18- SOHAN

26 2 0
                                    

  




"Esse texto é para as pessoas que tentam te segurar, pessoas que tentam te dizer como se deve viver, pessoas que te dizem como você deve se vestir, como você deve falar. Pessoas que te dizem o que você deve ou não falar. Eu, pessoalmente não preciso disso, eu não preciso dessa merda em minha vida. Esses são os tipos de pessoas que te tentam me manter para baixo, eles me fazem sentir como se alguém lá fora estivesse esperando para me pegar."


            Lentamente meus olhos se abrem. Meu corpo ainda dói, sinto como se tivesse sido massacrado. Os machucados do combate possuíam uma aparência melhor e já cicatrizavam. Giulia estava ao meu lado, sua cabeça repousava em meu ombro. Ao tentar me levantar, seus olhos se abrem.

- Você acordou. – diz ela, com a voz meio sonolenta – Fique quietinho aí, tem que descansar.

- Eu estou bem. – digo – Onde está Sadie?

- Ela se ofereceu para montar guarda. – responde Giulia. Assim que ela termina, o hino ressoa na arena e o símbolo da Capital surge no céu, seguido das fotos dos tributos mortos. Ela aperta minha mão e vejo a apreensão em seu rosto. O medo que ela sente de perder seu irmão, estava evidente em seu semblante.

- Não se preocupe. – digo a ela – Léo é forte e com certeza vai sobreviver. – Ela balança a cabeça em concordância e me beija. As fotos dos tributos aparecem ao céu, torço para que a foto de Leo não apareça. Ele se tornou alguém especial para mim, um verdadeiro amigo, não suportaria a notícia de sua morte, Giulia principalmente. Não podia fazer nada a esta altura, abraço-a mais firmemente e só nos resta acreditar que ele esteja vivo.

Longos e angustiantes minutos se passam. O hino chega ao fim e o silêncio na escura e fria arena retorna. Giulia e eu suspiramos aliviados ao saber que Léo ainda estava vivo.

- Eu disse. – digo – Sabia que ele iria conseguir se livrar dessa. – Ela apena sorri e voltar a encarar o escuro e sombrio céu da arena. A lua permanecia escondida em meio às nuvens e seu brilho era fraco.

- Por que você não dorme mais um pouco? – pergunta ela – Precisa descansar.

- Está bem. – respondo puxando-a – Mas quero que você também descanse.

- Ta bom – diz ela com um pequeno sorriso. Nos aninhamos perto de algumas árvores e dormimos.

O frio que fazia na arena não me deixou dormir por muito tempo. Giulia se encontrava encolhida ao meu lado, seu corpo tremia. Tiro meu casaco e cubro-a, na tentativa de mantê-la aquecida. Por mais que eu queira, não conseguia dormir. Me levanto vagarosamente para não acordar Giulia e caminho um pouco. Logo avisto Sadie sentada a alguns metros de nós.

- Oi. – digo me aproximando – Tudo bem?

- Ah... Olá Sohan. – responde ela - Estou bem e você? Já se sente melhor?

- Sim. – respondo – Os machucados ainda doem um pouco, mas estou bem.

- Que bom. – Sadie volta a olhar ao redor de onde estávamos, como se procura-se algo.

- Sadie. – digo

- Sim?

-Quero que me prometa uma coisa.

- O que? – pergunta ela. Desvio meu olhar e olho para Giulia deitada e encolhida devido ao frio. Ela era mais bonita enquanto dormia. 

- Prometa que vai cuidar de Giulia, caso acontece algo comigo? – digo olhando no fundo de seus olhos – Promete?

- Prometo. – elar responde.

- Obrigado. – Antes que eu possa retornar para perto de Giulia, Sadie me chama.

- Sohan, espere. Preciso te contar algo.

- Pois então conte.

- Por favor, mantenha segredo. Eu não tenho coragem de dizer isso a ninguém, mas sei que posso confiar em você. – rosto de Sadie se torna vermelho e seus olhos se fixaram ao chão. – Eu...eu estou apaixonada por Léo, mas não tenho coragem de dizer isso a ele.

- Sadie, eu não sou um bom conselheiro, mas deve contar á ele. –digo – Senão você irá se lamentar pelo resto de sua vida. Não deixe a covardia te impedir de ser feliz. – Sadie sorri, sinto que ela estava mais relaxada. Sadie foi a primeira pessoa que conheci, seu jeito dócil e calmo de falar e seus gestos carinhosos lembravam minha irmã Kira. Sentia-me no dever de protegê-la dos perigos da arena.

