One Shot to the Brain

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Aquilo era errado de pelo menos duas maneiras: burrice, seguida de traição. Corri, e tenho bastante certeza de ter tropeçado pelo menos duas vezes no caminho, até o carro. Não conseguia achar a chave, tentei três vezes até desativar o alarme e depois falhei em encontrar a porta. Quando finalmente me sentei ao volante, o ouvi chamar meu nome de novo. Bati a porta. A descarga de adrenalina deve ter ajudado a ligar o veículo e dirigir, mas não faço ideia de como cheguei aqui, ao meu quarto de hotel, sã e salva.

Estou muito certa de que exalo todo o gim tônica que bebi pelos poros, e decido fazer um café e tomar um banho. Minha mão treme ligeiramente, enquanto tiro a roupa e tento colocar a cafeteira em movimento, intercalando ações. Água, blusa, café, calça, botão de ligar, sutiã. E então a lembrança da mão dele na minha pele invade meu cérebro como uma avalanche. Como foi que eu pude deixar isso acontecer? O que é que eu estava pensando? O que é que eu NÃO estava pensando? Passo a mão na testa, está úmida de suor. E de vergonha. Eu devia ter vergonha.

Meu telefone vibra e vejo o nome e o rosto sorridente de Paul na tela. Não há a menor chance de atender essa chamada ou de responder qualquer mensagem. Ou de viver. Sinto o drama se espalhar dentro de mim como uma árvore cheia de galhos. Decido entrar debaixo da água. Não é de grande ajuda. Só o que consigo fazer é repassar em detalhes tudo o que aconteceu.

O medo de avião me fez dirigir por cinco horas até Pittsburgh para ser madrinha de casamento de Eleanor, minha melhor amiga. Ela já havia me avisado sobre encontrá-lo na cerimônia, já que ele era um dos melhores amigos de Jake, o noivo. Remoí essa informação durante dois meses, sentindo que ela comia a cada dia um pouco mais da minha sanidade e tentando a todo custo não deixar que Paul percebesse nada. Foram sete anos longe dessa cidade, longe dessas pessoas, longe de qualquer notícia que pudesse me lembrar o que aconteceu. Mas por Eleanor eu decidi voltar. Talvez não tenha sido uma boa ideia.

Estava tão tensa quando cheguei há algumas horas, que acreditei que tomar uma bebida fosse me ajudar. Resolvi ir a um bar que costumava frequentar. Quando cheguei, o lugar tinha mudado completamente. Mas, como ainda parecia decente, entrei. Pedi um gim tônica duplo com limão. E engoli a bebida sem saborear, deixando que o álcool me relaxasse ligeiramente. No segundo copo, já estava menos preocupada e praticamente curtindo a música country um pouco melosa que tocava. Devia ter ido embora nesse momento. Mas pedi o terceiro drinque. Na metade, olhei para a minha direita, para o outro lado do balcão. Lembro que foi para a direita porque apenas o movimento do meu pescoço para esse lado já faz reproduzir a sensação de pânico na boca do meu estômago. A explicação científica para o susto tem a ver com descargas hormonais e com nos preparar para um perigo iminente. Eu senti apenas que ia morrer. Acho engraçado como mesmo depois de tanto tempo ainda podemos reconhecer certas coisas nas pessoas com quem convivemos durante um tempo razoável. Eu conseguiria identificar aquele braço e o jeito de virar a garrafa de cerveja, jogando a cabeça um pouco para atrás, em qualquer época da minha vida. Todas as minhas entranhas travaram ao mesmo tempo, se contraíram em uma grande bola ansiosa e, quando eu tentei me levantar para fugir dali o mais rápido possível, ele olhou. Ele me viu. E, nesse momento, eu perdi as pernas e a cabeça, tudo ao mesmo tempo. Antes que eu conseguisse pensar em colocar em prática o plano de fingir demência completa e ir embora, ele estava parado do meu lado. Maldito álcool.

_ Layla?

Sim, sou eu. Pensei, mas não falei, e ele continuou parado me olhando, confuso. Eu gostava de quando ele parecia confuso. E, assim que me percebi pensando em gostar de alguma coisa, qualquer coisa, nele,  consegui, finalmente, descer da banqueta de bar e colocar minha bolsa no ombro. Então, sua mão me segurou o braço delicadamente, morna e vagamente suada. Olhei primeiro para os seus dedos e depois para o seu rosto.

_ O que... ? Como você está aqui? Não vá.

Eu estava com a minha promessa na mão, pronta para jogá-la no chão e vê-la se espatifar como um prato num casamento grego. Cacos pra todos os lados. Uma catástrofe de cacos.

_ Oi, Taylor.

Lá estava. Promessa ao chão.

A Tempo [completa]Where stories live. Discover now