Capítulo Dezesseis

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Alguém já percebeu que os grandes momentos de tristeza só surgem depois de grandes momentos de felicidade?

Nuvens negras cobriam o céu até onde se podia enxergar, despejando sua chuva nos transeuntes desavisados. Através da minha janela, pude enxergar as pessoas com as suas roupas de trabalho, correndo de um lado para o outro, apenas para fugir da água caindo do céu com peso de chumbo. Um homem de terno passou com sua pasta sobre a cabeça, como se resolvesse algo.

Onde Samaris dormiu, amanheceu uma carta repleta de borrões de lágrimas. Corri para a rua o mais rápido que pude, ainda com a roupa que usava quando acordei, na vã esperança de encontrá-la.

Eu não queria gritar, apenas escapou. Eu não queria parecer patético ao chamar o nome dela na rua e não queria que as pessoas olhassem para mim com certo receio. Eu nem ao menos queria chorar.

 Eu não queria voltar para aquele quarto, impregnado de lembranças, com a carta da Samaris me esperando ameaçadoramente, pronta para ser lida quantas vezes fossem necessárias. Por isso, fiquei embaixo da chuva, sem fazer nada, por uma hora inteira.

Quando subi novamente, passei a recolher rapidamente os meus pertences jogados pelo quarto. Meu tênis, minha carteira, meu celular, meu anel...

O anel com as inscrições "isso também passará" se encontrava no criado mudo, inocente e inanimado. O segurei na altura dos meus olhos por um minuto e o joguei janela afora com a maior força que pude juntar.

No ônibus, voltando para casa, reli a carta inúmeras vezes. No texto, Samaris basicamente diz que me ama de verdade, mas vai partir. Isso não faz o menor sentido para mim.

Olhei pela janela, tudo aparentava continuar igual. As casas pareciam iguais, as pessoas pareciam iguais. Mesmo assim, eu sabia que nada mais era como antes. Tudo mudou e o mundo insistia em seguir em frente como se nada tivesse acontecido. 

A VIDA DESENCAIXADA DE ICK FERNANDES (história completa)Where stories live. Discover now