𝟐𝟒

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Carolina

Respiro fundo e entro no colégio, me arrependendo pela milésima vez de ter vindo hoje. Não devia, porque estou péssima. E aí vai a coisa mais idiota do mundo; só vim para ver Crusher, mais uma vez.

— Carol, você viu o Crusher? — Pergunta Victor, passando pelo corredor. Ele franze o cenho ao perguntar, e eu balanço a cabeça que não. Uma parte enorme de mim quer implorar para que ele diga se ele veio, vai vir, ou porque não está aparecendo.

O resto das aulas se passam lentamente, como se o tempo estivesse me torturando. A cada minuto que passa, eu olho para a porta. Nada de Arthur. Na verdade, não tirei os olhos da porta desde a primeira aula do dia.

Na hora do intervalo, vou direto para a biblioteca e fico lá pela metade dele. Uma moça jovem, vestida formalmente, para de repente na minha frente.

— Você é Carolina Voltan Marzin, certo? — Ela pergunta. Eu confirmo com a cabeça. — Me mandaram te avisar da secretaria. Ligaram do hospital... parece que você está autorizada a sair... e que George Ramos faleceu. — Ela pronuncia, colocando a mão no meu ombro.

Como? Não tenho parente nenhum com esse sobrenome. A não ser que... ah não. Eu me levanto imediatamente, correndo até a saída do colégio, onde paro e penso em alguma coisa, qualquer coisa para eu ir até o hospital.

Meu coração bate apertado contra o peito, pensando em mil coisas ao mesmo tempo.

— Carol? — Babi toca meu ombro, e eu pulo de susto. — Você recebeu a notícia do Crusher?

Faço que sim com a cabeça, desesperadamente pedindo para que ela ande logo e me leve até lá. Victor anda passos largos até o estacionamento, junto com os outros garotos. Ele abre o carro e todos entramos.

— O pai dele era doente? — Mob pergunta.

— Caramba, eu sei lá! Mas o Crusher tá precisando da gente. — Victor diz.

***

Sou a primeira a abrir a porta quando Victor estaciona o carro.

Ficamos esperando quase uma hora fora da sala. Meu peito dói toda vez que penso no quão triste Crusher deve estar agora. Eu sei como é a dor da perda, sei mesmo. A porta se abre, mas eu me mantenho sentada.

Babi e os outros amigos de Crusher se levantam para consolar sua mãe, que vem até mim um tempo depois.

— Carol, ele quer você lá. — Ela diz, com a voz um pouco rouca e o rosto avermelhado. Me levanto e dou um abraço apertado em seus braços. Aperto ternamente sua mão antes de andar em direção ao quarto.

Quando entro, meu peito começa a pesar. O pai de Arthur está deitado na maca, e Crusher está ao lado, de joelhos no chão, tentando limpar as lágrimas que caem desesperadamente em seu rosto. Nunca o vi tão... devastado, embora saiba exatamente como é me sentir assim.

Dou uma leve lacrimejada ao olhar seu pai. Ele foi um homem bom, simpático, e creio que guarda um bom lugar no céu e no coração das pessoas. Principalmente no de Arthur. Dou um sorriso, indo até onde Crusher está sentado.

Fico na frente dele, pego suas mãos trêmulas e o envolvo em meus braços. Ele parece desesperado quando me abraça, e começa a chorar ainda mais no meu ombro. Não falo nada, apenas o abraço, que é o que acho que ele precisa.

Massageio seus cabelos bagunçados e solto uma lágrima sem perceber.

Ele afunda o rosto no meu pescoço, tentando controlar o choro. Logo ouço um barulho na porta, e os amigos dele aparecem, o fazendo olhar pra mim e tentar limpar as lágrimas. Tento sair de cima dele, para deixá-lo conversando com seus amigos a vontade, mas ele aperta minha mão num pedido de me manter ali.

— Por quê você não nos contou? — Babi cruza os braços, mas não espera a resposta de Crusher, apenas o abraça.

— A gente teria te apoiado nessa, Crusher. — Diz Victor.

— Eu... achei que vocês não precisavam saber nada da minha vida... Mas me desculpem, deveria ter c-contado. — A voz de Crusher está rouca e vacilante, enquanto ele tenta controlar soluços.

