Capítulo 6: Como um mês só nosso

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Algumas semanas já haviam se passado. Era chegado o dia de Michelly e eu irmos visitar sua mãe. Já tínhamos comprado as passagens; classe econômica, fileira 9, poltronas A e B. Michelly foi ao lado da janela, olhando pra tudo lá fora, vendo as pessoas bem pequenininhas quando estávamos no ar. O vôo era tão tranquilo que Michelly até sentiu sono e escorou a cabeça no meu ombro e dormiu. De Nova York para São Francisco de carro, eram duas mil novecentos e vinte e três milhas. Daria o equivalente a quatro mil quilômetros para mais. Seriam quarenta e três à quarenta e cinco horas e meia de viagem. Mas como estávamos indo de avião, pegamos um vôo direto, levava somente seis horas e vinte e dois minutos para chegaramos. Michelly dormiu o vôo inteiro. Seis horas ininterruptas. Quando chegamos, a acordei, dessembarcamos, pegamos nossas malas e saímos do aeroporto. Do lado de fora, um carro nos aguardava.

Michelly cumprimentou o homem, seu nome era Henry, o novo marido de sua mãe. Um cara já caminhando para a casa dos sessenta, mas estava em boa forma, tinha um ar jovial e galante. Queria eu envelhecer bem assim. Ele nos ajudou com a colocar as bagagens no carro, destrancou as portas e nos mandou entrar. Era um carro popular, um Hyundai Ioniq, muito bem cuidado por sinal. Ele parecia um cara bem tranquilo, que estava de bem com a vida. A relação dele com Michelly, parecia boa, eles se davam até que bem. Michelly me contou que seu pai e sua mãe se separaram quando ela tinha apenas catorze anos, sua adolescência foi meio difícil, ela era muito ligada ao pai e depois da separação, mal se viam. Ela passou pela fase dos namoradinho, das festas, da rebeldia, passou por tudo isso sozinha. Seu pai não estava com ela e a relação com sua mãe, não era das melhores. Ela a culpava pela separação, a culpava por terem mudado pra uma cidade, nas palavras dela, que era uma droga, e a culpava por ter deixado toda a sua vida e seus amigos para trás. Começar uma vida nova em outra cidade a partir do zero, não é fácil. Elas levaram um bom tempo para se estabelecer na nova cidade, mas conseguiram. Depois de estabelecidos, morando lá já a algum tempo, sua mãe apareceu um dia em casa com um amigo chamado Phil e depois, mais posteriormente foi se revelando que Phil e sua mãe tinham um caso. Phil foi o primeiro homem que sua mãe teve, após seu pai. O primero, mas não o último. Ela ainda teve mais dois, um que veio após Phil e antes de Henry e Henry sendo este último. A relação com o primeiro não era muito boa, eles não se entendiam em nada. Michelly ainda era bem jovem na época, talvez por isso o desentendimento. Com o segundo, era algo indiferente.

Eles não se davam mal, mas também não se davam bem. Eles mal trocavam duas a três palavras. Era sempre um bom dia, boa tarde, boa noite e nada mais que passasse de alguns cumprimentos por educação. Henry era com quem mais ela tinha se dado bem. Não era seu pai, mas me disse que o lembrava muito. Seu pai também sorria com os olhos, depois franzia as sobrancelhas e coçava a cabeça. Nisso, eles se pareciam. Seu pai também a fazia rir e muito, e Henry vez ou outra lhe arrancava alguma risada. Ele dirigiu até chegarmos ao destino; Union Square, esse era o bairro.

A rua na qual a casa de sua mãe ficava, era bem movimentada e centralizada. A casa era até bem grande. Um sobrado generoso. Tinha uma bela varanda na qual sua mãe nos esperava e acenava da porta. Descemos, a mãe de Michelly veio e a abraçou, a cumprimentou com um beijo em sua bochecha, fez o mesmo comigo e perguntou se eu era o tão bem falado Andrew. Respondi que sim e não mais bem falado que ela. Era de tarde, por volta de umas quatro ou cinco horas, a mãe de Michelly nos convidou para entrar e quem sabe tomar um café ou um chá. Entramos enquanto Henry se encarregava de guardar o carro na garagem. Passamos pela sala de visitas. Era realmente muito bonita e grande, tinha dois sofás e alguns varios quadros, havia também alguns porta-retratos destaco um que peguei em cima da estante na sala. Era uma garotinha em cima de um pônei com um homem de seus trinta anos do lado, parecia ser o pai da garotinha.

Desconfiei que se tratava de Michelly. Ela ficou curiosa em saber o que tinha em mãos que tanto via, ela tentou olhar por cima das minhas costas, me virei para um lado, depois para o outro tentando esconder, ela me agarrou pelas costas com os braço em volta do meu pescoço, segurei seus braços, os puxei um pouco mais para frente e me virei rapidamente, parando bem de frente, rosto a rosto com ela, com minhas mãos, inclusive a que segurava o porta-retrato, em sua cintura. Ela me deu um beijo e abriu um largo sorriso, desceu as mãos e agarrou o porta-retrato que eu segurava junto a sua cintura e perguntou:

-Então era isso que estava escondendo mocinho? Muito bonito.

