0. prólogo

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0. ela e o apartamento

Estava sentada no sofá e olhava os movimentos raivosos dele. Minhas mãos doíam e meus ombros estavam pesando contra o meu corpo. Não via felicidade ali naquele cômodo, naquela situação específica menos ainda. Era perda de tempo, mais tempo depois de todos aqueles meses.

— Tu sempre faz isso e eu não aguento mais. — Ele falou. Suas mãos que expressavam a irritação caíam do ar para suas pernas e causavam a interrupção dos meus pensamentos com o barulho. Ele falava, logo depois de ter se levantando do sofá e ter percebido mais uma vez que eu me arrastava para longe dos seus carinhos.

— Se tu não quer mais nada, então vai embora logo. — Disse para Lucas, seu corpo andava na minha sala de um lado para o outro, e seu cabelo perfeitamente arrumado ficava intacto mesmo com o vento que vinha da janela aberta. Mas ele parou quando eu falei.

Por trás disso, a voz de um dos personagens da série continuava conversando.

— Lívia... — Disse meu nome com aquele tom de superioridade, sentando na mesinha de centro na minha frente e amassando algumas revistas que ficavam em cima. Ele tentou tocar meus joelhos, então eu fugi e dobrei minhas pernas para cima do sofá e continuei encarando-o, desta vez com os braços cruzados. — Tu ainda coloca a culpa em mim?

— Simplesmente vá embora. — Disse, sorrindo para ele de forma irônica. Eu estava guardando as lágrimas no fundo dos meus olhos, esperando ele realmente ir embora de uma vez por todas.

Com um sorriso igual, ele me olhou. Ele sabia que eu amava ele, eu amava, e ele sabia o quanto aquele sorriso fazia eu querer que ele ficasse. Mas não conseguia continuar ali, escutando reclamações sobre como eu não era carinhosa, ou como eu não permitia beijos antes de escovar os dentes, ou como eu sempre acordava longe dele na cama.

Não conseguia aguentar aquela sensação de só mais uma noite. Só mais uma vez. Empurrando o que era tão diferente do que foi.

— Eu estou conversando contigo e tu está me mandando ir embora de vez? Não preciso falar então que se eu for embora, eu vou parar de ajudar a pagar o apartamento. E toda comida na geladeira. Assim como os presentes que eu te dou.

— Eu não preciso dessas coisas.

— Ah, sim. Tu não precisa de comida do mesmo jeito como tu não precisa de mim. — Ele continuava com o sorriso de lado. Ele um dia tinha sido meu herói, e no início eu sabia que adorava a ideia do meu medo de afeições. Eu sabia que a cada "Tu é linda" tinha esperança de mudar quem eu era, e manipular o que tinha acontecido comigo. Mas aí a cada "tu é linda" que ele falava ao me acariciar com os olhos, ele ia atrás das carícias de verdade com outras. Tinha noção, mas não entendia por que continuar comigo.

Chata demais. Fria demais. Eu era a Lívia que ele reclamava todo tempo, mas fazia com que eu quisesse ficar.

— Vai embora. — Disse firmemente. Eu já tinha desistido de vê-lo ali, era como se ao olhar fosse dizer palavras muito diferentes. Mas necessitava da sua saída.

Ao encontrar seu rosto de novo, depois de um suspiro, continuava não encontrando felicidade.

— Eu vou voltar. Tu não vai encontrar alguém que te aguente. — Disse, levantando os ombros e acreditando completamente no que tinha dito.

Depois disso, só conseguia escutar as roupas dele sendo retiradas dos cabides, ele cantarolando alguma música e a sua mala rodando pelo parquê escuro do apartamento.

A porta verde escura fechou com um clique simples e eu me deitei no sofá, encarando onde a TV ficava e onde atores continuavam atuando, mas eu não escutava nada.

Eu fui para o banheiro para tomar um banho, e com cada gota que caía eu tentava encontrar a força que eu tinha pro resto da minha vida e mas não no meu relacionamento. Tomei banho e fiquei pensando, querendo acreditar que não seria tão difícil encontrar alguém para dividir o aluguel. Ele podia, sim, estar errado.

Boa noite, Aquiles ✓Where stories live. Discover now