Capítulo 1

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"Existe uma maré nos casos dos homens a qual, levando à inundação, nos encabeça à fortuna. Mas omitidos, a viagem das vidas deles está restrita em sombras e misérias. Em um mar tão cheio estamos agora a flutuar. E nós devemos pegar a correnteza quando nos for útil, ou perder as aventuras a nossa frente"

Carolina do Norte, Charlotte, 7:00 da manhã;
Escola nova e volta às aulas, o que acabava sendo decepcionante e ao mesmo tempo aliviador, por ser o último ano. Mais um dia, mais um maldito dia. Como alguém consegue acordar nesse horário bem humorado e de bem com a vida?

Fui ao banheiro, fiz minha higiene matinal e me troquei, logo me sentando na cama por alguns minutos encarando o nada, como se algo estivesse me prendendo ali. Criei forças para pegar a mochila e poder ir para a escola. Ao descer as escadas ouvi minha mãe em seu quarto discutindo com meu pai. Eles mal acordaram e já estavam brigando. Me pergunto como ela consegue aguentar algo como isso e deixa passar como se não fosse grande coisa.

Depois de ouvir a mesma discussão de sempre, a qual eu já sei de cor e salteado, de trás para frente e em 3 línguas diferentes, saí porta afora, sentido o vento bater em meu rosto. O tempo estava agradável, nem tão frio, nem tão quente, e mesmo assim eu estava usando meu inseparável moletom. Coloquei meus fones e comecei a caminhar até a escola, mais conhecida como casa do demônio. Ao chegar, avistei as garotas fúteis do primeiro ano que acham que estão arrasando por serem novas na escola, as garotas do segundo ano fofocando sobre qualquer bobeira que as convém e o pessoal do terceiro ano falando o quanto podem causar na escola por ser o último ano. Pelo jeito são todos babacas. Mal cheguei e já conto os segundos para o ano acabar e dar o fora daqui. Peguei o papel com os novos horários e as primeiras aulas eram de geografia, o que me dava certo ânimo por ser uma das minhas matérias favoritas. Peguei meu material e andei rápido para chegar à sala antes de todos.

O sinal tocou e todos que ainda eram desconhecidos pra mim, entraram e sentaram em seus lugares. Michael assim que me viu, me deu um beijinho na testa. Não ficamos naquele mimimi de volta às aulas, já que nos vimos em boa parte das férias. Michael é meu primo e meu melhor amigo. Mudamos para esta escola esse ano e, por mais bobo que pareça ser mudar de escola no último ano, tivemos nossos motivos. Michael já tinha amigos por aqui, Theo e Jesse, então eventualmente acabou ficando mais com eles. Um dos meus problemas era ser anti-social, então acabava ficando de escanteio às vezes, mas estava com a cabeça cheia demais para cobrar atenção.

Prestei atenção nas aulas de geografia com todo o gosto do mundo, e em grande parte das outras aulas, nem tanto. Assim que chegou a hora do almoço, procurei Michael, que estava com os garotos. Eu já os conhecia há anos, mas não ia muito com a cara deles, mas mesmo assim ficaria ali. Depois do que aconteceu, foi difícil pensar em arranjar amigas. Eles estavam falando de alguma festa do final de semana, como despedida das férias, a qual eu não fui e não fiz questão de ir, já que para mim é só um meio para conseguir duas coisas: garotas e status. Coisas que não me interessavam. Acho que no fundo, eu acabava tendo inveja daquilo, por eles não terem sérias preocupações na vida. Theo sempre foi o que mais tentava puxar papo, era o mais simpático e o mais quietinho dali, mas em questões de festas, ele era como os outros. Geralmente nossas conversas acabavam tão rápido quanto um respiro, o que era um alívio para mim. Fazer amigos não era o meu forte. Andei até o jardim da escola, longe do pessoal, e coloquei meus fones novamente, coloquei Blink da banda Revive pra tocar. Incrível como a letra daquela música se encaixava tão bem na minha vida no momento. Tudo acontece num piscar de olhos, tão rápido, que você acaba se perdendo e não sabe como se reencontrar.

Fui para casa, me troquei rapidamente e fui trabalhar. Trabalho numa lojinha de livros e CDs e é a melhor parte do dia, por mais cansativo que seja. Decidi arranjar um emprego para poder ficar longe de casa e pelo menos tentar juntar dinheiro para a faculdade. O dia havia sido normal e assim que chegou a hora de fechar a loja, me deu um peso nas costas por lembrar que teria que voltar para casa e ver a mesma porcaria. Assim que cheguei, dito e feito, meus pais brigando. Respirei fundo, subi as escadas e joguei a mochila em algum canto do quarto, tomei banho e deitei, com sono suficiente para um mês todinho, e sem perceber, dormi como uma pedra.

BlinkWhere stories live. Discover now