Capítulo 32

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Hektor era um monstro determinado a devorar Naevia.

Ele puxou as sombras cravadas nela como linhas presas por agulhas, sem a intenção de trazê-la para mais perto dele, e sim esticar a pele do demônio até o limite da forma mais dolorosa o possível. O pensamento racional de Naevia passou a piscar como uma lâmpada quebrada conforme a dor e a agonia cresciam e a dominavam.

Naevia não conseguia achar outra saída se não a de resistir com tudo que tinha, dependendo do revestimento de escamas sobre a pele para não deixar Hektor arrancar partes dela. Seu movimento estava limitado por conta da asa que tinha presa ao chão pelas sombras de Hektor, a impossibilitando de sequer considerar fugir de alguma maneira.

O problema principal de Naevia naquele momento era que ela não atacava de longe. Sua forma de lutar era exatamente oposta do irmão, então não podia fazer muito quando afastada na boa distância em que estava agora.

E Hektor, mesmo perdido no devorador feito de sombras que acabou se tornando, parecia saber muito bem disso.

Naevia não duvidava que torturá-la até a morte era uma motivação tão grande para Hektor agora quanto a de matar Ronan.

Afinal de contas, Ronan já havia morrido. Ela era a única que sobrou.

Naevia precisava admitir que ficava lisonjeada por toda a atenção, pois significava que representava ameaça para Hektor o suficiente. Mas a fúria desmedida que sentia no momento por não poder corresponder a cortesia à altura consumia todo e qualquer outro sentimento nela que não fosse dor e agonia.

Sua mente continuava voltando para a possibilidade de liberar miasma, mas sabia que a ideia era sabotagem.

Antes, achava que o corpo de Hektor não ia se adaptar ao miasma para se tornar um demônio, sendo destruído pela corrupção da sua própria magia; mas depois de vê-lo absorvendo todas as sombras que Ronan jogou nele e continuando em pé e ainda mais destrutivo do que antes, tinha a confirmação que Hektor se tornaria um demônio.

Um demônio pior que ela.

A questão de Hektor era que ele não tinha mais humanidade para perder. Ele era uma carcaça de magia desde o momento que foi criado em laboratório, como um corpo imortal que poderia suportar doses de poder que se chegavam perigosamente próximas de serem infinitas.

Não sobrava nada de Hektor como pessoa de verdade, mas não era isso que importava. Ele com certeza aprendeu a não se importar com isso de forma alguma.

Hektor não era exatamente um clone de Ronan, ele era um Véu artificial.

Naevia não podia permitir que Hektor tivesse acesso aos mesmos instintos que ela teve a vida toda por conta do miasma nas suas veias. A vontade incessante e enlouquecedora de consumir e destruir, em um ciclo que nunca terminava. Se isso acontecesse, Naevia tinha dificuldades em acreditar se alguém daquela operação toda sairia vivo dali.

Não confiava na LM para lidar com problema nenhum. Especialmente não após da sua e da morte de Navi, que eram os únicos seres com a capacidade de controlar o miasma.

Porém, Navi não tinha condições de lutar ao lado de Naevia. Ela percebeu o quanto ele se esforçava para sequer manter a consciência, a perdendo algumas vezes, assim que sua mente era a parte mais machucada do seu corpo - tão perto de se destruir em um ponto que não teria mais reconstrução, não da mesma forma que era antes.

Naevia estava completamente sozinha contra o monstro.

Não podia dizer que isso era surpreendente para ela.

Lembrava-se de noites de pura frustração e fúria em que tentava se forçar a emular a manifestação de magia de Navi, das tentativas de provar para si mesma e para todo mundo que era tanto filha da Deusa da Vida quanto filha de um Demônio das Memórias.

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