23 - Passado sombrio

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O apartamento de Ektova Gregorvich tinha cheiro de coisas velhas. O cheiro estava acentuado, pois estava fechado há algumas semanas. Ilya lembrou-se dos seus primeiros dias na casa de seu tio e agradecia o fato de ter se mudado para o alojamento na universidade, há alguns anos.

Halle observou a sala com interesse. Sobre uma estante, havia retratos de família. Em um dos retratos, havia um homem parecido com Ilya, porém mais encorpado e com bigodes fartos. Ao seu lado, uma mulher bonita vestida sobriamente e uma criança de colo.

– São seus pais? – indagou Halle, limpando o vidro do porta retratos que estava coberto por grossa camada de poeira.

– Sim.

– E esta foto?

– A família de meu tio. Morreram todos no naufrágio do Grande Horff, assim como meus pais.

Halle examinou a foto, havia dois garotos e os tios. – Eles eram gêmeos?

– Sim... – respondeu laconicamente, seguindo para o corredor. Passou para o escritório do tio. Havia uma estante enorme, repleta de livros, uma escrivaninha grande, cheia de papéis, mas bem organizada e um armário pequeno com portas de vidro. Em seu interior, muitos frascos e substâncias. Ilya abriu alguns deles até achar seu remédio. Havia dúzias de frascos. Pegou dois punhados e colocou na mochila.

Enquanto fazia isto, Halle observava no escritório, um outro móvel: um arquivo de pastas suspensas. Ele tentou abrí-lo, mas estava trancado.

– Você sabe onde fica a chave, Ilya?

– Não acho que tenha uma cópia por aqui. Tio Ektova tem um monte de chaves que mantém nos seus bolsos.

– Achou o remédio?

– Sim, vou descansar um pouco. – Saiu para seu antigo quarto e tombou exausto sobre a cama.

Halle permaneceu no escritório e retirou alguns instrumentos de sua sacola. Sem muitas dificuldades, arrombou o segredo da fechadura do arquivo. Era o início de uma longa noite de leituras...

Halle apagou todas as luzes da casa deixando apenas a fraca luz de mesa sobre a escrivaninha ligada.

A pesquisa do Dr. Gregorvich era ampla. Encontrou documentação e mapeamento de fenômenos psíquicos e neurológicos ligados à realização de magia e também estudos sobre ampliação de inteligência. Havia extensa documentação sobre cobaias que tiveram sua capacidade de solucionar problemas e memorizar caminhos em labirintos de alta complexidade.

Havia diversos esquemas de cérebros dissecados mostrando diferenças entre humanos, elkins, menodrols, maltisseítas, areales, dragões, etc.

Uma outra pasta continha arquivos sobre testes com um soro chamado AR-507. Não era explícito, mas Halle supôs, pelo tipo de relato, que os pacientes identificados por siglas como: A.G., P.M., A.N.L., I.G., P.G., eram cobaias humanas. Algumas pastas continham tabelas com datas e anotações que seguiam por muitos anos. Uma das pastas, do paciente I.G. tinha registros iniciando em 1913, um ano após o naufrágio do grande Horff. As pastas de A.G. e P.G. iniciavam-se em 1904 e paravam em 1912. A teoria de Halle começava a se confirmar e aquela constatação dava-lhe um nó no estômago.

Durante aquela madrugada, a temperatura caiu drasticamente e, pela janela, Halle notou que estava nevando. Fez uma pausa para ligar o sistema de aquecimento. Vasculhou a cozinha e encontrou algumas coisas boas para consumo, como conservas de legumes e doces.

Ilya despertou e surpreendeu-se ao encontrar Halle debruçado na escrivaninha de seu tio cercado de papéis, livros e vários potes de conserva.

– Que bagunça é essa, Bremmen?

Os Óculos Indesejados de Ilya GregorvichWhere stories live. Discover now