Partida

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Charlie estava irritado por não conseguir um emprego, talvez fosse sua barba – que ele não rasparia. – Ou sua cara de drogado, mas ninguém queria contratá-lo. Estava cansado de ouvir "Ah, claro, te ligamos qualquer hora." Ou "Seguinte, vou ficar com seu numero e qualquer coisa entramos em contato". Ele pegou seu maço de cigarros e colocou no bolso, desceu as escadas, Chuck e Justine estavam tomando café da manhã.

- Olha o milagre, acordando cedo – disse Justine, Chuck riu.

- Preciso arrumar um emprego hoje, não tenho nem dinheiro pro pão da tarde – disse Charlie. – A coisa tá feia.

- Você é um rapaz bonito – disse Chuck. – Vai conseguir emprego rapidinho.

- Se tu me dissesse onde trabalha, a gente poderia trabalhar junto.

- Não – Chuck ficou sério. – Esquece, não tem vagas.

Charlie não conseguia entender o motivo de Chuck ser tão reservado quando ao seu trabalho, sempre que ele tocava no assunto Chuck era grosso e falava de outra coisa. Ele odiava quando Chuck fazia esse tipo de coisa.

- Charlie, quer tomar café da manha? – Perguntou Justine.

- Sim, por favor.

- Então vai fazer, não sou sua empregada – disse Justine, o tom era de brincadeira, porém ela falava sério.

- Pode deixar que eu frito um ovo – disse Charlie abrindo a geladeira.

- Amor, eu já vou indo – disse Chuck.

- Espera – respondeu Justine. – Me deixa no dentista? Tenho consulta hoje.

- Claro – respondeu. – Vamos.

Charlie terminou de tomar café sozinho. Os dois saíram e a casa ficou silenciosa. Ele devorou a fritura e comeu um pedaço de bolo que ainda estava cozinha, Justine havia feito dois dias antes mas ainda estava gostoso.

Charlie estava de saco cheio dos segredos de Chuck, pensou em arrancar isso dele. Ele geralmente não era de fazer coisas erradas, mas achou que era uma boa causa. Ele decidiu entrar no quarto de Chuck e Justine e procurar pelos documentos de Chuck, provavelmente ali teriam as informações de onde ele trabalhava. A verdade é que Charlie sentia um pouco de inveja, Chuck trabalhava três ou quatro horas por dia e sempre tinha dinheiro, tinha um carro e muito tempo livre. Charlie queria ser daquele jeito e fazer aquelas coisas.

Ele subiu as escadas e a porta do quarto estava aberta, entrou, estava bagunçado, Justine não ligava para bagunça e Chuck sempre fazia o que ela achasse melhor. Charlie sabia que eles dividiam o guarda roupas, porém não sabia qual era o lado dele. Assim que abriu o guarda roupas foi fácil localizar as roupas de Chuck, ele havia muitas camisas havaianas e coloridas ridículas. Charlie não entendia como alguém podia ter tanto mal gosto.

Charlie abriu as gavetas do lado direito do guarda roupas, a primeira era a gaveta de cuecas, na segunda havia apenas um videogame que estava estragado, a terceira e última tinha um álbum de fotos e um celular antigo. Charlie foi até o criado mudo ao lado da cama, ali haviam absorventes e um livro chamado "Romancine" , fechou a gaveta e foi até o outro lado onde ficava o outro criado mudo. Ali havia pilhas velhas, um maço de cigarro e um relógio quebrado. Olhou de baixo da cama, além de sapatos velhos, aranhas e calcinha de Justine, havia um carro de controle remoto que Chuck havia comprado um tempo atrás e nunca havia usado.

Ele já estava ficando irritado, voltou as gavetas, abriu a primeira onde ficavam as cuecas, fez uma cara de nojo e começou a remexer, encontrou uma pequena bolsa – Bingo! – Ele disse. Abriu e sem querer deixou tudo cair no chão, havia uma série de documentos e comprovantes de contas pagas. Não foi difícil encontrar ali a carteira de trabalho de Chuck, ele pegou e folheou as páginas, só havia um trabalho registrado ali.

