Capítulo 9 - Não me CHAME

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AVISO DE GATILHO.
O capítulo a seguir conta com cenas focadas em transtornos psicológicos, tais como: depressão, ansiedade e o TOC.
Tais cenas podem gerar crises, por isso, peço que leiam com cuidado e tenham consciência de seus limites.

Obrigada pela atenção,
Boa Leitura!

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Angélica sempre havia sido uma mulher bonita, talvez com uma beleza até mesmo superior à de seu filho. Porém, de certa forma, aquela qualidade fora como uma maldição em sua vida. A moça havia ido para a capital em busca de uma melhor condição de vida e de realizar seus sonhos quando ainda estava cursando o ensino médio. No interior em que morava, era uma das poucas que se dava o luxo de apenas estudar — era filha única, outro luxo na pequena cidade. Em busca de uma carreira, participava de pequenos ensaios fotográficos que quase não pagavam sua condução enquanto procurava algo melhor, nada muito extravagante, apenas para montar um portfólio. Foi em uma tentativa de ingressar em um projeto maior que acabou conhecendo Henrique. Henrique, o belo rapaz que chamava atenção por onde passava com seus olhos cinzas e seu olhar que combinava perfeitamente com os traços fortes de seu rosto, que havia acabado de voltar do exterior, cheio de ideias. Henrique, aquele que viria a ser seu futuro marido, o seu maior erro.

Conheceram-se quando ela ainda estava tentando ser alguém, cheia de expectativas, ainda assustada com a beleza da cidade grande, enquanto dividia-se para lidar com os estudos e o trabalho, estudando em um turno, procurando quem a quisesse fotografar em outro, revisando os conteúdos para o vestibular no tempo que sobrasse.

Angélica era de um lugar parado, mas, em sua alma, reinava o movimento.

O desejo de ser alguém foi o que chamou a atenção do homem, trocaram olhares e algumas frases soltas, saíram duas ou três vezes. Não existia amor, mas existia beleza — e na beleza, residia as chamas de ambos. Um relacionamento era tudo que a adolescente não procurava, uma gravidez era tudo que ela menos desejava, mas foi o que acabou ocorrendo seis meses depois deles se cumprimentarem pela primeira vez, naquela tentativa falha de alcançar alguma coisa na vida da menina que acabou caindo no conto de que era muito madura para a sua idade.

Angélica não conseguiu o projeto que almejava.

No entanto, para todos, ela estava feita na vida. Não precisaria morrer de trabalhar em diversos turnos, ou sonhar com a universidade. A gravidez de um homem destinado a ser bem-sucedido era a melhor coisa que poderia acontecer na vida de uma mulher, menos na dela.

Ela queria sentir a liberdade, ir ver o mar, ser fotografada e cursar algo relacionado à área de Design, embora não soubesse como.

Porém, tudo que escutou foram os sinos da igreja, tudo que utilizou foi o vestido branco, tudo que ganhou foram coisas que ela nunca teria a chance de alcançar sozinha, e, talvez por isso, não pareciam valer de nada. Foi felicitada por seus pais, por seus tios, familiares em geral — tinha conquistado um grande prêmio, tirado a sorte grande! Veio à cidade grande procurar um emprego e arranjou um marido.

Com a mesma rapidez que o relacionamento foi ao ápice, ele declinou ao fim. A diferença de seis anos era visível na relação do casal, ela já não era tão madura para a sua idade quanto o marido afirmava no começo da sua relação — quanto ele afirmou que ela era ao levá-la para cama. Henrique era impaciente, frio, metódico. Gostava de bebidas tanto quanto gostava de mulheres, tanto quanto gostava de uma boa noite de sexo. No fundo, o problema não era ele, Henrique era um rapaz de 24 anos sendo um rapaz de 24 anos — o problema é que Angélica era uma menina de 18 anos que não poderia ser uma menina de 18 anos, pois agora era mãe.

Não sabia do que reclamar, morava em uma casa boa, possuía dinheiro para ajudar os pais, seu filho seria criado com todas as oportunidades que ela batalhou para tentar agarrar. Mesmo assim, sentia-se infeliz. Mesmo que todas as mulheres que a cercavam insistissem na ideia de que ela teve sorte, não conseguia acreditar naquelas palavras. O que era sorte afinal?

Não me TOC [COMPLETO]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora