33: Aquele Mito da Maldição

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Eu e Paulo não chegamos tão cedo quanto eu desejava, e nossa mãe, obviamente, não deixou por isso mesmo

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Eu e Paulo não chegamos tão cedo quanto eu desejava, e nossa mãe, obviamente, não deixou por isso mesmo.

Assim que adentrei no apartamento, ela estava sentada no sofá, com seu típico ar de quem espera pacientemente a chance de um bom sermão; as pernas cruzadas, uma mão empunhando sua costumeira xícara de café e as sobrancelhas que se ergueram para mim logo que me viu na sala.

Meu irmão tinha se trancado no quarto, antes que pudesse perguntar o que tinha acontecido para nos atrasamos tanto.

Culpei a chuva, obviamente, e suas feições ficaram mais amenas, de modo que não viu necessidade de nos colocar em nenhum tipo de castigo por algo que tecnicamente não foi nossa culpa. Porém, estava inevitavelmente preocupada com Paulo e o seu isolamento súbito.

— Que bicho mordeu esse menino? — a mulher questionou, depois de bater algumas vezes na porta do quarto do garoto e ele não dar qualquer resposta.

Soprei o ar ruidosamente, dando de ombros. Não queria que Paulo ficasse encrencado, mas também, não desejava, com toda certeza, despertar tanta carga de nervosismo na nossa mãe.

— Ele discutiu com alguns amigos. — Optei por uma meia verdade.

Seu semblante se suavizou um pouco mais, e me peguei inevitavelmente mais aliviada diante dessa constatação.

Fiquei horas me revirando na cama naquela noite, sem conseguir controlar o fluxo de pensamentos que corriam pela minha cabeça.

Pensava em muitas coisas; em Jader e em todas as flores que aquele sentimento estava colorindo no meu peito, no que acontecera no carro com Paulo, rememorando a forma como suas íris buscaram as de Donato, bem como do colar que vi pendendo no pescoço do garoto que era seu melhor amigo há anos.

E se, de fato, houvesse algo que nunca tinha percebido entre os dois? Mas como poderia ser possível eu jamais ter reparado em uma coisa tão significativa sobre o meu irmão, como as pessoas por quem seu coração chamava? Por que nunca teria me contado?

Quando cansei de alternar a atenção entre o Bolota e a minha corrente de piscas-piscas que clareava as inúmeras fotos na parede, optei por levantar e ir beber água.

Quando cheguei no cômodo, dei de cara com mamãe encostada no balcão, com um cigarro pendendo por entre os dedos que tentou esconder logo que me viu, mas desistiu, limitando-se a soltar um suspiro frustrado.

Ela estava tentando parar de fumar há quase um ano, mas eu sabia que tinha recaídas de vez em quando, graças ao cheiro característico da fumaça que ficava impregnado nos cômodos, como se grudado com algum tipo de cola invisível.

— Desculpa, filha. — Soprou as palavras com pesar.

Ela ficava mais propensa a fumar quando estava sobrecarregada, e era evidente nas olheiras sob os cílios que certamente era o que estava acontecendo.

Eu Não Faço a Menor Ideia do Que Estou Fazendo AquiWhere stories live. Discover now