Aceitação

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Sete e Charlie estavam no terraço da fábrica abandonada em que Justine e outros tantos caras maus haviam morrido horas antes. Parte de Charlie ainda não acreditava no que tinha acontecido, a outra parte se sentia culpado. Os dois estavam sentados no parapeito e seus pés balançavam para fora do edifício. Charlie até havia pensado mais de uma vez em pular, mas não conseguiria. Melanie estava dormindo logo atrás deles enrolada no sobretudo de Sete, sem as facas, claro. O sol estava nascendo entre os prédios da cidade ao longe e os dois dividiam um cigarro.

- Não dá pra aceitar – disse Charlie.

- Eu sei como é.

- Eu sou obrigado a ver todo mundo que eu amo morrer diante de mim.

- Eu sei como é – repetiu Sete.

- Eu não aguento mais.

- Pois é – disse ele. – Nem eu. Mas nós temos essa conexão. Nós dois precisávamos de dinheiro e fomos cegados pela ganancia. Agora nossas vidas estão uma bagunça, e quem sofre são aqueles que nós amamos – disse Sete. – Aliás, desculpe te usar para encontrar a Marina.

- Não liga pra isso, qualquer um faria o mesmo – disse Charlie. Fazia um tempo que havia parado de chorar, tanto o rosto dele quanto o de Sete eram um mar de hematomas, além disso, todos os outros ferimentos pelo corpo, como o tiro de Sete e a facada de Charlie haviam decidido começar a doer. – Você acha que ainda podemos ter uma vida normal?

- Por enquanto não – disse Sete. – Mas você entende a necessidade de nos afastarmos das pessoas que amamos, certo? – Charlie olhou para Melanie dormindo, tão doce.

- Eu não queria deixar a Jennifer.

- Se eu soubesse que deixaria a Marina viva, eu a deixaria na mesma hora. Amar não é sobre ser feliz, mas sim deixar a pessoa da qual amamos feliz. Entende? – disse Sete, Charlie abaixou os olhos e encarou o cigarro.

- Preciso ligar pra ela. Não posso sumir sem nem dizer adeus – disse Charlie, Sete balançou a cabeça positivamente, ele pegou o telefone e discou o numero de Jennifer. Chamou uma, duas, três vezes e ninguém atendeu, até cair da na caixa postal.

- Oi, aqui é a Jen, deixe seu recado após o sinal – Beep.

- Aqui é o Charlie – ele fez uma pausa. – Tem muita gosta que eu gostaria de te falar pessoalmente, ou talvez eu não gostaria de falar nada. Só te abraçar e esquecer o mundo por um segundo que seja. Mas a verdade é que as coisas nunca funcionam como a gente deseja, eu queria estar com você agora, mas Jen, tudo desabou. Eu só quero te dizer que eu te amo, certo? Nunca duvide disso, e é por você que eu lutar contra tudo isso, talvez você não goste agora, eu vou desaparecer por um tempo, ficar longe – uma lágrima escorreu pelo seu rosto. – Se acontecesse alguma coisa com você, eu nunca me perdoaria. Eu preciso te manter segura. Pode ter raiva se quiser, ficar brava comigo, acho que isso é compreensível, mas nunca me esqueça, mesmo se eu nunca volta, mesmo que eu falhe e acabe morrendo. Esse pouco tempos que ficamos juntos foi o melhor da minha vida. Espero te ver em breve, eu te amo. – Charlie terminou a ligação.

- É a coisa certa a se fazer – disse Sete.

- Eu espero.

- Algumas coisas ficam melhor sem a gente. O pior é que geralmente são as coisas que mais amamos – disse Sete. Charlie observava, apesar de ser um psicopata que podia matar qualquer pessoa sem dó, ele tinha um lado sentimental que sempre tentava manter escondido, mas estava lá.

- Obrigado. Por tudo.

***

Sete carregou Melanie até o carro, estava em sono profundo, ela não acordou nem quando passaram por um buraco, estava desmaiada no banco de trás. Charlie observou seu rosto, não podia evitar de acha-la linda, mas já havia perdido o interesse nela, torceu pra que ela estivesse tendo um bom sonho, afinal, ela também tinha encarado a morte nos olhos.

- Não podemos deixar o corpo de Justine lá – disse Charlie.

- Eu vou ligar para a ambulância assim que estivermos longe o suficiente. Não queremos que nos acusem de mata-la também.

- Certo. Você tem razão.

Os dois chegaram até a casa de Melanie, Sete puxou o freio de mão e começou a ligar para uma ambulância. Charlie a levou até dentro de casa, estava exausta. Quando Charlie colocou ela na cama ouviu-a cochichar alguma coisa, parecia um pedido de desculpas.

- Fica bem, tá bom? – Charlie deu um beijo em sua testa, todas suas memórias fluíram para a cabeça de Melanie. Charlie tinha certeza que conseguiria controlar as pontes que criava se focasse bem, mas naquele momento não se importou com isso, Melanie era parte de Charlie. Ele não sabia, mas ela estava arrependida, mas também sabia que era tarde demais.

- Preciso te mostrar meu maior tesouro – disse Sete quando Charlie saiu da casa. Levou Charlie até um lote de garagens alugadas, e abriu a de numero 3. Dentro havia um dodge charger 1969, preto como a noite e brilhante como uma estrela. – Marina adora carros antigos. Comprei depois do assalto do banco pois pensei que ela ficaria muito feliz.

- Não desista – disse Charlie.

- Não vou.

***

Sete e Charlie já estavam na estrada fazia três horas em direção a Liverpool. Não conversaram muito, aquela viagem era um fuga de seus problemas. Para Charlie, significava deixar a mulher que ele amava para trás. Para Ethan, significava se livrar de toda a espeça que ainda tinha que sua mulher ainda estivesse viva, mas nenhum dos dois tocou no assunto.

- As coisas vão melhorar. – disse Sete, quase lendo os pensamentos de Charlie.

- Ou ficarão ainda piores.

As Pontes InvisíveisWhere stories live. Discover now