DOIS - Parte 2

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Jogo minha mochila no chão e desabo encostada em uma árvore no limite da clareira. Eu achei que estava acostumada a andar muito. Achei errado. E o pior de tudo é que não posso nem falar que estou morta assim porque estávamos subindo morro ou coisa do tipo. Não. Isso aqui é quase plano, só que... Um dia inteiro andando.

— Você estava certa — Marcos fala.

Olho para ele, que está começando a tirar coisas da sua mochila, do outro lado da clareira – não que ela seja muito grande.

— Sobre?

— Sobre ser impossível achar esse lugar depois que escurecer.

Óbvio.

Dou de ombros e me levanto. Eles que vão providenciar a comida, mas tenho que pelo menos ajudar a organizar o acampamento.

A caminhada foi mais tranquila do que imaginei, se ignorar o cansaço. E a mata em si é muito mais bonita do que eu esperava. Nós fizemos um caminho indo na direção da praia e depois voltando, entrando um pouco mais fundo e vindo para essa clareira. É disso que Marcos falou – eu insisti para virmos logo para cá ao invés de dar mais uma volta, porque tinha certeza de que não ia achar o lugar se começasse a escurecer. Não que esteja escuro. Na verdade, eu esperava bem menos luz do que temos a essa hora.

E isso é familiar, de alguma forma. Continuo não me lembrando para valer de estar aqui, mas passamos por alguns lugares que tenho certeza que já vi antes. E a luz... Parece que as árvores filtram a luz do sol de um jeito que ela parece mais fraca... Não. Mais amena, se é que isso faz sentido, porque continua claro. Mais claro do que a parte da mata perto do muro da hospedaria.

— Que distância você disse que estamos do rio? — Robervan pergunta.

Suspiro e olho ao redor. Bem que eu queria saber. Se bem que...

Estreito os olhos e encaro uma das árvores. Tem alguns arranhões fundos no tronco, o tipo de coisa que aconteceu ou foi feita anos atrás. Provavelmente só algum animal. Não que eu ache que tem algum animal grande o bastante para isso aqui. A questão é que... Posso até estar errada. Provavelmente estou. Mas tenho certeza de que já vi essas marcas antes. Se passar por essa árvore, vai ter uma trilha escondida um pouco mais além. Não saindo diretamente da clareira, mas começando um pouco depois mesmo, escondida. E essa trilha vai dar no rio.

— Bem perto. Meia hora de caminhada, provavelmente menos.

Eu acho. Se não estiver imaginando coisas.

— Ótimo!

Não sei por que, mas tudo bem.

Os três ainda estão tirando coisas das mochilas – não, Marcos já está montando uma das barracas. Certo. E eu estou com fome.

Começo a limpar uma área no meio da clareira, empurrando as folhas e gravetos para o lado e amassando o pouco de mato que ainda está no chão. Estranho. Quase não tem mato no chão aqui. Não que eu esteja reclamando.

Quando paramos para comer, mais cedo, Marcos apareceu com um fogareiro que para mim mais parece um daqueles mini-fogões que youtubers que fazem receitas usam. Posso até estar muito enganada, mas tenho quase certeza de que isso é caro. O que quer dizer que talvez eu pudesse ter combinado um preço um pouco mais alto.

O fato é: não tenho que me preocupar demais com muitos cuidados para fazer a comida. O que estou fazendo aqui é mais por precaução mesmo. Bom senso básico de não querer correr risco.

— Daiane? Pode me ajudar aqui?

Olho para Clarisse. Ceeerto...

— Eu avisei que nunca montei uma barraca antes, não é?

Ela só ri.

Bom, avisar eu avisei.

No fim das contas, montar a barraca é mais fácil do que pensei. Acho que o problema maior vai ser na hora de desmontar e enrolar ela de novo do jeito que estava antes para ficar presa na mochila. Eu até diria que não é problema meu, mas acho que vai ser. E, pensando bem, vou precisar aprender isso mesmo, se tiver qualquer intenção de começar a vender caminhadas na mata... Se bem que minha ideia era caminhadas. Só isso. Nada de passar a noite aqui.

Olho na direção da árvore marcada. Já está escuro o suficiente para eu não conseguir ver os arranhões no tronco dela, mesmo com a luz das lanternas que acendemos perto das barracas enquanto terminamos de comer. Perdi a noção do tempo enquanto terminávamos de montar tudo aqui, mas não me esqueci das marcas. Quer dizer, não esqueci de novo, porque tenho certeza que já vi elas antes. Certeza. Se não, não estaria com essa sensação estranha e pesada. É quase a mesma coisa daquele sonho: uma dor no peito, como se eu soubesse que estava deixando algo importante para trás, mas sem poder fazer nada sobre isso.

Não. Chega. Eu perdi minhas memórias daqui, só isso. Não sei por que e acho que não quero saber mesmo. Pronto. Mais nada. Não preciso ficar achar uma explicação para marcas em uma árvore na floresta. Não deve ser nada demais. Algum animal que passou por aqui anos atrás. Só.

E espero muito não sonhar essa noite.

***

N.A.: AAAAAAAAAAAAAAAAA pequeno pequeno pequeno. sorry :v pequeno problema de estar escrevendo só "metade" do planejado - os planos são de fazer esse livro com dois POVs, mas pro wattpad só vai vir um mesmo. ou seja, tem umas horas que eu me ferro porque odeio postar parte pequena demais. affs. tentar correr as coisas aqui pra quando for assim ao menos conseguir postar duas de uma vez.

Água e Fúria (Entre os Véus 2) - DEGUSTAÇÃOWhere stories live. Discover now