Capítulo XVI

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Dois meses passam voando quando você se ocupa com um monte de coisas pra fazer, e eu tinha feito questão de ocupar cada segundo do meu dia. As tardes e começos da noite eu ficava no hospital, tendo sessões com a Dra. Tessa ou ajudando Rose com a nova estagiária; as manhãs eu passava procurando emprego e distribuindo currículos pelas as empresas que eu conseguia, meu pai se ofereceu para ajudar, mas eu recusei. Eu tinha que aprender a me virar sozinha, não podia continuar confiando que alguém iria me salvar, eu tinha que aprender a me salvar. Não estou dizendo que está sendo fácil, mas eu estava aprendendo a lidar com os meus problemas em vez de fazer o mais fácil.
Bem, quase todos os problemas.
Eu não o vi nenhuma vez pelo prédio, cheguei até a pensar que tinha se mudado, porém eu sabia que ele estava me evitando o tanto quanto eu o estava evitando. Não era que eu não queria vê-lo, na verdade, eu queria muito, mas algo dentro de mim dizia que eu ainda não estava preparada pra ter uma conversa. Pelo menos não uma na qual não sairíamos pior do que começamos.
Pra falar a verdade, eu sentia falta dele. Ocupar meu dia também era uma forma de não pensar sobre ele, mas uma vez ou outra, como agora, eu deixava meus pensamentos se perderem no que nós vivemos e no que poderíamos viver.
- Alana?
- Sim? – me levantei, pegando minha bolsa.
- JJ quer te ver agora.
- Claro.
Essa deveria ser a minha décima entrevista só essa semana, eu tinha criado coragem pra deixar o meu currículo na antiga empresa que eu trabalhava. Eu sabia que não ia me levar a nada, JJ sempre tinha os melhores publicitários na sua empresa, mas eu tinha que tentar. Tina, a garota do Recursos Humanos, me ligou essa manhã dizendo que JJ queria me entrevistar, eu me assustei porém aceitei o convite.
A nova secretária – que eu não decorei o nome – bateu na porta do meu ex-chefe antes de abri-la e fazer menção pra eu entrar. Agradeci, entrando na sala, encontrando JJ em pé ao lado da sua mesa.
- Alana, como é bom te ver. – JJ poderia ser o chefe mais exigente do mundo, porém ele também era um dos caras mais alto astral que eu já conheci. Ele era extremamente simpático e quase nunca se estressava com alguém. – Você continua linda, se duvidar, até mais.
- Pensei que isso fosse uma entrevista de emprego.
- E é, mas uma beleza como a sua não pode passar despercebida.
- Sempre tão charmoso.
- Estou treinando pra quando eu ver meu marido essa noite, eu estou prestes a conhecer os filhos dele.
- Aposto que você vai conquistá-los apenas com um oi.
- Então, onde você estava trabalhando antes daqui?
- Nenhuma empresa oficialmente. Meu pai estava precisando de ajuda, então eu o ajudava em algumas campanhas.
- Então você continua trabalhando como voluntária?
- Você lembra? – ele assentiu – Depois que eu saí daqui, comecei a trabalhar em tempo integral como voluntária.
- Oh, isso é incrível. E como foi essa experiência pra você?
- Gratificante. – ele sorriu pra mim e se apoiou na mesa.
- Bom, você pode começar na segunda então?
- O quê? Mas eu pensei...
- Você sempre foi uma das melhores publicitárias que eu já tive, Alana, te perder do jeito que eu te perdi foi erro de principiante, eu não vou deixar isso acontecer outra vez. Eu só não insisti pra que você ficasse porque você tinha aquele negócio no olhar.
- Negócio no olhar?
- Acho que você não percebe, mas seus olhos te entregam toda vez. Você tinha os olhos de quem estava travando uma batalha interna todos os dias, você não estava feliz. Então eu te deixei ir esperando que um dia você voltasse.
- Mas seu time não está completo?
- Pra falar a verdade, a nossa empresa cresceu tanto que qualquer ajuda é bem vinda. Normalmente ninguém aguenta a nossa carga horária, então pedem demissão nos primeiros meses, eu estou com dois publicitários a menos desde o mês passado. Quando eu vi seu currículo, eu tive que separá-lo.
- Então eu não tenho mais aquele negócio no olhar?
- Claro que tem, mas dessa vez você está ganhando. – ele sorriu.
- Muito obrigada, JJ.
- Que isso, querida, eu que agradeço a Deus por ele ter me mandado você.
- Também não é pra tanto.
- Claro que é. – ele cruzou os braços – Então, vai poder começar segunda ou não?
- Sim.
- Você vai começar em campanhas pequenas primeiramente, junto com você vai entrar mais outra pessoa então vocês vão trabalhar juntas a maior parte do tempo. Creio que sua antiga mesa já está ocupada.
- Sem problemas.
- Novos começos então?
- Novos começos.
Depois de deixar toda a documentação necessário no RH, eu saí do meu novo emprego com um sorriso no rosto e um alívio no peito. Era a primeira vez em muito tempo que eu sentia que eu estava seguindo em frente, sentia que eu estava fazendo progresso sobre tudo que aconteceu comigo todos esses anos. Doutora Tessa era uma das principais razões pra isso, às vezes eu chegava a me perguntar por que eu tinha parado de ir a suas sessões. A cada sessão ela me ajuda a ver o mundo por outra perspectiva, a procurar respostas pras minhas perguntas e também me lembrar que eu também sou humana. Chegava a ser engraçado, o ser humano ser lembrado que é humano e não um Deus absoluto de que tudo sabe, que tudo já viveu, que tudo já sentiu e que tem um poder do controle absoluto. Na verdade, uma das coisas que eu descobri nesses dois meses de tratamento é que eu não posso controlar tudo, a única coisa que eu tinha controle era o jeito que eu reagiria a certas situações, e pra falar a verdade, nem isso. Uma vez ou outra você deixa o sentimento falar mais alto. Então o segredo era deixar as coisas fluírem que um dia elas se ajeitam, ou pelo menos eu esperava que sim.
Saí do elevador, e por não estar prestando atenção, acabei esbarrando em alguém.
- Oh, me desculpe. – falei, me virando para a pessoa.
- Alana?
- Lily?
- Ai meu Deus! É você mesmo. – Lily me puxou para um abraço. Lily e eu costumávamos ser amigas quando eu trabalhava na empresa de JJ, quando eu saí, nós acabamos perdendo contato. Algo que eu estava começando a perceber que eu fazia com muita frequência – Olha pra você, mudou tanto desde a última vez que eu te vi. – ela se separou de mim.
- Você também! Não acredito que você trocou aquele cabelão por um Chanel.
- Chega um momento da sua vida em que você tem que arrumar outras prioridades quando se trabalha 12 horas por dia. – ela sorriu olhando para minha roupa e depois pra mim – E você, o que você veio fazer aqui?
- Acredite ou não, mas eu vim ver se eu conseguia um emprego.
- Não me diga que JJ deixou você escapar outra vez.
- Não, ele acabou de me contratar.
- Então nós vamos trabalhar juntas outra vez?
- Creio que sim.
- Graças a Deus! Odeio trabalhar com novatos que só me dão ideias clichês já usadas. Às vezes eu me pergunto se vai matá-los pensar um pouquinho. – ela rolou os olhos – Fico feliz que você voltou e pra comemorar isso que tal ir para o bar depois do expediente?!
- No Myrin?
- Esse mesmo.
- Te vejo lá então.

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