26 - A Usina

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A loção do velho Xir estava para acabar. Talvez, fosse suficiente para mais um disfarce, ou dois. Trocaram de disfarce e pegaram o trem para Vetrocrav. A cidade era a última parada antes do destino final, uma das mais remotas cidades de Voln, nas montanhas à leste.

Era uma viagem longa, de cerca de três dias. Ilya retomou seus trabalhos, preenchendo muitas páginas de seus cadernos de cálculo. Trabalhava furiosamente em suas equações e fazia pausas apenas nas paradas do trem e para dormir. Às vezes observava a paisagem, com muitas cidadezinhas e vilas no início, e depois com extensas regiões ermas, florestas e até regiões semi desérticas. Faltando poucas horas para chegarem a Vetrocrav, Ilya apressou-se para falar com o amigo.

– Ei, Halle. – disse ao entrar excitado na cabine – Descobri fatos alarmantes. Veja! – mostrou seu caderno repleto de números e equações.

– Moleque, não entendo patavina de matemática.

– Deixe-me explicar. Tive a ideia de fazer cálculos aproximados do consumo de energia em Durkheim.

– Certo...

– O fato é que há uma iminente crise energética. Talvez, sem esta nova usina em Vetrocrav, o país tivesse entrado em colapso.

– Você precisou fazer todas essas contas para saber disso, esperto? Que tal apenas ler os jornais?

– Tá, eu sei disso. –Ilya gesticulava, todo nervoso – O problema é que o consumo e a população estão crescendo em progressão geométrica. Em poucos anos, não vai mais haver energia para todos!

– Puxa, moleque, você não estudou geografia?

– Sim!

– Então conta alguma novidade aí...

– É que eu acho que entendi meu sonho.

– Hã?

– Quando sonhei com a guerra, a invasão, sabia que a culpa era minha. Acho que agora entendi. Se nós desmascararmos o esquema da usina, o país vai mergulhar numa crise energética e como consequência, vai perder a supremacia. E quem não domina é dominado, certo?

– Isso aí não entra na minha cabeça não. O que quer agora? Desistir de mostrar a verdade?

– Sim. Quero dizer, não! Estou com dúvidas, só isso.

– Bom, ainda temos algumas horas antes de Vetrocrav, pense no assunto. Eu vou tirar um cochilo.

A cabeça do rapaz estava a mil. Pensava naquilo tudo e parecia absurdo. Estaria ficando louco?


***

Vetrocrav era localizada em região plana, próxima da cordilheira de picos gelados que separa Durkheim de Karisheim. O percentual da população em Vetrocrav, pertencente à etnia Karis, era bastante expressivo e até mesmo o estilo das construções era peculiar. Casas de telhados bastante angulosos, janelas e portas arredondadas e bem acabadas mostravam um trabalho detalhista dos carpinteiros locais. Era uma cidade muito arborizada, repleta de muitas espécies de pinheiros, cerejeiras e nogueiras.

Outra coisa notável ao chegar à cidade era a cúpula da usina que ficava distante do centro, mas era visível de qualquer ponto da cidade.

O trem ficou parado por horas na cidade e gruas manóticas descarregavam dúzias de contêineres dos vagões de carga.

– Foi-se a última dose da nossa loção de disfarce. – lamentou-se Ilya ajeitando os detalhes de seu novo rosto.

– Que bom que o tempo está gelado, daí poderemos andar bem encapotados. – comentou Halle com otimismo.

Os Óculos Indesejados de Ilya GregorvichOnde as histórias ganham vida. Descobre agora