Capítulo 18

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     Meu estômago se embrulha a cada sacolejo da carruagem e eu tento disfarçar olhando com cara de paisagem pela janela. Há neve, árvores nuas e montanhas onde quer que pouse meus olhos e isso torna a viagem entediante mais rápido do que eu pensei que seria. Sentado no banco estofado da carruagem de frente para mim está um Kieran sonolento e silencioso, que sem dúvidas tem mais experiência em viagens do que eu. Durante os primeiros dez minutos ele conversou comigo sobre como seus pais estavam preparando tudo para nossa chegada e que eu ia adorar o clima mais quente de Trollstone, mas assim que o sono começou a atingi-lo, Kieran não apresentou muita resistência. Além disso, eu não sou a pessoa ideal para uma conversa no momento.

     Lá fora, ouço o cocheiro e os oficiais da nossa escolta conversarem sobre sabores de cerveja e apostas. No total há oito homens a cavalo cercando a carruagem e dois servos de Kieran que revezam no papel de cocheiro ocasionalmente. Kieran insistiu que fôssemos acompanhados para nossa própria segurança, levando em conta a longa distância entre Liriel e Trollstone e os perigos que podemos encontrar no caminho. Eu achei um exagero, mas, como já disse, Kieran tem muito mais experiência com viagens do que eu.

     - Puxa... já vai anoitecer - Kieran murmura, abrindo os olhos. Ele parece mais jovem quando está sonolento. É meio adorável.

     Dou um sorriso contido e mais uma vez olho distraidamente para a paisagem lá fora. A carruagem sacoleja.

     - Você deve estar cansada. Por que não tenta dormir um pouco?

     - Não conseguiria mesmo que estivesse exausta - faço uma careta.

     - Ah, é sua primeira viagem. Entendo.

     Assinto, fitando minhas mãos.

     Será que Kieran nota essa distância estranha e cada vez mais crescente entre nós? Não nos parecemos em nada com aquele casal que se beijou apaixonadamente dentro dessa mesma carruagem há poucos dias. Não nos parecemos nem sequer com aquele casal que trocou sorrisos e pequenas confissões durante o jantar de noivado. Por algum motivo, a ausência dele e nosso pequeno distanciamento de dois dias criaram esse abismo entre nós que agora me deixa desconfortável. Eu gostaria muito de descobrir que motivo é esse.

     Apoio a cabeça no vidro da janela e suspiro.     

     - Eu trouxe algo para passar o tempo - Kieran quebra o silêncio, mexendo em sua bolsa de couro aparentemente bem cara. Ele tira um livro de capa azul celeste e oferece a mim. - São contos de fantasia.

     Não hesito em pegar o livro, mas meus olhos se fixam nos seus.

     - Kieran... - minha voz soa firme dizendo seu nome. Ele olha diretamente para mim. - Acho que precisamos conversar sobre algumas coisas.

     Seu rosto assume um semblante mais sério.

     Kieran limpa a garganta.

     - Sim, precisamos.

     - Eu... tenho algumas perguntas - digo e deposito o livro ao meu lado no banco.

     - Tenho certeza de que tem - ele suspira e se inclina, apoiando os cotovelos nos joelhos. - Pergunte-me o que quiser - seus olhos parecem sinceros.

     Baixo os olhos para as minhas mãos.

     - Quero saber o que aconteceu com meu pai e por que ele morreu. E, por favor, não tente amenizar as coisas me poupando dos detalhes.

     Olho para Kieran e o vejo assentir. A carruagem sacoleja e eu sinto uma pontada de dor na cabeça.

     - Anna, seu pai foi encontrado perto do local onde acharam o corpo daquela moça. Ele e mais dois oficiais foram brutalmente feridos, o que me faz pensar que morreram bem rápido e não sofreram muito. Se é que isso a faz sentir melhor...

Amor e Liberdade #1Where stories live. Discover now