Capítulo VII: O palácio do rei herege

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Capítulo VII

"O palácio do rei herege"

A marcha dos fugitivos de Tileade prosseguia, seus pés já cansados chegando ao fim da extensa ponte de pedra sobre metade do rio Northar, pisando agora a terra da ilha em seu centro.

O local possuía aparência aterradora – e tal impressão não se dava somente devido ao sinistro palácio ainda de pé sobre si. Enquanto as duas margens do curso d'água eram cobertas por grama verde e abundantes arbustos, a vegetação rasteira da ilha parecia presa em eterna agonia, seus tons marrom-acinzentados conferindo à relva o aspecto de plantas mortas, mas que devido a uma negação da natureza permaneciam vivas em estado decrépito. As árvores próximas, por sua vez, eram totalmente secas, seus galhos desnudos de folhas contorcendo-se e curvando-se em macabras ramificações, assemelhando-se aos braços retorcidos de alguém que se debatera com intensidade antes de expirar. Para completar, a construção de dois andares, com seu telhado esburacado, paredes imundas, portas e janelas quebradas e vedadas com tábuas, pintura descascada e sinais de umidade – com liquens e musgos a se estenderem por sua estrutura até quase o topo – não parecia nada convidativa. Para falar a verdade, atormentava o íntimo do grupo a idéia de nem sequer tentar contornar aquela construção, recuando pela ponte à procura de outro caminho para atravessar o rio. As chances de encontrarem alguma patrulha vinda do forte, porém, impelia seus integrantes a continuar.

Caleb, olhando ao redor com atenção ao mesmo tempo em que avançava a passos lentos junto com seus companheiros, coçava o queixo barbado analisando cada detalhe da ilha misteriosa. Olhando para a esquerda, no sentido do qual vinham, visualizou, numa reentrância situada próxima a uma das esquinas da edificação e em meio a um par de colunas carcomidas, uma porta dupla de entrada, feita de madeira podre – outrora nobre. Ergueu um pouco os olhos... fitando acima dela um símbolo cravado na alvenaria – agora tomado pelo musgo e tendo assim perdido a nitidez e imponência do passado. Talhado com cuidado, representava um corvo, com as asas abertas, sobre a figura de uma espada com a lâmina voltada para baixo. Ao assimilar a antiga representação, o druida estremeceu.

Seria aquela a ilha de que ouvira falar tanto através de seus pais, algumas poucas vezes, quanto por intermédio dos relatos dos viajantes que cruzavam a Floresta Negra? Julgando pela localização e pelo recém-identificado emblema, tudo levava a crer que sim.

- Esta é a Ilha Rankan! – afirmou ele de súbito.

- Como é? – Lisah replicou sem entender.

- A ilha do rio Northar que foi submersa pelas águas, devido a uma onda gigantesca, durante o Crepúsculo dos Deuses – explicando melhor, Rosengard consultava suas mais remotas memórias. – Um lugar pouco amistoso, para dizer o mínimo.

- E esse palácio? – questionou Kirinak, intrigada. – Algum motivo em especial para estar dessa maneira? Uma razão para seus adorados deuses o terem arrasado assim?

- Esse era o palácio de veraneio de Volanir V, o último rei da malfadada Liga do Norte – Caleb revelou, bufando diante da petulância da clériga fugida. – Um dos maiores alvos da ira divina. Isso explica, talvez, o destino que essa construção acabou encontrando...

- O rei estava dentro desse palácio quando ele foi tragado pela onda? – questionou Hachiko, que não conhecia bem os acontecimentos envolvendo o cataclisma de vinte e dois anos antes.

- Não, não. Ele se encontrava na capital, Borenar, que foi igualmente arrasada; e o monarca, junto com sua guarda de Cavaleiros da Espada Longa, enviado para as regiões infernais, o Helmus. Mas, pertencendo a Volanir, este palácio foi visado pelos irados deuses assim como tudo mais que ergueu em vida.

Heróis de Boreatia: A Perfídia de MackerOnde as histórias ganham vida. Descobre agora