Capítulo 12

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Cansado, com o corpo inteiramente dolorido, ferido e com extrema dificuldade de respirar, o caçador chegou ao seu destino e viu uma cabana, de tamanho razoável, feita inteiramente de madeira, surgir bem diante dos seus olhos. Seu cansaço era tão grande, que até mesmo a luz do fogo queimando nas duas tochas, fixadas em cada lado da porta à sua frente, foi capaz de causar um grande incômodo nos seus olhos. Ele sentiu-se muito irritado no momento e, mesmo ciente que o propósito daquele fogo era manter tudo de ruim afastado daquele local, não conseguiu se conter e soltou alguns palavrões em direção àquela luz.

Com extrema dificuldade, o homem caminhou até a entrada da cabana e bateu na porta três vezes, e por outras três vezes mais, nenhuma resposta veio do interior. Cansado, com raiva, irritado e completamente sem paciência, ele gritou:

— ABRA A PORTA, RASBAN! — O caçador esmurrou a madeira com mais força dessa vez.

Depois de alguns segundos, que mais pareceram uma eternidade, a porta rangeu e, enfim, se abriu um pouco.

— Você? Como ousa... O que está fazendo parado aqui na minha porta? — Uma silhueta azulada e brilhante, aparentemente de um homem de meia idade, com cabelos grisalhos e cavanhaque acinzentado, abriu uma pequena fresta da porta e, com os olhos arregalados, encarou, fixamente, o homem todo ensanguentado que batia à sua porta.

— Preciso... da... sua... ajuda — o caçador falou entredentes e, pausadamente, entre uma respiração e outra. Ele sabia que sua batalha com Rasban estava apenas começando e precisava poupar sua energia para dar um fim nele mais uma vez, caso a sua insensatez fosse maior do que o valor à vida que ele carregava em seus braços. O homem estava exausto, mas ele ainda poderia fazer o que precisava ser feito com extrema facilidade.

— Minha ajuda? Hmpf! Se acha realmente que vai receber alguma ajuda da minha parte, dê meia volta e vá embora, pois está completamente equivocado. Agora saia daqui antes que eu... — Ele enfim pareceu notar o corpo da criança nos braços do caçador e, com um olhar de surpresa, apontou para ela e continuou: — Que... Quem... Quem é essa criança que carrega em seus braços? Que mal fez a ela, seu porco maldito?

O caçador ficou possesso com as palavras que o homem usou para acusá-lo, principalmente depois de tudo que ele passara para chegar ali a tempo de dar alguma esperança de vida para a menina. Socou violentamente a porta antes de despejar toda a sua ira:

— Mal? Você está fora do seu juízo perfeito, velho! Como pode pensar uma coisa dessas? — O caçador mordeu os dentes com raiva e sacudiu negativamente a cabeça, de um lado para o outro, socando a porta sem parar. Ele continuou: — Olhe para o estado em que me encontro. Conte quantos ferimentos tenho ao longo do meu corpo. Não consegue perceber que estou aqui apenas para proteger a menina? Você realmente pensa, nesta sua mente pequena, que eu teria coragem de fazer mal a uma alma tão pura quanto essa?

O velho fechou a cara e continuou com as acusações.

— Não tenho dúvidas quanto a isso! Sua espécie não é muito conhecida por se importar com os seres humanos e, além disso, se está tão preocupado com essa aí — a silhueta azul apontou com a cabeça na direção da criança ao falar — é porque, de algum jeito, teve culpa no que aconteceu com ela.

— Minha espécie? Como você é capaz de abrir a boca para falar tanta besteira em tão pouco tempo? — o caçador vociferou com raiva encarando fixamente a silhueta, enquanto a criança gemia e ardia em seus braços. — Será que não aprendeu nada ao longo dos anos?

— Eu conheço a maneira de agir de vocês, esqueceu? Já a senti na própria pele a muito tempo atrás, quando eu ainda respirava, e por isso sei muito bem sobre o que estou falando. Além do mais, você só se importa consigo mesmo, principalmente depois do que aconteceu com a sua irmã.

— Pare de cuspir essas sandices, sua criatura desprezível, até há pouco tempo nós éramos iguais, ou da mesma "espécie", como você parece gostar de falar. Além disso, nada mais importa agora. Veja, seu velho turrão! — Apontou para o corpo da criança com a cabeça e continuou: — O que realmente importa neste momento é que ela encontra-se entre a vida e a morte e precisa, desesperadamente, de ajuda.

A silhueta olhou para o cabelo castanho-claro, todo desgrenhado e bagunçado, da pobre criança, e logo depois para seu corpinho minúsculo e indefeso, inteiramente coberto de suor e tremendo sem parar. Ao ver aquela cena, a expressão de seu rosto se abrandou e, por um breve momento, o velho pareceu realmente comovido e disposto a ajudar, porém, esse momento durou apenas até ele desviar o olhar novamente para o caçador. Com os olhos queimando em chamas, ele falou:

— Como ousa pedir a minha ajuda depois de tudo que me fez?

O caçador ficou furioso ao ouvir as palavras que o outro homem, que brilhava, acabara de falar. Quanto mais tempo ele perdia ali, discutindo coisas que não deveriam ser discutidas no momento, menor seria a chance da Arryn sair dessa situação com vida. Certo de que deveria encerrar o assunto de uma vez, aos berros ele falou:

— A ajuda não é para mim, seu estúpido, não consegue enxergar isso? Estou aqui na sua porta pedindo auxílio para esta pobre criança, que neste momento encontra-se em meus braços, lutando desesperadamente por sua vida. Quer mesmo ter a morte deste ser ingênuo e indefeso pesando em sua consciência ao longo da eternidade?

O caçador sabia que não seria fácil convencer o velho a ajudar, mas o momento que ele esperava, finalmente, chegou e Rasban pareceu ceder aos seus apelos. Estava na hora de usar o trunfo que ele trazia guardado na manga e dar a cartada final.

— Eu... eu não... eu não estou negando...

— Escute, seu fantasma ignorante — o caçador interrompeu antes que ele pudesse completar a sua frase, mordeu os dentes e cerrando os olhos, continuou — a tempos atrás, você teve uma filha, não se lembra? Ela era bem parecida e tinha exatamente a mesma idade desta que carrego em meu colo neste momento, quando você deixou o mundo dos vivos e se isolou aqui. Se fosse ela em meus braços, ficaria feliz caso alguém virasse as costas e negasse ajuda a ela, da mesma forma que você está fazendo aqui, agora?

O fantasma parou por uma fração de segundos, olhando fixamente nos olhos do caçador. Espumando de raiva e com uma carranca completamente fechada, ele escancarou a porta para que entrassem e falou:

— Entre e feche a porta.

O Caçador MisteriosoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora