Capítulo 9 - Tetê

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Eu ainda apoiava a mão no chão, ciente de que não podia desmaiar. Meus joelhos não se moviam mais e eu sentia a respiração pesar, mas me mantive alerta, eu tinha que continuar. A luta não havia acabado.

Senti uma pressão nas costas, uma névoa fria, pesada e escura escapava de algum lugar. Eu podia sentir a escuridão se aproximando, envolvendo, faminta por algo. Meu coração tremeu junto das árvores. Eu olhei para trás. O capuz de Chelon havia caído e o breu tomava conta de tudo ao redor dele, apenas seus olhos cintilavam azuis. Vi a silhueta de algo se movendo em meio a névoa. Não soube distinguir o que eram, mas se moviam independentes, como cipós de uma árvore. Por um momento achei que havia escutado o rugir de uma besta e isso me paralisou. Vi Chelon levantar uma de suas mãos nuas, manchadas de um plasma escuro, e da palma eu vi algo se formar, uma aura azul. A magia brilhou com tanta intensidade que me ofuscou. Escutei o som de um disparo e senti uma onda de ar passar cortando por cima da minha cabeça. Em um segundo uma explosão atingiu a balestra e pedaços de madeira partida caíam pelo chão. Os ladinos foram lançados para longe e se encolhiam ao redor. Quando me virei para Chelon, a escuridão já regredia para dentro de sua capa e ele voltava a vestir as luvas.

Feridos e assustados, os atacantes recuaram, deixando para trás o homem-fera que jazia no chão, imobilizado por Bramba.

Eu vi Hiz caído, sentado no chão. Ele suava e sorria, quase gargalhando.

— Você não é tão inútil quando pensei... nunca iria imaginar que pularia na frente de um projétil daqueles. Nem Bramba faria isso. — Hiz falou ligeiramente derrotado mas eu senti alívio na sua voz.

— Isso... é...um pedido de ... desculpas...? — Eu tentei fazer uma provocação, mas uma tosse estranha me atrapalhou. Senti uma dor penetrante no local onde a lança ainda estava presa. Eu estava estranhamente calma para alguém que havia sido empalada viva e sabia exatamente o porquê. Era um sentimento feio, de derrota, de conformidade. No fundo eu achava que iria morrer e esse fato não me assustava.

— Melhor ficar quieto. Essa coisa perfurou seu pulmão. — o elfo disse sério. Era a primeira vez que eu via genuína preocupação vinda de Hiz. E não pude evitar uma risada. Era mesmo grave. Por que eu fiz isso? Eu já estava toda retalhada, não entendia o que me moveu naquela hora.

— Hiz tem razão Shino. — Chelon se aproximou de mim e se ajoelhou ficando com os olhos à minha altura. Eu senti meu peito leve. Olhei para ele e sorri, orgulhosa de mim. Senti que pela primeira vez tinha feito minha parte, havia até recebido um elogio de Hiz. Encarei os olhos azuis do mago, os orbes cintilaram de repente e eu me perdi neles por um instante. Meu coração disparou e senti o fôlego escapar.

O que era isso?

No momento seguinte alguém segurava minha cabeça. Minha pele pegava fogo e eu não conseguia respirar.

O que era isso?

Minha mente se esvaía para algum lugar, perdida no meu subconsciente. As imagens de Chelon e Hiz me olhando preocupados rodopiavam até se tornarem um redemoinho de ilusões e frases confusas.

— Me ajude aqui!

— Deixe-me abrir a blusa!

— Tem outro ferimento. Cadê a arma?

— Pega ali, no chão!

Eu estava morrendo? Aquilo eram as últimas palavras que eu escutaria? Ahh.. por que fiz aquilo? Eu não sei. Meu corpo apenas se moveu sozinho, quando me dei conta eu já havia me jogado na frente do mago e tomava o tiro no lugar dele. Por quê...? Tudo ficou quieto de repente, não havia mais vozes ou gritos, não havia imagens.

A TerceiraWhere stories live. Discover now