Capítulo 6

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Os vormags avançaram com uma velocidade descomunal e o caçador não teve tempo para pensar muito bem na melhor forma de agir. As quatro criaturas correram, desordenadamente, em sua direção, com pisadas fortes e profundas, levantando terra e folhas secas pelo caminho, enquanto chiavam e salivavam de desejo pela carne fresca à sua frente.

O homem encapuzado sabia que não poderia lutar com elas ali, naquele lugar aberto, onde as quatro fúrias poderiam atacar, praticamente, ao mesmo tempo. Seria impossível proteger a menina se eu esperar pelo combate aqui e também não posso simplesmente pegá-la no colo e correr para dentro da floresta, mesmo tendo a certeza de que sou mais rápido que os vormags, eles estão muito próximos e seriam capazes de nos ferir ao tentar abrir caminho por entre eles, o homem pensou.

As criaturas já se encontravam quase sobre eles e seu tempo havia se esgotado. Ele não podia mais ficar parado ali, pensando em algum plano bem elaborado, então, o caçador embainhou a espada da sua mão direita, com um movimento rápido e preciso e, logo em seguida, ele se abaixou e passou o braço em volta do corpo da criança, trazendo-a em direção a seu peito, ao mesmo tempo em que se levantava e virava de costas para as criaturas. O homem disparou para dentro da caverna com Arryn chorando e soluçando em seus braços, enquanto as fúrias vinham logo atrás, babando em seus calcanhares a alguns passos de distância, grunhindo e batendo os dentes sem parar, de uma forma enlouquecedora.

Ao chegar até a metade da passagem com chão de terra, íngreme e escorregadia, pela qual havia passado com tranquilidade momentos antes, o caçador colocou a menina no chão e disse:

— Arryn, sei que seus olhos não enxergam no escuro, mas preciso que confie em mim e faça o que eu disser. Pode fazer isso? — A pobre menininha indefesa e assustada fez que sim com a cabeça e o homem destemido continuou: — Ótimo! Fique atrás de mim e não saia daqui por nada.

— Você... você... vai me deixar aqui sozinha? — Arryn perguntou tremendo, fungando e com lágrimas escorrendo dos olhos.

O caçador não teve tempo para responder à menina, já que uma das fúrias pulou sobre ele de surpresa e cravou os dentes em seu ombro esquerdo. O homem uivou de dor e, sem pensar duas vezes, aproveitou a mão que estava livre da espada para agarrar a criatura pela parte de cima da cabeça. Com seus dedos fincados com firmeza no crânio do vormag, o caçador puxou a criatura para longe de sua carne e, com o seu braço esquerdo, fez um movimento rápido para cravar a espada na garganta da fúria. A criatura instantaneamente começou a se debater de um lado para o outro sem parar e usou uma das suas enormes garras para arranhar a lateral do corpo e causar mais um ferimento ao homem, que já sangrava pelo ombro.

Livre dos dentes da fúria mortal, ainda segurando o crânio e com a espada atravessada na garganta dela, o caçador deu um giro rápido para o seu lado direito, puxando a criatura pela cabeça. Aproveitando-se da velocidade do giro, e com a criatura ainda flutuando no ar, o caçador fez um movimento parecido com estilingue para arremessar o corpo do vormag em direção às outras três fúrias, que a essa altura já se encontravam quase sobre eles, enquanto segurava com firmeza a espada em uma mão e usava a que tinha os dedos fincados no crânio para arrancar a cabeça da criatura com as próprias mãos.

Enquanto sangrava pelo ombro e pela lateral do corpo, o homem ficou parado, observando o corpo da fúria mortal voar para longe sem a cabeça, que nesse momento encontrava-se na mão do caçador, jorrando sangue compulsivamente pela terra abaixo de seus pés e atingindo em cheio as outras três criaturas, que imediatamente se desequilibraram com a mistura do impacto e o chão íngreme onde pisavam e caíram rolando sobre seus corpos na direção do início da passagem por onde entraram. Uma a menos, agora só tenho que acabar rapidamente com as outras três e dar logo o fora daqui antes que apareça mais algum vormag. Preciso encontrar algum lugar para deixar a menina em segurança e, em seguida, voltar para cá, para explorar com calma o local e tentar descobrir quem é o responsável pela criação dessas criaturas e, principalmente, qual o objetivo por trás disso tudo, o homem ferido e sangrando pensou consigo mesmo.

Antes que pudesse concluir o seu pensamento, o homem parado com a espada em uma mão e na outra a nojenta cabeça deformada da criatura, que pingava sangue sem parar, viu as criaturas se levantarem rapidamente com apenas um movimento, quase que ao mesmo tempo. Elas se entreolharam por um momento e, logo depois, soltaram um grito gutural e uníssono ao olhar e cutucar, com suas enormes mãos em forma de garras, o corpo inerte e sem cabeça que jorrava sangue sem parar pelo buraco que existia no pescoço e que jazia jogado no chão, em meio a uma espécie de lama formada por sangue e terra.

Nesse mesmo momento, o caçador pôde ouvir nitidamente o choro e o soluço da criança às suas costas e que, apesar do pavor que parecia sentir, confiou na palavra do homem e fez exatamente o que ele pediu, sendo valente ao não correr e ficando bem atrás do caçador, sob a sua proteção. Ao mesmo tempo em que percebeu o desespero da menina, e apesar da escuridão que tomava conta do local, ele viu, perfeitamente, o olhar raivoso nos rostos deformados dos vormags, a pelo menos uns 20 passos de distância de onde ele se encontrava. Eles o encaravam cheios de ódio e com pura maldade no olhar.

As criaturas rosnaram com ferocidade e exibiram os enormes e terríveis dentes pontiagudos na direção do homem encapuzado, enquanto se preparavam para iniciar uma nova investida. O caçador não pareceu se intimidar, pois, a essa altura, ele já estava bem familiarizado com aqueles dentes nojentos e horrendos, uma vez que seu ombro sangrando ainda latejava de dor e o lembrava, constantemente, da ferida aberta há bem pouco tempo atrás.

Antevendo o que estava prestes a acontecer, o caçador arremessou a cabeça ainda pingando sangue na direção das demais criaturas. O crânio caiu um baque leve no chão e rolou pela terra até colidir com a perna de um dos vormags, deixando o piso ainda mais enlameado e escorregadio pelo caminho. O homem ferido no ombro e na lateral do corpo sacou da bainha a sua outra espada, sem maiores dificuldades, e se preparou para o aguardado e inevitável reinício do combate, pois ele conhecia muito bem as fúrias mortais e sabia que elas nunca desistiriam e muito menos abririam mão, facilmente, de suas presas. Apesar do que os homens acreditavam e contavam em suas lendas, os vormags não eram criaturas irracionais, eles apenas tinham o apetite voraz e uma fome insaciável.

O vormag abaixou-se para pegar a cabeça do chão, que acabara de colidir com a sua perna, e, ao se levantar, encarou com seus enormes e horríveis olhos vermelhos o caçador. A criatura esticou seu braço na direção do homem e com a sua mão em forma de garra, por onde escorria um líquido verde e nojento, ela exibiu o crânio entre seus dedos e o esmagou com tanta força que o caçador conseguiu escutar, nitidamente, de onde ele se encontrava parado, o estalo dos ossos se partindo.

Ao mesmo tempo que ossos quebravam, as outras duas criaturas ultrapassaram com rapidez o vormag que ainda segurava o resto de uma cabeça na mão e se lançaram, lado a lado, na direção do caçador, com um ódio mortal nos olhos.

Assim que elas chegaram perto o suficiente do homem, que acabara de matar uma das criaturas com suas próprias mãos, e que, a essa altura, já se encontrava à espera das demais fúrias, com uma arma em cada mão, atacaram com um farto repertório de movimentos, sempre se utilizando de golpes muito bem coordenados e sincronizados. As fúrias lutavam como se fossem uma só, com uma mescla de selvageria e inteligência, que nenhum homem normal poderia julgar que elas sequer fossem capazes de fazer.

Dificilmente, o caçador poderia ser caracterizado apenas como um homem ordinário, logo, ele bloqueou e se esquivou de todos os ataques das criaturas, com extremo reflexo e uma habilidade fora do comum e não correu perigo em momento algum. Mesmo com seu ombro latejando, ele manteve um ritmo cadenciado e constante, variando entre ataque e defesa, mantendo as criaturas entre ele e a pobre criança indefesa às suas costas.

Os vormags eram rápidos e mortais, porém, o caçador era ainda mais veloz e preciso com as espadas em suas mãos. As fúrias eram de uma esperteza invejável e nunca atacavam duas vezes da mesma maneira, porém, o homem era ainda mais inteligente e experiente do que as duas criaturas juntas e aproveitava qualquer brecha para causar os mais variados tipos de ferimento nelas, mesmo que superficiais, enquanto esperava pelo momento derradeiro, pois ele sabia que, mais cedo ou mais tarde, as duas criaturas cometeriam algum erro mortal e deixariam uma abertura em suas defesas que ele poderia explorar para acabar com as duas fúrias simultaneamente. O caçador já havia previsto isso em sua mente. Ele tinha plena consciência de como deveria agir quando o momento certo se apresentasse. O movimento rápido e letal estava gravado em sua cabeça e era um dos seus preferidos.

O Caçador MisteriosoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora