Capítulo 1

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A biblioteca da família Rossi

Vila Velha do Caminho Real, um mês atrás.

Andando de um lado para o outro, Eros Vicenzze esperava impaciente, olhando para a porta dupla principal, a fim de que alguém lhe trouxesse novas sobre seu anfitrião.

Sua curiosidade, amor pela fotografia e um projeto cultural o haviam levado para a única mansão sobrevivente da Viarello — o vale fruto de lendas e mitos que ficava na entrada da cidade, logo depois do também famoso, Portal dos Anjos.

Não que ele se sentisse desconfortável em meio aos livros, era um assíduo frequentador da biblioteca municipal há vários anos, ela era, inclusive, razão do projeto que o levara até ali.

Naquele ambiente, porém, seus companheiros de tantas horas ocupavam todas as paredes, do chão até o teto, até mesmo acima do mezanino que ficava no lado sul, estruturado junto a um pé direito alto e cheio de classe tradicional — talvez assim fosse somente para comportar o imenso lustre de cristais, que pairava bem no centro, projetando padrões de sombras com suas luzes amareladas.

A luxuosidade da mansão não o surpreendia, já havia estado ali outras vezes, mas a biblioteca tinha algo de especial que o fazia ter vontade de registrar todos os detalhes.

Não iniciaria a sessão de fotos, no entanto, até o anfitrião vir recebê-lo, apesar de ter deixado o equipamento a disposição sobre a mesa indicada pela sisuda governanta.

Havia esperado alguns meses pelo retorno de Roberto Rossi da Europa para finalmente realizar aquela visita e para tanto, usou toda a influência do Vicenzze mais velho, amigo íntimo do proprietário, para ser recebido. Essa espera era uma das razões pelas quais, sentia agora, com a demora para ter com o anfitrião, uma ansiedade sem precedentes tomar conta de si.

Será que ele tinha mudado de ideia quanto a permitir o acesso dele aos registros da quatrocentona família Rossi? Ou teria permitido a sua presença apenas para que fotografasse a construção, paisagens e as ruínas?

Não, seria muita crueldade. Olhando em volta, seus dedos já coçavam para conter o impulso de começar a fuçar as prateleiras, arrastar a escada de ferro acoplada e subir pois, os melhores e mais raros exemplares sempre estavam nas alturas, longe de mãos curiosas como as dele. Só de pensar nas raridades que deviam compor a coleção dos Rossi o coração bibliófilo de Eros disparava no peito — todo aquele dinheiro e status podiam significar cultura pura — e tendo estudado a vida do Sr. Roberto Rossi com afinco, ele duvidava que pudesse se decepcionar.

Mais alguns minutos se passaram e ele sentia não ter mais capacidade para controlar seus impulsos, quando a enorme porta de duas folhas se abriu. Do outro lado, surgiu o senhor magro e de estatura mediana, porém de aparência ativa e saudável, ainda mais em ênfase por ele estar vestindo um traje esportivo.

"Ele jogava tênis!". Eros pensou, indignado com o fato de ficar plantado ali (sem a permissão de se meter entre os exemplares, claro!) enquanto o outro gastava o tempo com o que ele considerou ser uma futilidade.

Ao encarar o meio sorriso no rosto do jovem visitante que não conseguia ser discreto o suficiente ao analisar o traje do anfitrião, o senhor abriu um sorriso polido, indo estendê-lo a mão:

___ Não sei como me desculpar o suficiente! — começou, mostrando que apesar do português perfeito, essa não era sua primeira língua.

Eros apertou sua mão, o sorriso agora de alívio, pois ele lhe pareceu muito mais empático do que ao telefone. Nada como uma gafe para que as pessoas retirassem sua camada exterior de mera civilidade social.

Desde o Princípio - Livro 1 - Passado no PresenteOn viuen les histories. Descobreix ara