Como podem agir dessa forma? Onde está Rivana?

– Ela sempre vai para um lugar específico na floresta neste mesmo horário do dia, filha. Você ainda está fraca e precisa repousar mais. Nós tentaremos manter em segredo o seu despertar.

– Eu vou falar com todos eles!

Minha mãe tentou me segurar e implorou para que eu não aparecesse lá fora. Quando pus os pés para fora da casa dos Viggor, fui recebida pelo frio da manhã de inverno e aquela luz do sol que entrava pelo quarto que não era nada além de morna e pálida. Mas eu me senti viva como não me sentia em muito tempo. A brisa gélida me cumprimentou, eu estava diante de uma barreira feita por árvores, elas nunca estiveram ali, então entendi o propósito.

– Muitos outros seres estão protegendo a casa, esperando você acordar – disse uma voz atrás de mim. – Eles queriam leva-la para a floresta, agora que você tem muito mais de nós do que desses que tentam ataca-la.

– De certa forma eu entendo os motivos deles, viveram muitos anos sob o medo, na sombra de uma ignorância que descia por suas gargantas – falei, me virei e vi o rosto de Alvora e suas penas brancas que sumiam aos poucos quando estava nessa forma. – Por que me trouxeram para cá, então?

– Rivana insistiu, mas quando aparecemos aqui somos atacados ou insultados, então as árvores ou andarilhos, vieram formar essa barreira e ajudar a te manter segura.

Olhei para elas, imóveis e resistentes ao frio. Desci os degraus da casa dos Viggor, como se ainda estivesse aprendendo a andar e me aproximei das árvores-andarilho, toquei no tronco frio de uma delas e senti toda a sua vida ali, protegida por camadas que demoraram anos para se formarem. Ela recuou tímida de mim e respeitosa, arrancando suas raízes do chão e movendo-as lentamente e as outras fizeram o mesmo conforme fui passando. O vilarejo se revelou para mim conforme caminhei em sua direção. Aquele lugar que nunca fora receptivo para mim, agora me encarava hostil por muitos pares de olhos. Quase todas as pessoas estavam ali, a minha espera. Homens seguravam facões e tridentes, espadas amassadas, marretas e tochas que tremulavam com o vento frio. Aquelas chamas eram para me queimar. Mulheres, com seus filhos escondidos atrás de si, como se fossem um escudo para que eu não as atacasse. Desejei que Rivana estivesse comigo. Ela saberia quais palavras dizer e como encarar tudo aquilo. Ela havia aprendido muito de seu pai e em alguns momentos era persuasiva como ele. Ela não estava comigo. Quando olhei para mais distante daqueles rostos furiosos, encontrei Uggo, ele era o único entre aquela multidão que não queria me ver em cinzas. Mas parecia entristecido.

Além da Floresta | Versão Wattys 2020Dove le storie prendono vita. Scoprilo ora