21 - O segredo de Ilya

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Ilya encontrou o telefone de Masha na caderneta de Halle. Temia que a polícia ou a AID pudesse estar monitorando o telefone da moça, então, usou sua melhor voz de Ilyana para convencer Masha de que era uma colega do laboratório e que precisava pegar alguns papéis e que precisava do endereço. Masha estranhou, mas conseguiu pegar as pistas de Ilya sobre quem ele realmente era.

Seguiu para a residência de Masha. Andou a passos rápidos, habituando-se à sensação de estar sempre sendo perseguido. Nonas eram dias mais pacatos, sem toda movimentação e frenesi de uma das capitais mais agitadas no mundo. Ao penetrar no bairro residencial onde Masha habitava, pôde notar um cenário agradável, com muitas árvores nos canteiros centrais e, nas laterais das ruas, crianças e adolescentes brincando de pegador ou jogando jogos de bola. Aquilo poderia remeter às memórias da infância, mas Ilya nunca teve muitos amigos. Mais adiante, viu algumas crianças numa brincadeira que envolvia cantoria e saltos. Isto ativou memórias do tempo em que ainda morava com seus pais. De quando ainda eram vivos. Sim, ele conhecia aquela brincadeira. Percebeu, então, que ir viver com seu tio representou o fim de sua infância. O tio, muito exigente com o resultado dos estudos, ao invés de deixá-lo nas ruas, levava-o consigo para ficar estudando em seu escritório na universidade. A vida de Ilya sempre fora ligada àquele campus. Era como um segundo lar. E, agora, sentia-se amargurado e exilado de seu lar. Isto ressoava com a forma que se sentiu quando foi exilado de sua antiga vida junto a seus pais.

Continuou a caminhada, se sentido envelhecido e triste. Após subir alguns morros, finalmente, chegou ao Bairro das Nogueiras e avistou a casa da Masha. Era tão boa e bonita quanto a de Marya. Havia um jardim, porém mal cuidado, cheio de lama e arbustos secos. Na garagem, aberta, via-se um carro. Ilya tocou a campainha.

Masha colocou-o apressadamente para dentro.

– Pelo grande Aren! Em que encrenca vocês dois se meteram...

– Ah, olá, Masha. – cumprimentou Ilya evitando olhar para ela. Era tão bonita que se era desconfortável encará-la.

A moça ignorou o cumprimento e conduziu-o para dentro. Ao chegar à sala, ele deparou-se com Halle sentado em um sofá com o livro sobre os Vorn-Nascas em mãos e um volumoso dicionário no colo.

– Frangote! Chega mais e senta aí! – Halle era todo sorrisos.

Obedeceu, reparando no braço enfaixado de Halle.

– O que houve? – apontou para as ataduras.

– Aquele cara do bosque quase me detonou... Uma longa história. Pelo visto, você também andou arrumando encrenca. E esse cabelinho aí? – referia-se aos cabelos tingidos por Marya.

– Nem sei se quero contar...

Masha sugeriu – Por que você não conta o que houve ao Ilya, Bremmen? Neste meio tempo preparo algo para comermos. Depois escutamos o que o Ilya tem a dizer.

– Combinado. – Halle respondeu.

Aquela manhã passou com histórias sendo contadas, muitas preocupações e poucas perspectivas de soluções.


***

Os três sentaram-se à mesa para um típico almoço de Nona. Masha avisou – Não tenho costume de cozinhar para visitas, mas espero que gostem.

Halle experimentou a comida e retrucou – Delicioso, Masha! Casa comigo?

– Engraçadinho...

Ilya experimentou e fez uma careta.

– Olha só, Masha. Isto é que é um sujeito sincero.

Mas a careta de Ilya não era por causa da comida, que, na realidade, achou saborosa. Era uma de suas crises. A dor cresceu e o rapaz desmaiou caindo sobre o prato de comida. Halle acudiu.

Os Óculos Indesejados de Ilya GregorvichWhere stories live. Discover now