Quando ele tinha seis anos, Damien correu até meu quarto e disse estar com medo dos trovões que acompanhavam a chuva e faziam a casa estremecer. Quis levá-lo de volta para o quarto dele, dizer que deveria agir feito homem, mas nenhum dos meus argumentos o impediu de se ajeitar debaixo dos cobertores e cochilar profundamente ao meu lado. Judith detestava quando eu deixava o garoto dormir conosco, mas sempre gostei de mimá-lo. Minhas oportunidades foram poucas, mas faria de tudo para abraçá-lo e aninhá-lo debaixo das cobertas de novo.
Infelizmente não o protegi dos trovões que vieram, apenas ordenei que voltasse para o quarto e aguentasse firme. Como se fosse fácil ser corajoso no mundo em que vivemos.
— Vai me dizer porque quer matar seu pai? – perguntei, depois de Yuri abrir a porta.
Ele ficou surpreso ao me ver, principalmente depois da conversa que tivemos por telefone. Nela, falei que o carro estava no mecânico e que quando o pegasse de volta conversaríamos. Claro que não esperei por tanto. Depois de desligar apenas tomei um banho, pedi um táxi e bati na porta da casa dele o mais rápido possível.— O que faz aqui?
— Vai me deixar entrar ou conversamos aqui mesmo, no corredor?
Apesar de assustado, ele me deu passagem. Tirei a jaqueta e coloquei no encosto do sofá. Olhei em volta e percebi que a casa estava bem arrumada e com cheiro de pinho. O garoto era metódico nas tarefas domésticas.
— Precisamos conversar – continuei. – Não sabe o quanto fiquei surpreso quando ouvi aquilo, então, por favor, me diga por que quer matar seu pai.
— Eu... – ele olhou em volta e coçou o braço – Acho que foi um erro.
— Não me venha com essa, parecia bastante firme ao telefonema. Vai arregar agora?
— Não é isso! Estava com raiva dele, não queria que você o matasse, apenas que ferisse.
— Pediu que eu o atropelasse. Não pensou na possibilidade dele morrer?
— Pensei – ele pareceu confuso – Olha, acho melhor você ir embora. Não estou à vontade com isso.
— Não. Agora vamos até o fim. -
Yuri evitou me olhar nos olhos, baixou a cabeça e pareceu raciocinar sobre o que devia ou não dizer.— Você é professor de educação física. Sabe sobre o corpo humanos e essas coisas. Poderia bater nele então, em algum lugar que doesse, só para assustá-lo.
— O que está acontecendo, Yuri? O que quer do seu pai?
— Nada! – Ele se apressou em responder. – É apenas uma ideia.
Aos poucos a imagem que criei daquele garoto como frágil e comportado ia por água abaixo. Não bastava ter descoberto meu segredo, agora ele se achava no direito de me ameaçar e exigir algo terrível. Não deixaria por isso mesmo.
YOU ARE READING
Lutador Verde
General Fiction[CONCLUÍDA] Após a morte do filho, Jonas decide ir até as últimas consequências para mudar a forma como a sociedade enxerga a homossexualidade - mesmo que para isso tenha que lutar contra cada homofóbico que apareça pelo caminho. 1° Lugar no concur...