Galinha delicada

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A conversa com Charlie proporcionou em Heloísa o sentimento de leveza, ele diferentemente do usual não a julgou apenas ouviu atentamente a história excêntrica. A ducha gélida não limpava toda a dor física, era infinitamente pior quando era capturada pelas premonições, pois seu corpo limitava-se a simplesmente sentir desconforto.

O diálogo com o novo psicólogo durou incontáveis horas, mas ela não se atentou ao tempo. Já era à noite e o som do cantar dos pássaros era audível, mas nem mesmo a tranquilidade do canto amenizava a energia que consumia Heloísa, ela não desejava dormir, pois acreditava que a insônia venceria.

As roupas confortáveis de Louise, para a infelicidade de Helô, dissiparam sem mostrar sinal. Ela procurava as calças largas, porém a única peça avistada era a legging preta que marcava todo seu corpo.

– Onde pensa que vai? – um militar aleatório comentou com grosseria.

– Beber água ou prefere que eu morra desidratada? O que pretende fala ao seu general sobre a sensitiva encontrada morta? – Heloísa não esperou resposta da autoridade, apenas prosseguiu em seu caminho.

O silêncio era dominante, nenhum barulho acidental era ouvido. A sede do exército ostentava um mistério surpreendente, porém a ânsia por desbravar os corredores sombrios despertava em Heloísa o desejo pelo perigo.

A luz era mínima, porém ao longe se tornava visível à fresta de luminosidade que se formava na sala vermelha. Marchand franziu o cenho buscando coragem para invadir o recinto relativamente aberto; o som ritmado e constante invadiu a audição da francesa, porém não era como se ela estivesse com medo. A claridade lhe perturbou a visão durante segundos, porém quando conseguiu se acostumar com o brilho da saleta era tarde demais, pois sua mente fora terrivelmente prejudicada.

Lá estava ele, o general sem escrúpulos eliminando toda sua raiva e frustração em um pequeno, porém respeitável saco de pancadas vermelho. Ele não foi capaz de desvincular sua atenção do exercício, a atenção de Harry era voltada exclusivamente para o objeto; Heloísa julgava que a raiva que ele sentia era imensurável, pois o pobre instrumento foi o condenado. Ele usava uma blusa preta que demarcava seus músculos contraídos que se movimentavam diante a ação progressiva que Underwood realizava; ele franzia o cenho levemente buscando não cortar a conexão entre suas emoções e o saco. A francesa admirou a cada sinal agressivo que o general exibia, era como uma droga viciante.

– Você deve estar muito frustrado. – ela finalmente disse.

Harry a encarou os olhos vermelhos, ela julgava que era a raiva armazenada. O sorriso ladino surgiu mostrando que o general processava reflexões pervertidas diante a ocasião. Ele a encarou por inteiro, era notório a tensão que invadia aquela maldita sala, qualquer movimento impensado poderia ocasionar em uma explosão significativa.

– Perdeu alguma coisa? – Heloísa usou da grosseria.

– Perdi. – Harry foi verdadeiro. –, mas parece que você está igualmente prejudicada.

– Certeza que estamos falando sobre a mesma coisa, general? – ela se aproximou dele sentindo a atmosfera carregada.

– Tenho plena certeza que sim, francesa. – ele sorriu descaradamente.

Heloísa percebeu que o general considerava que aquele momento seria o ideal para ela se entregar ao charme barato, porém infelizmente adora corromper a idealização alheia.

– Duvido que você frequente diariamente essa academia. – disse.

– Eu sou militar, preciso manter a boa forma.

– Boa? Tem certeza? – Marchand gargalhou vislumbrando o corpo de Harry.

– Está dizendo que meu corpo não é bom? – ele pretendia entrar no jogo sórdido que ela habilidosamente armara.

– Cada um com suas conclusões. Tais constatações não saíram da minha boca. – Heloísa deu de ombros, andando por toda a sala.

– Eu sou muito boa – mordeu o lábio inferior –, pois certamente dispunha do melhor professor.

Ela indicou o saco de box recordando épocas onde esbofeteava o objeto até sentir os nódulos da mão doerem.

– Não me recordo de ter lhe ensinado a arte da luta.

– Não seja presunçoso, general. Joseph era um incrível monitor, ele me instruiu em muitos momentos. – ela relembrou cenas do passado.

– Joseph Bouvier? Não duvido que você tenha vencido, não é uma tarefa difícil. – Harry gargalhou.

– Você é muito convicto de seu talento, mas acho que você é um galinha delicado.

– Delicado? – ele aproximou-se de Heloísa. – Me mostre que você consegue vencer o galinha deliciado, Heloísa.

Ela estava animada com o desafio proposto por Harry, pois acreditava que vencê-lo não seria uma tarefa árdua. Relembrando dos ensinamentos de Joseph ela movimentou-se como o instruído; primeiro trabalhou com os pés o deixando na posição correta; a parte estressante era memorizar as técnicas de soco e saber combiná-los no instante perfeito. Ele estampou em seu rosto o sorriso debochado, diante seus pensamentos não estava praticando uma atitude "errada" ou "condenável", pois julgava que a francesa era apta a se defender devidamente e diante essa reflexão a ideia de pegar leve não era uma opção.

– Com medo de apanhar de uma mulher, general poderoso? – ela adoraria a possibilidade de lhe enfiar um soco na cara.

– Medo? Essa palavra não é conhecida por mim. – Harry buscou atacá-la inicialmente, porém ela conseguiu desviar.

– Duvido que você não se sinta intimidado por existir a possibilidade de perder para sua prisioneira. – disse. Ele conseguiu atingir um chute leve no braço de Heloísa.

– Nunca vou deixar minha prisioneira ter vantagens sobre mim. Você não é melhor.

– Porém não sou pior. – Marchand, para a surpresa de Harry, o atacou com um chute nas pernas. – Não tire comprovações precipitadas sobre mim, você não é meu psicólogo. – ela disse séria.

– Nem gostaria de ser. – Underwood imitou a ação da francesa a fazendo cair igualmente. – Esqueceu que somos parecidos? Eu te conheço, você me conhece.

Heloísa estranhou à proximidade dos corpos. Harry praticamente a envolvia com as pernas, era desconfortante tê-lo tão perto, pois ela julgava que assim ele poderia ler sua real personalidade e assim decifrá-la. Ela entendeu posteriormente, ele não mostrava afeição para com ela apenas desejava que a francesa se entregasse ao charme que ele emanava; Underwood era tão grotesco que sua dupla personalidade chegava a passar despercebida quando ele aderia seu ser falso e dissimulado.

– Você não me conhece. – ela levantou-se rapidamente. – Nunca terá esse prazer, sinto muito. – Heloísa lançou um sorriso ladino. – Cuide bem dessa ereção – ele olhou para o volume em suas calças –, sua mão pode ser sua melhor amiga hoje. – a francesa não desperdiçou a chance de luta-lo. – Boa noite, galinha delicada.

Notas: E aí galera??? Foi mal pela demora hahahaha

O QUE ACHARAM DA NOVA CAPA DA HISTÓRIA? ESPERO QUE TENHAM GOSTADO. BEIJOS 

Complexo de CassandraWhere stories live. Discover now