Dois

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Os dias seguiram comigo brincando sozinho, como de costume, e esperando que Daniel se juntasse a mim. Um questionamento constante era: por que razão eu nunca recebi sequer um "oi" dele? Eu fazia de tudo para passar pelo portão e, consecutivamente, conseguir espiar a casa e quem sabe finalmente começar a amizade. Mas ele nunca estava brincando no quintal ou então na sala, onde nossos olhares se cruzariam. Às vezes até parecia que não tinha criança naquela família e tudo tinha sido uma ilusão minha.

Até a minha conturbada mudança daquela casa, Daniel e eu nunca conversamos cara-a-cara. Mas, a verdade é que é difícil impedir duas crianças que dividem o mesmo muro de brincarem juntas. Demorou, mas um dia ouvi sua voz pela primeira vez.

- Ei, você está ai?

- Sim.

- Qual é o seu nome?

- Pedro, e o seu?

Nossa amizade começou com uma mentira. Tive medo de falar meu nome verdadeiro e o pai dele vir brigar comigo. De algum modo eu tinha a sensação que ele não queria nossa amizade e achei melhor não arriscar. Daquele momento em diante, meu nome passou a ser Pedro nos momentos mais divertidos do meu dia.

Éramos iguais: duas crianças apaixonadas por desenho, sozinhas e em busca de diversão. Entre nós estava o muro. Mas, isso não impediu que déssemos boas risadas ao longo de meses.

Em alguns dias nós brincávamos de batalha naval, em outros o jogo da vez era cara-a-cara e até uma adaptação de quem sou eu nós inventamos. De todas as brincadeiras, a última certamente não era uma das mais bem sucedidas. Na teoria funcionava normalmente, tínhamos que fazer perguntas para adivinhar quem éramos. Mas um muro estava bem no meio. Daniel encontrou uma solução: cada um imaginava o que o outro era e começávamos o jogo normalmente. Pareceu bom. Mas era impossível adivinhar, pois sempre mudávamos o personagem quando o outro estava próximo de acertar. Ambos sabíamos o que o outro estava fazendo e isso deixava o jogo ainda mais engraçado.

A brincadeira acabava sempre que ouvíamos o barulho do carro e a rua era iluminada pelo veículo dirigido pelo pai de Daniel. Não falamos sobre a motivação de parar a brincadeira, mas parávamos mesmo que estivéssemos prestes a acabar aquela rodada.

***

Recadinho rápido: obrigada por lido mais um capítulo da história. Nos vemos novamente na quinta-feira, às 17 horas. Antes disso, não esquece de me contar nos comentários o que você está achando do livro e de deixar o seu voto (é só clicar na estrelinha). 

Caso queira conversar diretamente comigo, sou @VicctoriaSilva em todas as redes sociais :)

O Azul do Meu PassadoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora