Episódio 20 - Agda: Sentença

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Eu abri os olhos para enxergar um cenário completamente desfocado, o que me fez piscar algumas vezes para tentar limpar a visão. Eu não sentia meus braços e minhas pernas estavam pesadas. Minha cabeça pareceu pulsar quando algumas memórias voltaram a mim. O sexto nível. Eu estava presa? Aquilo não parecia uma cela. Eu estava... amarrada a uma árvore?

Não qualquer árvore. A minha árvore. Eu estava de volta à Floresta da Fronteira. Tudo estava ali, a brisa da estação seca, a penumbra, os cogumelos da lua. A energia dele. O lobo surgiu na minha frente da mesma forma como Calla costumava se materializar. Eu segurei a respiração.

- Vê a minha nova performance? - O tom de sadismo marcou sua fala exatamente como eu me lembrava. - Se eu soubesse que era assim tão fácil a locomoção pela desmaterialização teria ido atrás dela muito antes!

O lobo espectral abriu a mandíbula para exibir o rosto de Calla entre as presas, ela clamou por socorro antes de desaparecer na garganta da criatura. Aquela visão me perturbou profundamente.

- Eu vou te dar a chance que dei para a sua companheira. Corra!

Como eu poderia correr? Eu estava amarrada! Não mais. As correntes que me prendiam nunca existiram. Eu corri pela minha vida. A floresta mudava de forma como na tempestade, eu não consegui achar a saída dali. Eu sentia o lobo vindo à minha captura, os caminhos que tomei para me distanciar dele me deixaram ainda mais perdida na mata. O quão terrível foi pensar que aquele lugar seria enfim a minha sepultura como desejava a minha mãe.

- As árvores!

Sair da floresta parecia impossível, decidi então escalar uma das árvores e a subida pareceu mais longa do que de deveria. O lobo me alcançaria no topo? Eu nunca soube pois nunca cheguei lá. Em algum momento da escalada eu me encontrei na entrada da minha antiga casa.

- Mãe! Pai! - Eu disse alto ao entrar pela porta. Tudo estava disposto da forma como eu deixei antes de partir. Eu senti o cheiro do último assado preparado pelo meu pai. Que voz era aquela? Rori estava conversando com ele perto da fogueira lá fora.

Olhei pela janela para vê-los uma última vez. Prender o choro seria impossível. Ver o meu pai de novo me fez perder a sanidade. Eu encostei o rosto no vidro e chorei alto, a culpa e a saudade me dilaceraram a alma.

- Ele era tão forte, tão feliz, tão amado! - Me virei para me encontrar com a minha mãe.

- Eu preciso de ajuda! Mãe! O lobo está vindo! - Supliquei aos prantos.

- O teu pai te alertou sobre a chegada da entidade caçadora e você não o ouviu. Por que eu deveria te ouvir agora? - Ela virou as costas e desapareceu dentro da casa. Eu me ajoelhei para tentar manter as forças.

- Mãe! - Eu gritei! - Mãe! Não me abandona! Mãe eu preciso de ajuda! Eu preciso... me sentir segura... – O choro e a dor visceral me impediram de continuar.

Três vozes ressoaram:

- Pelas leis da Grande Nação de Acalla: por todas as evidências que indicam a autoria dos ataques contundentes contra aqueles que nos regem;

- Pelas vidas a serem preservadas: daqueles que escaparam da fúria dos Exilados, pelo favor das entidades que os pouparam de um fim violento nas mãos dos nossos inimigos;

- Pela magia concedida pela entidade da mente: ser soberano a quem apresentamos as verdades aqui expostas como justificativa para tal ato hediondo; o qual desfazemos agora para sua retomada de consciência;

Eles disseram em uníssono:

- Para a garantia de um julgamento justo à procura de culpa em teus atos, nós te libertamos do teu Inferno Astral.

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