CAPÍTULO FINAL

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É surreal.

            O medo, o susto, a agitação. É tudo muito rápido. Já estávamos dentro de uma ambulância correndo em direção ao hospital. Eu segurava a sua mão e dizia que aquilo provavelmente não era nada de grave e que tudo ficaria bem, quando na verdade, não sabia se tudo ficaria bem. Quando na verdade estava tão assustado quanto ela, que agora estava deitada numa maca sentindo dores, suando e apertando a minha mão. Eu precisava acalmá-la, acabei passando a maior sensação de segurança possível. Eu não estava nada seguro, mas precisava parecer.

É surreal.

            No hospital, guiaram Jéssica para uma sala onde não podemos entrar. Por quê? Isso me deixou ainda mais angustiado. Não era hora do seu filho nascer ainda, não havia completado os nove meses ainda.

            Tudo o que queria era que um médico saísse daquela sala e me explicasse o que estava acontecendo. Mas a porta insistia em permanecer fechada. Por que não me deixam entrar? Eu me importava mais com a Jéssica do que qualquer pessoa lá dentro.

É surreal.

            Não faço a mínima ideia de quanto tempo esperei. Minutos, horas, dias, anos, talvez uma vida inteira. A unidade de tempo é uma piada sem graça.

Nem mesmo entre os funcionários do hospital o clima parecia certo. Eles cochichavam entre si e passavam papeis uns para os outros de maneira afobada. O que está acontecendo?

A porta se abriu e eles começaram a entrar e sair, entrar e sair, entrar e sair. Um deles finalmente parou e não consegui entender uma única palavra do que ele disse. Por que simplesmente não me diz se a Jéssica ficará bem ou não? Apenas três palavras passaram pela peneira da minha mente e foram processadas:


"Cirurgia de emergência"


            — Cirurgia do quê? Vão tirar o bebê? Ele vai morrer? A vida dele está em risco? E a da Jéssica?

            — Calma, senhor. — Seu tom de voz tranquilo só me irritava. — O risco é iminente, mas vamos rezar para tudo dar certo.

            — Rezar! — Explodi e chutei a mesa de centro que estava na minha frente, sua perna quebrou e todos os copos da sua superfície se espatifaram no chão. — Eu não quero rezar! Eu quero que vocês façam alguma coisa!!!

             — E vamos fazer. A cirurgia irá começar em instantes. — Se retirou, como se não tivesse me visto quebrar uma mesa na sua frente.

            Samaris me trouxe água, sentou-se ao meu lado e me acalmou um pouco. Só quando segurei o copo nas mãos percebi que estava tremendo. A água se agitava em pequenas ondas dentro do recipiente e eu tive que segurá-lo com as duas mãos para poder beber sem derramar.

            A movimentação continuava, médicos entravam e saiam da sala de emergências apressadamente e, por mais que eu me esforçasse, não conseguia ouvir a Jéssica, nem o choro do bebê, nem nada.

            Flashes se passavam na minha cabeça: Jéssica desmaiando no parque. Pessoas falando que jovens tendem a ter gravidez de risco. O médico mexendo nos papéis e afirmando que Jéssica devia tê-lo procurado antes. Todos os detalhes que deixei passar indicavam um mau prelúdio.

             Depois de muito tempo saiu um médico da sala para conversar conosco. Dessa vez, nem me levanto, pois sei que não conseguirei processar nenhuma informação. O médico passou o quadro geral da paciente para Samaris e Katsu, que ouviram atentamente. Logo, Samaris veio até mim e falou, demonstrando certa cautela:

A VIDA DESENCAIXADA DE ICK FERNANDES (história completa)Wo Geschichten leben. Entdecke jetzt