- Obrigado. – diz ela. Abraço-a e retorno para Giulia. Com muito custo, finalmente consigo dormir, mas um tremor acaba me acordando.

- O que está acontecendo? – pergunta Giulia assusta.

- Eu não sei. – respondo. Uma certeza surge em minha mente. A minhoca mutante retornara. – Mas temos que sair daqui. – Giulia e eu nos levantamos, apanhamos nossos pertences e corremos em direção à Sadie – Sadie, nós temos que... – minha voz desaparece, meu corpo se paralisa e meus olhos observam o imenso labirinto que se formava a nossa frente.

Um labirinto havia surgido em meio ao pátio. Todo o espaço havia sido engolido pela imensa construção, a única saída seria atravessá-lo.

- Parece que não há outra escolha. Teremos que atravessá-lo. – diz Sadie, como se lesse meu pensamento.

- Sim, acho melhor nos apressarmos. – digo.

Já estávamos preparados para entrar no labirinto quando ouço algum som. Olho para cima e vejo um pequeno pára-quedas se aproximar. Agarro o pequeno recipiente metálico pouco antes de atingir o solo e o abro. Em seu interior havia um pequeno aparelho, ao pega-lo ele rapidamente se aciona. Uma espécie de mapa do pátio surge na tela e um pequeno ponto verde indicava minha localização.

- Parece uma espécie de GPS ou algo do tipo. – diz Sadie.

- Sim, minha mentora deve ter me enviado. – digo – Só não entendo porque ela me enviou.

- Para te ajudar. – grita Giulia – Esse é seu dever, te ajudar e te manter vivo.

- Sim, mas ela nunca foi com minha cara.

- Provavelmente ele deve indicar o caminho até a saída. – interfere Sadie. Nós três nos entreolhamos e chegamos a uma conclusão. Caminhos lenta e silenciosamente até a porta de entrada do labirinto e entramos na grande armadilha mortal.

       Com aparelho em minha mão seguimos por entre os corredores do labirinto. A construção era imensa, as paredes eram altas que se perdiam no céu, as paredes eram cheias de plantas e em certos pontos rachadas e quebradas. Seguimos o caminho que o aparelho indicava, caminhamos por alguns minutos até chegar a uma grande porta metálica, com um pequeno painel embutido na parede. "Setor um". Dizia o painel. "Por favor, insira a senha." A porta só seria aberta quando a senha fosse inserida, mas qual seria essa senha?

       Imagens de alguns artefatos surgiram na tela e logo em seguida uma frase: "Qual a sua especialidade?" Levo um tempo para associar os objetos e a frase, mas quando consigo encontrar a resposta, Giulia já estava digitando a palavra "Luxo" no painel. Assim que termina, a porta se abre lentamente, liberando a passagem.

- O que? Como você conseguiu? – pergunta Sadie espantada.

- Muito simples. – diz Giulia – As imagens mostravam a qual distrito eles pertenciam.

- E no caso, esses objetos pertenciam ao distrito um, cuja sua especialidade é o Luxo. – digo – Entendeu?

- Sim. – responde Sadie. Caminhamos longos minutos, talvez até horas. Durante todo o percurso, encontramos portas e todas elas pediam uma palavra-chave. Graças ao raciocino rápido e aguçado de Giulia, encontramos as respostas facilmente. Em cada setor ela associava as imagens e a frase e chegava até a resposta. Setor dois: Alvenaria. Setor três: Tecnologia. Setor quatro: Pesca, e assim sucessivamente.

Por fim chegamos ao último setor, Giulia digita a palavra-chave: Energia nuclear, e a porta se abre revelando um longo corredor que levava até a saída.

- Conseguimos. – diz Sadie pulando de alegria.

- Sim conseguimos. – diz Giulia. Ela me abraça e me beija, mas logo nota a expressão de preocupação em meu rosto. – O que foi?

