A última aventura de Eugène Flammarion

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Tudo estava sendo resolvido. A polícia tinha chegado. Cercaram o local do acidente e chamaram o verdadeiro proprietário do veículo.

Muitos curiosos se reuniram ao longo do cordão de isolamento. Os policiais conversaram com doutor Ignácio e dona Clara. Eugênio e Edmundo ajudavam na elucidação dos acontecimentos. O oficial ria muito.

Sentado na mesma posição desde a batida, Plínio olhava para o chão. A imagem cortava o coração de Maria Isabel. Olhou para sua irmã e perguntou:
- O que você acha?

- Plínio?

- Vou?

- Se ainda tem o que falar!

Maria Isabel aproximou-se do rapaz, sem dizer nada. Ficou parada na sua frente.

- Consegui - disse Plínio, sem levantar os olhos.

- O quê?

- Olha o tamanho da besteira que eu fiz.

- Acontece.

- É. Mas eu fiz força.

- Um pouquinho...

- Ainda estamos namorando?

Maria Isabel tomou um fôlego antes de responder:
- Não, Plínio.

- Amigos?

- Melhor a genre não se ver por um tempo.

- Por causa do Eugênio?

- Não.

- Por causa do que eu fiz hoje?

- Ajudou.

- O quê, então?

- Pra mim, namorar um rapaz mais velho, que tinha carro... Eu achava que estava crescendo. Mas enganei. Acho que você não leva muita culpa.
Os dois ficaram em silêncio. Plínio tirou uma fotografia do bolso e estendeu para Maria Isabel, dizendo:

- Dá uma olhada.

Era a foto de um homem de uniforme branco, na proa de um veleiro.

- Quem é?

- Meu pai.

- Califórnia?

- San Diego.

- Ele mora neste veleiro?

- Trabalha nele. Aquela história de fazenda... Meu pai cuida de veleiros num porto de veraneio.

Maria Isabel devolveu a foto, sem dizer nada.

- Ele disse que ia me chamar pra morar com ele - continuou Plínio. - Isso faz mais de um ano.

O rapaz ficou pensando. Depois levantou a cabeça e disse:

- As estradas têm oito pistas na Califórnia.

E sorriu com um dente a menos na boca,

O policial acabou de fazer a ocorrência e foi até a viatura chamar o guincho.

Doutor Ignácio e dona Clara conversavam com o filho na rua. Eugênio contava toda a história em detalhes. O pai tentava manter um ar de severidade.

- Acho que você agiu certo - disse finalmente o pai ao filho.

Eugênio abriu um sorriso. Doutor Ignácio se esforçou por permanecer sisudo. E determinou:

- Vamos pra casa.

- É muito cedo, pai!

- Cedo?!

- Quero aproveitar a sexta-feira - olhando para Maria Isabel, que passava por perto. - Trabalhei a semana inteira.

Doutor Ignácio pensou um pouco, antes de responder:

- Está bem. Mas telefone se for chegar mais tarde.

- Pode deixar. É melhor dar um jeito no Plínio.

Eugênio foi saindo na direção da garota. Dona Clara ia estender o braço para detê-lo, mas conteve o gesto. Sua intenção era fazer um carinho no filho. Mas não ficava bem na frente de uma garota.

Apenas murmurou, baixinho:

- Deus te abençoe, meu filho.

Doutor Ignácio e dona Clara ficaram olhando Eugênio conversado com Maria Isabel. Em silêncio. De repente, dona Clara deixou escapar:

- Será que aquela garota não é mais velha que ele?

- O quê?!

- Bobagem minha.

Doutor Ignácio fez força para não rir. Algum tempo depois, ao perceber que a mãe não tirava os olhos do filho, perguntou:

- Você sabe por que Eugène Flammarion manca de perna esquerda?

- Quem?

- Eugène Flammarion! Eu vou contar para você: logo depois de terminada a Grande Guerra, ele...

E doutor Ignácio contou a mais romântica aventura de Eugène Flammarion. À luz das lâmpadas de gás sódio.

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⏰ Last updated: Jan 17, 2016 ⏰

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Office-boy em ApurosWhere stories live. Discover now