-Me tire uma dúvida. Não tenho certeza, mas essa seria você na foto?

-Sim, Andrew. Sou eu aos seis anos e meu pai. Uma das poucas fotos que tenho com ele. Não sabe como sinto falta dele.

-Aposto que ele também deve sentir de você. Ele nunca veio te visitar depois que seus pais se divorciaram?

-Ele ainda veio umas duas vezes. Na primeira, minha mãe foi muito seca e ríspida com ele. Já na segunda, deixou bem claro que estava começando uma nova vida e o que eles viveram já fazia parte do passado. Eu estava grande e não tinha mais porquê ele estar fazendo visitas frequentes. Disse que ela não precisava dele e eu, tão pouco. Isso o magoou bastante, magoou a mim também. Eu ouvi tudo, mas atrás da porta, mas era uma tola e não disse nada. Nem para desmenti-la. Eu só pude chorar com as duras palavras que ela disse e meu pai também não escondeu as lágrimas. Ao terminar de ouvir, pegou o pouco orgulho que lhe restava e foi embora. Não voltou mais a aparecer. Ele ainda me escrevia todos os meses, por três anos. Mas depois parou. Só um tempo depois que fui descobrir que minha mãe interditava as cartas que ele mandava. Por isso nunca mais as tinha recebido.

-E você nunca foi atrás dele? Não tentou visitá-lo? Nem depois de já adulta?

-Quando fiz dezenove, já tinha me emancipado.

Morava sozinha, tinha um empreguinho de garçonete que me pagava alguma coisa e estava livre das garras e manipulações da minha mãe. Eu fui uma vez para visitá-lo em Portland para vê-lo. Pesquisei o bairro, a rua, o número da casa, a cor e modelo do seu carro, eu estava no pique detetive. Estava investigando ele mesmo, tinha uma ficha completa. Agora só precisava tocar a campainha ou bater a porta. Eu cheguei na varanda da casa, pensei em bater mas vi a janela semi-aberta e resolvi espiar. Vi ele beijando uma mulher, sua nova esposa, pegando um garotinho no colo e rodopiando com ele, era seu filho. Minha mãe disse que antes de eu nascer, meu pai sempre quis um menino e agora, ele tinha seu sonho realizado. Tinha uma linda esposa e um filho, era tudo que ele queria.

Ele já tinha uma nova família, não precisava de mim, uma jovem perdida e fracassada, com problemas emocionais e psicológicos. Enquanto espiava da janela, uma lágrima solitária escorreu pelo canto do meu olho direito. - Ela contava enquanto seus olhos se enchiam de água.
A abracei forte e disse:

-Está tudo bem agora. Eu estou bem aqui.

Ela chorou um pouco, enxugou suas lágrimas e foi quando chegou sua mãe, dizendo:

-Venham crianças, entrem. O que ainda estão fazendo aqui? Michelly? Anda vamos, vamos pra cozinha e você senhor bonitão - Ela disse referindo-se à mim. - Você vem comigo.

Chegamos na cozinha e ela preparou um café e nos serviu com um bolo que havia acabado de preparar, quase que no momento em que chegamos. Ela começou a puxar assunto e perguntou como nos conhecemos, Michelly respondeu que nos conhecemos pelo lugar que trabalhamos agora. Ela perguntou como estava sua irmã Oldris, como estava sendo morar em Nova Iorque e se tinha sentido saudade de casa. Nos mostrou o antigo quarto de Michelly e disse que estava do mesmo jeito que ela deixou, sua mãe não tinha tirado nada do lugar, só entrava de vez em quando para limpar. Nisso uma garotinha vem correndo e gritando:

-Mamãe, Mamãe! Chelly, Chelly!

Era a irmã mais nova de Michelly, Mia. Era uma garotinha muito linda, pequenininha, branquinha, de olhinhos claros e cabelos encaracolados. Usava um vestidinho de festa rosa com uma fita no meio, e uma tiara no cabelo. Parecia uma bonequinha, uma princesa. Michelly a pegou no colo e girou com ela, disse:

-Oi, Mia! Eu, sua irmã mais velha, super-top-Mega-Ultra-Hiper-Overpower veio te ver e trouxe presentinho. E trouxe também uma pessoa pra conhecer você minha princesa. Você já sabe que nos duas somos duas princesas de contos de fadas, né? E o que toda princesa sonha?

-Com o pincipe. - Mia respondeu.

-Isso! O príncipe. Bom, minha princesinha. Quero que você conheça o meu príncipe. Esse aqui é Sir Andrew Gabriél, meu nobre príncipe encantado.
-Um Pincipe! E você já beijou ele Chelly? Pra ele acordar do sono que a bruxa malvada coloca os pincipes?

-Sim, eu beijei ele e beijei muito. Beijo assim no nariz ó. - Disse Michelly enquanto beijava o nariz da Mia.

-Não Chelly, beijo não. Para. Para {Risos}. Não quero beijo no nariz, não sou mais criança.

-Ah não? Você é o que então?

-Sou Pincesa! - Ela respondeu rindo.

O Sol na minha janela Where stories live. Discover now