— Tudo bem, essa não é a prioridade agora. — Victor dá um abraço nele.

Depois de todos os pêsames que seus amigos passam para ele, Crusher fica um pouco mais calmo, mas ainda sim derramando lágrimas.

— Eu nem sei se ele ouviu que eu amava ele... — Ele aperta a mão de seu pai, com a voz falhada.

— Ele sabia disso. — Eu digo, sorrindo. Ele tenta curvar as bochechas.

— Ele deve estar num lugar melhor agora, né? Descansando em paz... — Ele pergunta. Concordo com a cabeça.

— O enterro vai ser amanhã de manhã, Carol. — A mãe de Arthur entra no quarto e aperta a mão de seu marido.

— Certo, obrigada. — Eu balanço a cabeça afirmativamente. — Eu vou deixar vocês sozinhos.

Quando saio da sala, os amigos de Crusher já foram embora, mas eu me mantive no hospital o máximo de horas que pude. Abro os olhos e percebo que tirei um leve cochilo na poltrona do saguão.

— Porque você não foi embora? — A voz de Crusher preenche meus ouvidos. Eu olho para ele, encarando seus olhos vermelhos e pesados. Ele se mantém agachado, na altura em que estou sentada.

— Eu queria ficar aqui, pra caso você precisasse de mim. — Eu digo.

— Você podia ter ido embora, descansado. — Ele diz.

— Se você quiser, eu vou. — Digo.

— Eu posso te levar? Preciso falar com você. — Ele diz. Faço que sim com a cabeça.

Ele se despede da mãe, e então me leva até seu carro. Os minutos se passam em silêncio dentro dele, até Crusher pegar uma pista.

— Pra onde você está me levando? — Pergunto. Ele estaciona o carro no meio de um gramado.

— Pra nenhum lugar, eu só queria conversar com você. — Ele dá a volta no carro e estende a mão para mim, quando abre minha porta. Eu me levanto com a ajuda dele, e percebo o horizonte numa mistura de cores vermelhas e laranjas.

Depois de uns minutos observando a linda paisagem, observo Crusher derramar uma pequena lágrima em sua bochecha. Meu deus, como isso pode doer em mim? Ele a seca e se vira pra mim.

— O que eu sinto por você é mais forte do que eu pensava... e não é só porque você me ajudou por causa do meu pai. Você se tornou meu talismã, Carol... você nem se compara com outras, porque você é você. Me apaixonei pela pessoa que você é, não porque me ajudou com um problema. Você é tudo pra mim. — Ele diz, com paciência em explicar. — Eu me acho um babaca do seu lado, porque enquanto você é tudo, eu não sou nada, mas eu não vou passar o resto da minha vida admitindo isso, porque o que importa é que eu quero você.

As palavras me atingem como se alguém tivesse riscado um fósforo e jogado no meu corpo cheio de gasolina.

— Você pode achar todas essas coisas, que eu sou ruim, e tudo... Mas por você Carol, eu paro de fazer qualquer coisa ou me torno qualquer coisa, qualquer uma. — Ele diz. O sol fraco que se esconde cada vez mais bate uma última vez nos olhos dele.

— Crusher... — Eu mordo o lábio. — Eu não queria ser só sua amiga... mas dava pra perceber que você só me queria como isso... Então eu meio que achei que você quisesse continuar sua vida com outras pessoas, e só me precisasse para...

— Não. — Ele me interrompe. — Desculpa. Mas não, eu não quero você só pra me dar conselhos, Carol. Nem só pra ser minha amiga. Quero você com direito de te beijar todos os dias, te abraçar e te acordar com beijos e... algo mais. — Ele desvia para o horizonte de novo.

— Certo.

— Eu te amo. — Ele diz, arrastado.

— O quê?

— Eu te amo. — Ele repete, com mais convicção, os olhos exalando um brilho ao me encarar. — Amo você. — Fico paralisada. — Diz alguma coisa, qualquer coisa...

— Eu te amo Arthur, eu te amo. — Balanço a cabeça freneticamente, fazendo um sorriso perfeito brotar de seus lábios enquanto me jogo em seus braços.

Talisman | Volsher. [Concluída]Where stories live. Discover now