𝟏𝟒

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Quando a aula acaba, vou direto pra casa. Checo o celular mais de uma vez enquanto ando até lá, para ver se não perdi nenhuma chamada. Abro a porta de casa, e quando entro, minha mãe está lavando louça, fungando o nariz.

Demoro alguns minutos pra perceber que ela está chorando.

— Mãe? Tudo bem? — Eu pergunto, chegando perto dela. Ela solta a esponja e me abraça, chorando no meu ombro. — Cadê ele? Ele tá bem?

— Lá em cima... — Ela diz, chorando através dos soluços. Já me acostumei a pegar mamãe chorando. — O médico disse que ele anda... piorando. — Ela diz.

— Você acha que...?

— Sim, Arthur. Acho que seu pai está perto. — Ela diz, me provocando uma onda de preocupação e peso no peito. De angústia. Ela soa o nariz em um papel, e eu a ajudo mamãe limpar o rosto e guardar a louça depois.

Subo as escadas e deixo minha bolsa no corredor, entrando no quarto e vendo meu pai. Por incrível que pareça, ele está acordado.

— Você está acordado?

— Não ando conseguindo dormir muito... — Sua voz está mais rouca e difícil de entender. Sento na beirada da cama e demoro um pouco para puxar algum assunto. É difícil. É doloroso, mas só quero conversar com ele. O máximo possível.

— Eu vou na casa da Babi hoje. — É tudo que consigo dizer.

— Vai ver a menina de olhos cinza? — Ele dá um sorriso e tenta rir, mas acaba engasgando. Uma série de tosses vem em seguida.

— Acho que vou. — Eu digo, e depois me mantenho em silêncio, com o coração apertado. O homem ao meu lado está finalmente indo. A pessoa que ia comigo em jogos de futebol, quem me dava conselhos amorosos e me deixava assistir TV mais tarde. Solto um suspiro. — Mas vou ficar aqui essa noite, tudo bem? — Eu digo.

— O quê? — Ele tosse, pela milésima vez no dia. — Não, você pode ir.

— Preciso ficar mais do seu lado, ainda mais agora pai. — Eu digo. Me preparei para o dia em que isso iria chegar perto, cada dia desse ano. E, por uma fração de segundos, só desejo que a dor pare de atormentá-lo em sua vida. Só desejo que ele fique em paz. Que ele pare de sofrer.

— Não. Você vai ir, sua mãe está aqui...

— Eu vou ficar pai. Ela não está bem... você sabe o porquê. — Eu digo.

— Você está aqui porque acha que passar mais tempo comigo me deixaria feliz... mas eu não quero. Quero que siga sua vida, Arthur. É ver as pessoas paradas por causa de mim que me deixa triste. — Ele diz. É a frase mais longa que ele consegue falar. Ele solta um gemido de dor.

— Não fala mais nada, ok? Se não piora. — Eu digo. — Tá bem... se você fica feliz com isso, eu vou. — Digo. Ele sorri e aperta minha mão. Me levanto. — Dorme um pouco tudo bem? Descansa. — Eu digo, dando um meio sorriso.

Isso me deixa meio abalado, e preferiria que ele descansasse de todas essas dores... mas não que ele fosse embora.

Eu costumava beber e transar para esquecer esses problemas, mas agora, estou sentindo isso mais na pele. Não estou fazendo nada para amenizar a dor. Tudo por causa dela. Carol me ensinou a ver as coisas mais fáceis; me ensinou que, por mais que seja doloroso, é necessário.

Como se eu não tivesse que colocar uma barreira escondendo meus verdadeiros sentimentos. Mas aprender a lidar com eles. Aprender a saber que é preciso se despedir.

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maratona 1/5

Talisman | Volsher. [Concluída]Where stories live. Discover now