Quem vigia Edmundo?

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Chegou a hora do lanche. Edmundo levou Eugênio ao Rei das Iguarias, um boteco que ficava no calçadão do centro da cidade, perto da Basílica. Era um lugar apertado. Os boys comiam em pé. Tinha uma vitrine onde ficavam expostos salgadinhos, queijos e frios.

Eugênio deglutia seu sanduíche em pequenos bocados. Mastigava bem devagar. Sobrava fome, faltava dinheiro. De repente, sua fisionomia mudou: parecia ter se lembrado de alguma coisa. Virou-se para Edmundo e perguntou, de boca cheia:

- O que Maria Isabel disse de mim?

- Quem?!

- Maria Isabel. A namorado do Plínio.

- Maria Isabel? - repetiu, buscando ganhar tempo, Edmundo.- Não gostei.

- De quê?

- Este nome não combina com ela.

- O que foi que ela disse?

- Nada - respondeu Edmundo, depois de pensar um pouco.

- Não falou com ela?

- Falei.
- Então?

- Não deu pra conversar muito.

- Mas sobre o que vocês conversaram, afinal?!

- Remédios caseiros...

- Que ideia!

O carilhão da Basílica soou. Já eram quatro da tarde.

- Engole de uma vez esse sanduíche - disse Edmundo, querendo mudar de assunto.- O serviço está atrasado.
Nem bem Eugênio engoliu o último pedaço, Edmundo o puxou pelo braço. Partiram pelo calçadão cheio de transeuntes.

- Pra que a pressa? - perguntou Eugênio, ofegante.

- Viu que horas são?

- Preciso fazer a digestão!

- Eu não vou esperar ninguém - disse Edmundo, deixando o aprendiz para trás.
Quando começou a subir a ladeira da Bolsa de Valores, Edmundo sentiu que alguém o seguia. Talvez fosse Eugênio, pensou. Mas logo verificou que o aprendiz vinha ao seu lado. Quem seria então?

Edmundo se virou bruscamente. Ainda pôde ver uma mulher entrando apressada numa loja. Como quem quisesse se esconder. Por um momento pensou ter reconhecido Glória.

- O que foi? - perguntou Eugênio.

- Fique de olho. Acho que tem alguém atrás da gente.

- Assalto?!

- Pode ser. Vamos indo.

Os boys seguiram a caminhada. Edmundo sabia que não era assalto. Tinha sido roubado tantas vezes que conhecia bem o assunto. Mas não desistiu à tentação de assustar Eugênio.

- Quando eu disser "já", você vira - sussurou Edmundo, para criar clima.

- Eu?!

- Já.

- Por que eu?

- Já! Não ouviu?

Eugênio deu meia-volta e estancou.
çUm homem enorme vinha no sentido oposto, carregando uma caixa. Deu um encontrão no garoto. A caixa foi no chão, espalhando pela calçada uma porção de canetas esferográficas.

- O que é que você fez, moleque?

- D-desculpe...

- Isso é lugar de parar?

A vontade daquele homem era dar um sopapo nos garotos. Mas teve de sair correndo para recuperar sua mercadoria. As canetas rolavam rua abaixo. Edmundo riu. No entando, uma certeza o imcomodava: não era aquele homem quem o perseguia.

Já havia algum tempo, o boy nutria a sensação de que alguém o vigiava. Uma vontade difusa tomou o garoto. Como explicar esse sentimento? Não queria mais saber de sua mãe. E no fundo torcia para que fosse ela quem o seguia pelas ruas.

Office-boy em ApurosWhere stories live. Discover now