Cinco

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Mandei a capa do livro para aprovação e fui tomar um café. Aproveitei esse intervalo para olhar meu celular e vi que era dia 16 de agosto. Nosso aniversário de namoro. Claro que tinha esquecido, mas Daniel não poderia saber disso. Já tenho muitas explicações para dar nos próximos dias... por isso comprei flores e chocolates em um site e pedi que entregassem em casa. Escrevi uma carta e mandei imprimir algumas fotos nossas e, para completar, encomendei o jantar no restaurante preferido dele.

Com o "problema resolvido", voltei ao trabalho e, por alguma razão lembrei da minha vó.

Como eu sinto falta da dona Beth. Ela era uma típica vó de desenhos animados: cabelos presos em um coque, sempre com um avental e preparando comidas e doces incríveis. Foi ela quem me ensinou o que é o amor. Também foi ela quem me ensinou que não se deve ter medo de ser quem eu sou e viver para ser feliz. Aliás, minha vó me ensinou tudo o que eu sei. Ela cuidou de mim desde que eu nasci. O homem que engravidou minha mãe não assumiu o filho e ela, ainda jovem e cheia de sonhos (que não incluíam fraldas sujas), ia me colocar para adoção. Vovó disse que se apaixonou por mim assim que me ouviu chorar. Ela saiu da sala do parto e foi até a assistente social do hospital perguntar se poderia me adotar. Minha mãe aceitou que a adoção acontecesse, desde que dona Beth prometesse não forçar uma aproximação. Ela aceitou. Minha mãe se mudou logo após o parto e eu nunca a conheci. Eu sempre soube que fui adotado. Mas não sei ao certo o que aconteceu com a minha mãe, minha vó dizia não saber para onde ela foi, mas acreditava que tenha ido tentar o "Sonho Americano".

*

Não contei para a minha vó sobre o medo que tinha do nosso vizinho. Mas, de certo modo, ela sabia que eu não estava bem. Primeiro imaginou que fosse algo relacionado a minha idade, depois decifrou que poderia ser algo mais sério e até cogitou me levar ao médico.

Naquela época eu estava desesperado. Não sabia exatamente do que tinha medo, mas o pai de Daniel me apavorava e até tinha pesadelos com ele. Quando vovó sugeriu me levar ao médico, lembrei que meu amigo tinha me questionado sobre uma doença e também do fato de seus pais não deixarem nós brincarmos juntos. Achei que realmente estava doente. Imaginei que minha doença fosse muito séria e, mais do que isso, fosse envergonhar a única pessoa que me amava.

E se vó Beth parasse de me amar?

Eu não poderia ir ao médico e correr o risco de perde-la. Eu não tinha mais ninguém no mundo. Foi por isso que comecei a disfarçar o medo. Na minha cabeça precisava fazer minha vó acreditar que estava tudo bem. Foi o medo de ser doente que me levou ao meu maior pesadelo: tentar encarar o meu vizinho.

***

Obrigada por ler até aqui. Terça-feira tem capítulo novo, mesmo sendo carnaval! Então nos vemos por aqui às 17 horas :)

Não esquece da estrelinha e do comentário. E caso queira me seguir por ai, sou @VicctoriaSilva em todas as redes!

O Azul do Meu PassadoWhere stories live. Discover now