"Chuck Cornfield – Descartador – Grupo Magma, Magma Tower 313 Carax Avenue"

Era exatamente o que Charlie precisava, finalmente havia descoberto onde Chuck trabalhava e iria lá deixar seu currículo. Ele colocou todos os papéis novamente na bolsa e guardou na gaveta onde tinha encontrado. Foi até seu quarto e vestiu uma camisa social preta, penteou o cabelo com gel para trás, estava a cara do Zach Galifianakis. Só que magro.

Charlie saiu de casa apressado, levava seu cartão oyster no bolso. Queria chegar tão rápido que chegou a esquecer a porta de casa aberta quando saiu, foi com o passo apressado até a Central Hill, a rua que ele morava, Salter's Hill ficava bem em frente ao Norwood Park, e mesmo assim ele nunca havia passado um tempo naquele parque, se pegou pensando que qualquer dia desses podia convidar Melanie para fazer um piquenique por ali, sim, seria ótimo.
Chegou no ponto de ônibus logo em seguida.

O ônibus não demorou para chegar, Charlie embarcou e escolheu um banco na janela, a Caráx Avenue ficava do outro lado do rio thames, por isso ainda demoraria muito tempo para chegar, o ônibus fazia um grande percurso. Charlie pegou o telefone e discou o numero de Melanie.

- Alo? – disse a doce voz dela.

- Oi Mel, é o Charlie, como vai?

- Bem – a voz dela era neutra. – E você?

- Estou indo distribuir alguns currículos, se tudo der certo hoje mesmo arrumo um emprego, e você, o que esta fazendo?

- Só um trabalho da faculdade, Charlie, estou meio ocupada com isso, se puder, nós falamos mais tarde, tudo bem?

- Tá certo – falou ele cabisbaixo, ela não respondeu, já havia desligado.

As vezes sentia raiva de Melanie, ela era uma garota digna de raiva, mas a raiva que ele sentia não durava muito tempo. Ele acabava pensando nela e o feitiço que aquela garota carregava era forte demais, ele não conseguia evitar procurar por ela, estava hipnotizado.

Pensou em ligar pra ela em mandar ela pro inferno, mas não conseguiria. Poucas coisas são tão fortes quanto o possível efeito que uma mulher pode causar. Ele resolveu não pensar nisso naquele momento, precisava se concentrar no trabalho, dar uma boa impressão.

Começou a se perguntar o porquê de Chuck ter do emprego, será que era ruim? Será que ele não queria que ninguém trabalhasse lá por ser muito bom? Talvez tivesse medo que o Charlie roubasse seu lugar, era uma possibilidade, porém não, não era nada disso.

Ele desceu no cruzamento da avenida. O dia estava nublado e provavelmente choveria mais tarde. Não estava com frio, porém ainda usava seu casaco. Seu relógio de pulso marcava nove e seis da manhã, andando pela avenida Caráx ele releu o endereço que havia anotado no seu celular "numero 313"

Então do nada, quase que se querer Charlie passou os olhos por um edifício cinzento muito alto, tinha o numero 313 logo acima da porta principal, junto com as inscrições "Magma Tower" – é aqui. – Pensou ele. Estava do lado contrário da rua, ele atravessou e quase for atropelado por um táxi.

- Olha por onde anda, seu babaca! – Disse o taxista.

Charlie ignorou e continuo sua travessia e parou bem em frente a porta dupla. Passou a mão pelos seus cabelos e a arrumou a camiseta, estava pronto a fica com aquele emprego – mesmo não tendo ideia do que era aquele edifício ou no que poderia trabalhar ali.

Ele passou pela porta e seus olhos passearam pelos quatro cantos daquele lugar enorme, o saguão era gigante, as paredes brancas com pequenas lâmpadas que jogavam mais luz para cima. Haviam vários sofás e plantas. Charlie observou as pessoas, todas vestidas com ternos ou vestidos caros, somente pessoas que provavelmente dirigiam caros de luxo e moravam em mansões, ele começou a sentir vergonha de estar ali.

- Olá, tudo bem? – disse Charlie ao recepcionista – Vim aqui deixar meu currículo.

- Ah, claro, veio pelo anuncio, certo? – perguntou ele.

As Pontes InvisíveisOnde as histórias ganham vida. Descobre agora