Regresso

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            Charles se encontrava em frente á seu apartamento na rua Salter's Hill. Segurava em sua mão direita a chave da porta e não sabia direito como havia ido parar ali. A noite estava escura, o frio trazia uma densa neblina que se acumulava perto das lâmpadas no topo dos postes formando nuvens de fumaça. Todos os pelos de sua barba estavam arrepiados e ele decidiu que era melhor entrar, Charles olhou para os dois lados da rua tentando de alguma forma achar alguma pista do motivo de estar ali, ele olhou no seu relógio de pulso e o mesmo marcava três e vinte dois, mas não da manhã, e sim da tarde, Olhou para o céu escuro e sem estrelas mais uma vez antes de colocar a chave na fechadura e gira-la.

Charles Van Galloway morava a um ano e meio em Londres junto com Justine Evans, aquela que foi sua amiga quase irmã desde que eles eram crianças, e mais recentemente Chuck Cornfield se mudara, desde que pedira a mão de Justine em casamento. Era Chuck que estava acordado naquela hora, ele via um filme antigo na televisão enquanto comia salgadinho quando ouviu as engrenagens da fechadura se mexendo, pulou do sofá e como em um susto armou-se de um abajur.

Ele abriu a porta e deu de cara com uma figura de cueca segurando um abajur, ele soltou um pequeno grito de susto e deu um passo para trás. Os dois se assustaram e respiraram fundo.

— Charles? – perguntou Chuck. — É você?

— É claro que sou eu – disse Charles ainda com a mão no rosto. – Abaixa essa coisa cara, quem mais seria?

— Como vou saber? Já faz três dias que você não aparece em casa. Eu e Justine até achamos que você tinha ido embora, não sei – ele disse.

— Três dias? – perguntou. Ele realmente não se lembrava disso, sua memória mais remota antes daquele momento envolvia algo como procurar emprego e entregar currículos, e ai... Branco.

— Onde você esteve? – Indagou Chuck, agora sentando novamente no sofá.

— Eu viajei. – Mentiu. Ele não queria dizer que não se lembrava do que acontecera. — Fui visitar meus pais, mas, vou me deitar certo? Estou cansado, boa noite – ele só poderia visitar seus pais se tivesse ido ao cemitério.

— Até – Disse Chuck apertando os botões do controle remoto sem parar.

Subiu as escadas até o segundo andar onde ficava seu quarto, fechou a porta e acendeu a luz, nessa ordem. O quarto de Charles permanecera tal como ele se lembrava e acreditava ser o dia anterior, ou três dias atrás. Excluído algumas latas de refrigerante e filtros de cigarro, o lugar até que era limpo e organizado, ele se sentou em frente ao seu velho computador e o ligou, o relógio antigo em seu criado mudo marcavam duas e dez da manhã, foi quando ele decidiu tirar o relógio de pulso.

— Porcaria — reclamou ele si mesmo.

O computador ligava lentamente e só agora que ele havia sentado e relaxado os músculos que ele pode notar a terrível dor que tinha em seus pés e costas, era como se ele tivesse corrido uma maratona. Assim que o computador ligou havia nove novas notificações de chat, Charles clicou:

CharlesVG1990: Claro, nós podíamos tomar café juntos qualquer dia desses, faz tempo que a gente não se vê, qlqr coisa vc me avisa, to saindo pra procurar emprego agora, bjs

MelGreene1: XxXxXxXx
MelGreene1: Qnd chegar me avisa pq tenho que te fala uma coisa
MelGreene1: Charles?
MelGreene1: Já ta noite e nd de vc
MelGreene1: To preocupada já.
MelGreene1: Charles?????? Seu cel só chama!!!
MelGreene1: ...
MelGreene1: Nenhuma noticia sua desde ontem, só me telefone quando ver isso ok?
MelGreene1: Se n quer falar comigo é só dizer, valeu mesmo, adeus.

Melanie Greene em muitos sentidos era a razão de Charles. Ele era apaixonado por ela desde que tinha quinze anos e depois que ela se mudou pra Londres, Charles botou na cabeça que teria que se mudar pra lá também. Eles se tornaram bons amigos, mas muitas vezes acreditava que era somente isso mesmo, um bom amigo.

Charles pegou celular que estava na primeira gaveta da escrivaninha, tinha onze ligações perdidas, o numero de Melanie estava nos favoritos e não demorou um segundo até a ligação estar chamando.

— Alo? – Dizia uma voz cansada.

— Melanie?

— Quem é? – Melanie disse.

— É o Charles – nem havia passado por sua cabeça que eram duas da manhã antes de ligar, sentiu-se envergonhado.

— Resolveu aparecer, é? – Ela parecia irritada. – O que é que você quer?

Aconteceu algo comigo, eu não sei direito o que é, eu não lembro de nada dos últimos três dias, eu já estou ficando um pouco assustado – dizia nervoso.

— Que desculpa idiota, sério. Se não quer conversar comigo, tudo bem, você não é obrigado a ouvir meus problemas mesmo – disse ela.

— Não – ele respirou fundo. – Eu estou falando sério, vamos nos encontrar amanhã, eu te explico tudo que eu lembro. Eu não sei o que tá acontecendo e preciso de você.

— Eu não quero conversar, obrigada – sua voz era seca e sem emoção.

— Mas Mel...

— Não me chame assim – disse ela.

— Escuta, só quero uma chance pra me explicar, por favor?

— Tá bem, mas amanhã não dá porque tenho faculdade, pode ser terça? No Vanilla Café e Internet.

— Claro – respondeu imediatamente. – Boa noite, e desculpa te acordar.

— Boa noite – disse ela numa voz calma e a ligação ficou muda.

Charles se levantou sentindo uma aflição e agonia. Algo estava errado, ele checou no espelho por cicatrizes, suspeitava ser sido vitima do tráfico de órgãos, porém não achou nada. Seus braços tatuados estavam intactos, tudo limpo, ele se deitou e tentou refazer seus passos em sua mente, porém não achava as peças que faltavam nesse quebra-cabeça. Se lembrava de acordar, escovar os dentes, tomar banho, tomar café da manhã, discutir com Chuck por causa do queijo, falar com Melanie no telefone, ir distribuir seu currículo e branco.

Algo muito estranho havia acontecido enquanto tentava arrumar um emprego e isso estava o deixando maluco. Uma forte dor de cabeça surgiu do nada, ele apagou a luz e deitou-se novamente, aos poucos foi relaxando e deixando se levar pelo cansaço, antes que pudesse pensar em alguma outra coisa ruim, adormeceu.

Naquela noite ele sonhou com sombras escuras na parede em um quarto sem janela ou portas, a imagem de estática e uma televisão em chamas, Charles estava realmente ficando louco.

As Pontes InvisíveisOnde as histórias ganham vida. Descobre agora