- Você não achou isso fácil demais? – pergunto – Tenho um mau pressentimento de que alguma... – Sou interrompido por um intenso tremor. A parede, alguns metros à frente, é destruída, cobrindo o corredor de poeira e escombros. Abraço Giulia fortemente e uso meu corpo para protegê-la. Por sorte nada me atingiu, mas ao olhar em meio à nuvem de poeira, vejo uma sombra gigantesca surgir. Espero a nuvem abaixar e me espanto com que eu vejo. Uma imensa cobra, com presas longas e afiadas, escorrendo alguma espécie de líquido meio esverdeado. Seu corpo era liso e de cor clara, com coleiras e correntes penduradas. Seus olhos vermelhos, mostravam sua sede por sangue. Solto Giulia e rapidamente empunho minha espada.


- Volte para o setor treze, eu vou ajudar Sadie. - digo. - Vá. - Giulia corre em direção ao setor, enquanto corro no sentindo oposto, indo até Sadie. Ela estava mais próxima da parede quando ocorreu o ataque. Em seu rosto havia um corte próximo à sobrancelha. Ela segurava uma lança e tentava esquivar dos ataques, ela era ágil, mas acaba caindo e virando uma presa fácil para a cobra. Corro o mais rápido que posso e consigo chegar a tempo de fazer um corte no nariz da criatura, que desaba no chão, mas logo começa a se recuperar.

- Obrigada. - diz ela ofegante.

- Temos que correr. - digo enquanto ajudo a se levantar. Sadie e eu corremos o mais rápido possível, enquanto a cobra segue em nosso encalce. A poucos metros da porta, Sadie acaba caindo, quando me dou conta do acidente, já era tarde demais. Ouço o grito de Sadie ecoar pelo labirinto, quando olho para trás, vejo ela sendo dilacerada pela criatura. Meus olhos se enchem de lágrimas, mas não há mais nada fazer, entro no setor e encontro Giulia escondida perto da porta.

- O que aconteceu? - pergunta ela - Onde está Sadie?

- Ela se foi. - digo. Giulia entra em desespero, ela não consegue segurar o choro. - Giulia, eu também estou sentindo a dor que a perda causa, mas temos que ser fortes e procurar um meio de matar aquele monstro. - ela olha para mim e balança a cabeça em concordância.

- Tem razão. - diz ela enquanto enxugava as lágrimas.

- Ótimo. - digo - Irei distrair a cobra. Quero que corra para o corredor, assim que eu obter a atenção dela.

- Certo.

- Tome, pegue isto.- entrego-lhe o meu kit de facas - Assim que eu der o sinal, lance-as. - Lhe dou um longo beijo em seus lábios carnudos, pego apenas uma faca do kit que havia lhe dado e corro em direção ao animal.

   Assim que retorno ao corredor, encontro-a devorando corpo de Sadie. Uso o arco para chamar a atenção da cobra, que logo vem até mim. Corro na direção oposta e quando pela porta do setor, faço um sinal para Giulia, para que ela corra, pois a cobra também atravessara a porta, mas não havia notado a presença de Giulia.

    Paro repentinamente e grito para Giulia começar a atacar. Ela lança suas facas e chama a atenção do bicho. "É agora." penso. Corro até a corrente que estava pendurada em seu corpo e cravo minha espada no chão, usando toda a minha força, fazendo a corrente se prender ao chão. Sei que a espada não aguentará muito tempo, mas resiste o suficiente para que eu suba em seu dorso. Sua pele lisa e escorregadia não me deixam escalar até a sua cabeça, então uso duas flechas para chegar até lá.

    A cobra se debate, faz de tudo para que eu possa cair, mas me mantenho firme e continuo a escalada até chegar a sua cabeça. Ao chegar, enterro uma flecha em cada olho seu. Uso a coleira coleira que ela usava para chegar até seu peito. Pego a faca que havia pegado e enterro em seu peito, o grito de dor da criatura ressoa pela a arena, mas sei que isso não era o suficiente para matá-la, então agarro o cabo da faca, e lanço meu corpo para baixo, abrindo seu corpo. A cobra solta mais um grito aterrorizante e logo em seguida, seu corpo inerte se choca contra o chão.


      Suspiro aliviado, pois havia derrotado mais um obstáculo, imposto pelos idealizadores. Caminho até Giulia, que está com os olhos vermelhos de tanto chorar, abraço-a e começo a chorar logo em seguida, com a imagem do rosto de Sadie, ainda em minha mente.  


Distrito 9. O recomeço do inevitável.Where stories live. Discover now