𝟎𝟖

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Ele me impede de sair ou me movimentar para qualquer lugar com o braço, mas não me importo, e não sei o porquê. Ele me olha nos olhos, e suas íris ganham um brilho depois de pousarem na minha boca.

— Então é isso? Você não vai mais falar? — Ele pergunta. Não respondo; não consigo, ele está muito perto de mim. Apenas continuo o encarando. Até agora pouco ele tinha uma suposta namorada em seus braços. Poderia pedir conselho pra ela.

Tiro os braços dele do balcão e consigo sair, andando até meu quarto. Me jogo na cama e respiro um ar que nem eu sabia que estava prendendo ou que estava com dificuldade para isso. Um tempo depois, o silêncio paira na casa, e ouço Babi se despedindo de seus amigos.

— Eles já foram. Já vou indo Carol, boa noite. — Babi diz, bocejando e entrando em seu quarto. Tomo um banho e deixo meu cabelo solto, colocando um shortinho tão curto que minha blusa moletom o cobre.

Depois que volto para a cama e continuo lendo até altas horas, ouço um barulho na porta. Tenho um pouquinho de medo; Quem poderia ser às uma da manhã? Abro a porta lentamente, e quando subo o olhar, vejo Crusher, apoiado na parede.

Pisco uma vez. E não são alucinações, ele de fato está ali. Abro a porta por inteiro, inclinando a cabeça e estudando seu estado. Como ele entrou e o que veio fazer aqui?

— Oi... eu posso entrar? — Ele sussurra, agarrando sua blusa de nervoso. Faço que sim com a cabeça, e dou espaço. Não faço a mínima ideia do que estou fazendo, ou o que ele faz aqui. Então ele observa o quarto e se senta na beira da cama.

Não deve estar muito impressionado; o quarto não é lá aquelas coisas decoradas. Na realidade, não decorei nada. Fecho a porta e me viro, esperando ele explicar sua presença aqui; que foi do nada. Seus olhos dão uma boa passada pelo que estou vestindo antes de ele abrir a boca:

— Ele tá piorando. — Ele começa a dizer. — Posso te perguntar uma coisa? — Ele pergunta. Dou um sorrisinho e faço que sim com a cabeça. — Por quê você não fala? — Ele me pergunta, olhando pra mim.

Achei que não conseguiria dizer. Achei que minha garganta fecharia e eu nunca fosse capaz de dizer de fato o motivo pelo qual eu não falo. Mas com Crusher... as palavras estavam simplismente saindo, sem o menor esforço, sem a menor dificuldade.

— Pra não sentir a dor de novo... — Pronuncio baixinho. E uma luz se acende no meu cérebro quando caio na real. Não acredito que estou ouvindo minha própria voz novamente... E ainda sim, falar com ele sobre isso não me deixa com nenhum remorso ou coisa do gênero.

Talvez seja por que ele sabe como é. Ele é alguém que sabe como é passar por isso.

— O que aconteceu? — Ele pergunta, colocando a mão na minha bochecha, olhando nos meus olhos. Essa também seria uma das situações em que eu entraria em pânico por ter que revelar, mesmo depois de meses após o acontecimento.

Mas, olhando em seus olhos, no brilho e conforto que eles projetam, eu só quero dizer. Simplismente quero falar. Como nunca senti vontade antes. Dou uma risadinha abafada.

— Eu meio que vi minha mãe ser assassinada... pelo meu pai. — Pronuncio. Sua expressão muda, ele me olha como se eu fosse um bicho raro. De repente, vejo diversas expressões passando como lampejos em seu rosto. Decepção, raiva, angústia...

— Nossa, Carol... Eu sinto... muito. — Ele olha pra baixo, tentando processar a informação. — Isso deve... Deve ter sido...

— Foi. — Eu o interrompo, segurando a vontade de chorar. Acabo soltando uma lagrimazinha, mas antes que ela escorra, Crusher passa rapidamente o dedão por ela. Sinto cada pedacinho do meu corpo arrepiado.

— E o que você fez pra... Quer dizer, o que eu faço com... Merda, isso é tão angustiante... - Ele continua, mas coloco meu dedo entre seus lábios. Lábios que me faziam questionar de que forma agiriam quando estivessem nos meus. Evaporo o pensamento.

— Você devia conversar com ele, passar o máximo de tempo que conseguir. É o que eu faria. É o que eu teria feito. — Eu digo. — Vai doer mais do que você imagina... mas é o que você pode fazer. — Falo. Ele faz que sim com a cabeça e se levanta.

— Por que você fala comigo? — Ele pergunta.

— Você precisa.... acho que passamos pelo mesmo problema. — Eu sorrio. Ele me retribui outro, e quando ia dizer mais alguma coisa, um barulho na porta nos assusta.

— Carol? Você está bem? É que ouvi um barulho... — Tia Jane abre a porta devagar. Ia impedir, mas quando olho para trás, por sorte, Crusher se escondeu atrás da cama.

Quando ela me vê, faço que sim com a cabeça e mostro o celular, como prova do suposto barulho que ela ouviu.

— Ah, que susto, fiquei um pouco preocupada. Qualquer coisa bata na porta. — Ela sorri e sai. Crusher sai de trás da cama e depois vem na minha direção.

— Obrigada. — Ele sorri, e depois vem na minha direção, envolvendo os braços em mim. Faz muito tempo que não ganho um abraço por ajudar alguém. Isso me deixa feliz. Seus braços musculosos pareciam intimidantes, mas são apenas... quentes. Aconchegantes. Seguros.

Fico na ponta dos pés e o abraço também. Tento ignorar como sua pele é quente e como suas mãos em minhas costas podiam descer mais um pouco.

— Porque você não conta pros seus amigos? Ou sua namorada? — Eu pergunto. A pergunta é meio boba, porque eu também não contei a quase ninguém sobre o que aconteceu. Mas... acho que teria sido melhor se tivesse contado.

— Ela não é minha namorada. — Ele dá uma risada abafada. — E eu não conto, porque não acho que as pessoas precisem ficar sabendo da minha vida... acho que eles não entederiam. — Ele diz. Dou um sorriso, respeitando sua decisão. — É sério, obrigada por... me entender. — Ele diz.

— De nada... você pode contar comigo quando precisar. — Digo baixinho, e me solto do abraço dele. — Por onde você entrou? — Pergunto.

— Janela lá de baixo — Ele diz, com um sorrisinho. — Da próxima vez eu entro direto nessa. — Ele ri, me fazendo rir também. A sensação de rir dessa forma é maravilhosa, e chocante ao mesmo tempo. Sabe-se lá quando foi a última fez que eu ri de maneira tão espontânea...

Espera... da próxima vez? Ele pretende vir aqui mais vezes? Ele me dá uma última olhada e sorri, andando de costas até parar na janela. Depois se vira e pula.

Talisman | Volsher. [Concluída]Where stories live. Discover now