Capítulo 3

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Retratos esquecidos

Vila Velha do Caminho Real, 1 mês atrás

___ Jesus! — exclamou, puxando a pasta — Mas você é... Emengarda olhe para isso!

A mulher, resignada, olhou para a foto e perdeu a expressão séria ao voltar-se para Eros. Aquela deu lugar a uma de espanto, de total surpresa. Largou a bandeja de prata sobre a mesa de metal, causando um ruído ensurdecedor.

O som comprovou que Eros não estava enlouquecendo: se não fosse pela barba rente e o cabelo comprido, penteado para trás, tão tradicional da época, se poderia dizer que ele próprio estava lá retratado!

___ Afinal, quem era esse homem? — Eros indagou, quase a salvo da sufocante impressão.

___ Um dos personagens que acompanham a história da minha família há gerações. Uma história que você, como morador de Vila Velha do Caminho Real, deve ter ouvido algumas vezes. Seu nome era João Gabriel da Veiga.

Eros ficou ainda mais boquiaberto ao ouvir aquela afirmação, sabendo muito bem de quem se tratava. Então, frenético, tomou a pasta e retirando a foto de seu lugar, sem as pinças e leu os escritos miúdos na sua parte posterior:

___ Viarello, 11 de outubro de 1849.

___ Ele não devia ter mais que 25 anos nessa foto.

___ Só alguns anos mais novo do que eu... — revelou, com a voz falhada, uma sensação fria no estômago.

Roberto, que desde o início sabia que a curiosidade do jovem Vicenzze pelas construções e registros da Viarello deveria ter alguma relação com a lenda criada em Vila Velha do Caminho Real sobre os seus antigos habitantes, depois daquela surpresa, decidiu que contaria ao rapaz a história que sabia de cor, pois havia passado muito tempo discutindo o assunto com os avós, quando jovem.

Eros, então, no conceito do Sr. Rossi, tornou-se o primeiro a ser merecedor da verdade, que ele sempre escondia atrás de brincadeiras jocosas que, certamente, contribuíram com o passar dos anos, para deixar a história muito mais "lendária", aterrorizante e romântica, do que ela verdadeiramente era.

O senhor, no entanto, não guardava nenhum peso na consciência, por esse fato. Divertia-se, comentando com os mais íntimos, que também nunca tinham ouvido a versão verdadeira, que aquele era um dos pouco prazeres que ainda lhe eram reservados, e um dos principais motivos pelo qual ele esporadicamente fazia da mansão histórica herdada, sua moradia.

Olhando para o jovem encostado na cadeira, sem fôlego, olhos perdidos em algo que ele não podia ver, Roberto pensou que desde que o havia interpelado no escritório, no início da manhã, julgou que notara traços familiares em Eros, mas havia imaginado que isso se devia ao fato de conhecer seu tio, Enrico, e de ter conhecido ainda em vida Cesare, seu pai.

___ Vou lhe contar a versão oficial dessa história, meu rapaz, fique tranquilo. Acrecito que você, como poucos, merece ouvir a verdade, e não essas conjecturas absurdas que formaram mais uma das lendas de Vila Velha do Caminho Real, e para as quais eu dei a minha contribuição, é bem verdade.

Eros concordou, os olhos, que naquela manhã apresentavam um verde intenso, a cintilar. Queria saber tudo o que pudesse sobre aquele homem, sobre a história que há tanto tempo o despertava curiosidade.

O senhor não precisou procurar muito tempo: logo encontrou outras fotos nas quais o tal homem vinha acompanhado de uma mulher muito jovem, de longos cabelos escuros e cacheados, que vestida em trajes aparentemente rubros, uma modernidade numa época onde as mulheres, quase todas, vestiam-se de negro, sorria alegremente.

Desde o Princípio - Livro 1 - Passado no PresenteWhere stories live. Discover now