Capítulo 26

80 9 121
                                    

Uma enorme tempestade de raios eclodiu em algum ponto ao longe da floresta, no oeste. Eles surgiam um atrás do outro, iluminando com um brilho azulado todo o céu negro e inteiramente carregado de nuvens. Trovões rugiam em fúria e seus gritos reverberavam e ecoavam em todas as direções a cada vez que eles tocavam o chão. O clima nunca fora bom em Eldrathor e esse fato era de conhecimento notório de todos os seres que habitavam esse mundo, mas o furor que essa noite trazia consigo dificilmente poderia ser chamado de normal.

Os raios pareciam agitar todos os seres vivos que habitavam a floresta, e perturbavam ainda mais os mortos, que se proliferavam ali, há anos a fio, sem serem incomodados. A inquietação dominava inteiramente o lugar e até mesmo os poderosos demônios se alvoroçavam a cada rugido dos trovões, e corriam de um lado para o outro, praticamente se borrando de medo. O céu definitivamente encontrava-se mais mal-humorado do que o velho rabugento, que no momento parecia estar alienado a tudo o que acontecia ao seu redor, e não parava um só minuto de amaldiçoar o caçador em seu pensamento, enquanto se esgueirava por entre as construções grosseiramente improvisadas e as dezenas de criptas e covas imundas, cavadas por todos os lados na clareira no meio da floresta que Gorvas usurpou para si, em direção ao castelo.

O fantasma tirou proveito da situação dos raios e trovões, e sem ser percebido, deixou para trás uma infinidade de criaturas apavoradas e alheias a tudo que acontecia ao seu redor. Obviamente que a travessia não foi inteiramente fácil e o velho rabugento quase foi pego duas vezes pelos vormags e uma última vez por um demônio de fogo pequeno, porém, graças a uma intervenção pontual do destino, ele foi salvo no último segundo por um cavalo desgovernado, que literalmente passou por cima da criatura e atraiu toda a atenção para si.

Alguns espíritos que vinham sendo torturados por demônios, antes deles largarem tudo e fugirem para as criptas com medo dos raios, olhavam para Rasban com olhos de curiosidade misturados com perplexidade, enquanto ele passava pé ante pé e com um cuidado extremo, sem deixar se distrair e sempre na direção das ruínas do castelo. Outros atormentados, que se aproveitaram da situação para correr floresta adentro, na ínfima esperança de escapar do suplício pelo qual passavam há sabe-se lá quanto tempo, foram imediatamente perseguidos pelos vormags, que ao contrário dos demônios, não pareciam temer nada e permaneciam atentos e vigilantes a toda movimentação no local. De certo algumas almas mais afortunadas tiveram sucesso em escapar e sumiram por entre as árvores e a vegetação da Floresta dos Sussurros, mas a imensa maioria foi trazida de volta para os campos de tortura, para sofrerem ainda mais nas mãos dos seus captores.

Nenhuma pessoa de bom coração deixaria de se compadecer e solidarizar com o sofrimento daquelas pobres almas, mas Rasban poderia fazer muito pouco, ou até mesmo nada naquela situação, então mesmo com o enorme pesar que o atingira em cheio no peito, ele deixou todo o suplício para trás e continuou andando furtivamente e sem hesitar um só momento, até finalmente alcançar o portão por onde o caçador havia entrado anteriormente.

Quase sem acreditar que havia chegado são e salvo ao seu destino, Rasban sentiu uma onda de entusiasmo percorrer cada centímetro do seu corpo etéreo e no calor da emoção, julgou já ter deixado o pior para trás. Tomado por um aprazível sentimento de excitação, que o velho não sentia há muitos e muitos anos, ele decidiu seguir com o que havia planejado e segundos antes de cruzar o imenso portão de madeira negra e envelhecida, que se encontrava fortemente trancado, para procurar pelo caçador, o fantasma teve a sua atenção atraída por vozes que pareceram vir do outro lado do umbral. Desconfiado, de pronto ele desistiu da ideia de entrar no castelo nesse momento e voltou um pouco para se esconder atrás de uns barris de sabe-se lá o que, que se encontravam empilhados no lado do portão que levava para dentro das ruínas do castelo negro, e esperou que quem quer que fosse saísse pela porta e liberasse o caminho para ele continuar a sua busca.

O Caçador MisteriosoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora